Dinâmicas de grupo
Recentemente li uma matéria e assisti a um vídeo sobre a inauguração de uma filial de um restaurante em que os funcionários, recém contratados, pulavam e gritavam numa pretensa manifestação do “vestir a camisa”. Confesso que não pude deixar de relacionar o caso às notícias do mau gosto da gestão corporativa de uma famosa indústria. É só dar uma pesquisada na web para comprovar.
Estas “dinâmicas” começam na fase de recrutamento e seleção. As vezes permeiam também a gestão da empresa. Em momentos específicos, “consultores” ou gestores utilizam-se dessas “ferramentas” para alinhamento dos objetivos e conferência das “metas do time”. Não é raro trazerem os subcontratados para participação.
Costumo classificar as dinâmicas numa escala com dois extremos: o “grossobronco” e o “gratiluz”. No extremo "grossobronco" estão as “técnicas” com grosserias, recheadas de palavras de baixo calão típicas de estádio de futebol, com o objetivo de criar um pretenso “espírito de equipe”. No extremo "gratiluz" estão as técnicas que valorizam a “espiritualidade gratuita”, o “abraçar árvores” e ser grato a “todas as divinas criações” ao redor – “já agradeceu hoje?” é frase típica desse grupo de “animadores corporativos”.
Antes que me nomeiem “o chato de plantão”, adianto que não sou contra dinâmicas. Aquelas do tipo “quebra gelo”, como apresentações simples ou cruzadas que incentivam o diálogo, são bastante normais e aceitas por quase a totalidade das pessoas de todos os espectros de pontos de vista. Há também jogos de “baixo impacto” (se é que me entendem), também bastante atrativos. São o equilíbrio entre os extremos. Evidente, porque não submetem os participantes ao ridículo.
As palavras chaves são estas mesmas: ridículo, degradante, constrangedor, humilhante. Qual o porquê disso? O colaborador está numa posição de fragilização. Perguntaram a ele se gostaria de se expor dessa forma? O “animador” tem consciência de que a situação poderia ser humilhante para certas pessoas? Ele gostaria de se submeter à mesma situação em que coloca os outros? Os recrutadores e animadores precisam saber respeitar os limites. Quem se submete a dinâmicas constrangedoras não necessariamente são os melhores para as posições da empresa. E nos casos dos funcionários já contratados: será que estão felizes com a situação humilhante eventual ou cotidiana? Não seriam mais efetivos se a situação fosse diferente?
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Não se trata de ter “queixo de vidro” (termo que importo do boxe com significado de aguentar os golpes). O colaborador pode se submeter à pressão e a riscos controlados. Mas a organização não tem o direito de submetê-lo à humilhação. Basta verificar sentenças da justiça do trabalho dos que se sentiram lesados. Acredito que muitos “deixam prá lá” estas experiências, mesmo não gostando delas.
Lembro-me de um convite, há alguns anos, para eu participar de uma reunião importante com o contratante da empresa em que eu trabalhava. Num determinado momento apareceu um animador chamado ao palco. Pegou o microfone e disparou: “vocês estão muito tensos! Vamos fazer uma sessão de relaxamento”. Quando começou a pedir que soltássemos a cintura e dançássemos resolvi me retirar. Achei uma exposição desnecessária e fora dos objetivos do evento. “Então você é contra as artes e dança”? Não, em absoluto. Me chamem para uma festa ou comemoração. Eventos adequados a esse tipo de exposição. Se bem que também há um código de etiqueta implícito nestes eventos. Tudo tem seu tempo e sua forma.
Alguns vão dizer: “mas tem gente que não vê problemas nisso”! Ok, cabe apenas lembrar que, se há pessoas que se sentem mal com a situação, estas devem ser o balizador do evento. Se tem um que não quer, não faça. Se é um evento corporativo explique e deixe os participantes a vontade caso não queiram participar. É questão de opinião? Sim! Tem quem goste ou não. Essa é uma “etiqueta de primeiro mundo”.
Já cometi estes erros ou promover eventos que tinham algo como isso? Creio que sempre pedi o comedimento. Mesmo assim precisamos ser cuidadosos. Podemos fazer melhor sem cometer eventuais erros de outras épocas. Não precisamos esperar acontecer conosco para “cair na real”.