A dificuldade de viver o meio-termo. Ou, a era dos rótulos.

A dificuldade de viver o meio-termo. Ou, a era dos rótulos.

Pode até ser uma mera sensação, sem qualquer embasamento científico, porque até onde sei, os dias continuam todos com 24 horas, que por sua vez têm cada uma seus sessenta minutos. Mas é inegável a percepção de que as coisas andam em um ritmo mais frenético do que antes. Vivemos muito mais pressionados a tomar decisões instantâneas em maior quantidade. Sinal dos tempos digitais e da vida exagerada em redes sociais, menos do que deveríamos ao vivo e presencialmente.

Um dos sintomas que percebo cada vez mais e sinto como um dos novos “fenômenos da modernidade” é o da necessidade incessante de se ter opinião sobre tudo, a toda hora, de precisar deixá-la claro e, mais do que isso, que ela seja sempre categórica e pendendo para um lado. Tempos desafiadores para quem prefere manter uma posição mais conciliadora ou intermediária, tentando compreender os dois lados extremos das situações da vida sem necessariamente estar em cima do muro.

Está difícil viver meios-termos hoje, é preciso ser uma coisa ou outra e, por conta disso, muitas vezes agimos como se fôssemos torcedores de futebol esperando a hora de entoar algum cântico de xingamento ao adversário ao invés de louvarmos o nosso clube.

Fiquei com essa sensação ainda mais latente após acompanhar – uns mais, outros menos – os recentes “escândalos” que pululam diariamente no mundo virtual, as crises de tudo (imagem, comunicação, de moral, de atitudes). Impressionou-me como da vida conjugal do famoso cantor ao escorregão da jovem empreendedora digital, passando por questões políticas a separação de globais, todos têm opiniões muito virulentas a dar, apaixonadas. De um lado, defendendo a ponto de parecer ingenuidade, ou do outro, apontando o dedo e vociferando coisas como se dissesse “Eu sabia! Tá vendo como eu dizia isso antes!”

Até aí, nada que não se fizesse desde o início da humanidade. O problema é a escala. De número de pessoas, de fatos se sobrepondo um ao outro e ao ritmo de “escândalo do dia”, do tempo enorme dedicado para isso (algo incrivelmente dúbio, uma vez que todos reclamamos de falta de....tempo para as nossas coisas!) e da incapacidade de se aceitar que alguns prefiram não se posicionar sobre ou assumam uma posição intermediária, pois concordam com um pouco de cada um dos dois lados.

Longe de estar defendendo um mundo formado por exércitos de Polianas. Respostas com “gosto de murro”, como bem disse meu amigo Demitri Túlio, são necessárias em alguns momentos. Só não precisa ser em todos. Nem a cada F5 (atualização) que se dá em sua rede social e surge o babado do dia na sua frente, pronto para ouvir sua efusiva opinião.

Além do mais, como falamos em velocidade, a roda do mundo gira muito mais rápido e o ato de cuspir pra cima virou algo tão comum que, quem garante daqui a alguns dias não seja você o alvo de tantos comentários passionais. Cai na testa mesmo. Nessa hora você vai procurar por algumas vozes mais comedidas e certamente irá dar a devida importância ao meio-termo.

Eduardo Buchholz

Editor-chefe do portal iBAND CE

8 a

Muito bom, Maurão. Com mais esse artigo, vejo que a fuga para o Linkedin pode representar uma alternativa perante a dicotomia do Facebook e a breviedade instantânea do Twitter.

Rafaela Britto

Diretora de Atendimento | Especialista em Comunicação Corporativa e Gestão de Crise | Adepta da Felicidade Corporativa

8 a

Exatamente. "Fazer a Glória Pires" nunca fez tanto sentido. Adorando os textos. ;)

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