Quais são os limites da comunicação, para que não se torne assédio moral?
Essa questão sempre está na ordem do dia. Ganhou as redes sociais recentemente, devido a pelo menos dois acontecimentos: a repreensão (com palavras “inapropriadas”) feita pelo técnico de futebol do São Paulo, Fernando Diniz, ao jogador Tchê-Tchê, e à fala ríspida da Anita, cantora e compositora, em conversa por telefone com pessoa da equipe dela. Desenvolvendo a pergunta, como abordar assuntos urgentes, de forma que o colaborador entenda claramente ser este o caso (de urgência), sem que o gestor descambe para o assédio moral? Ou, como humanizar a comunicação entre gestor e colaborador, sem que o primeiro não se torne um “banana”?
Já tratei brevemente desse assunto, em dois artigos, os quais recomendo apreciarem, se quiserem: “Pessoas difíceis” e “Seu gestor é autoritário ou democrático?”. No primeiro texto, num dado momento abordo que, mesmo num ambiente de pressão por metas as pessoas não têm o direito de serem desagradáveis. No segundo, faço distinção de estilos de gestor, altamente voltados para resultados, obviamente dentro dos limites do respeito. Ao mesmo tempo, é importante que os colaboradores não tenham “queixo de vidro” – frase importada do boxe, que significa baixa resistência à pressão do adversário.
Sim, mas qual o equilíbrio a ser atingido, para que o gestor seja claro, firme, sem que ao mesmo tempo fira ou constranja seus colaboradores? É importante lembrar que as pessoas reagem de maneira diferente aos estímulos, à forma e às palavras utilizadas na comunicação. Essa diferença deve ser objeto de conhecimento do gestor. Sim, o gestor deve conhecer, com bom grau de profundidade, a melhor forma de abordagem a cada um de seus colaboradores. Assim pode modular a comunicação, dentro dos limites civilizados e do respeito, de forma que a equipe reaja aos estímulos da maneira necessária.
Claro, existe uma base mínima para o que se considera abordagem respeitosa. Utilizar as palavras mágicas (por favor, por gentileza, obrigado, etc.), não ultrapassar os 65dB(A) quando estiver conversando ou falando, não se utilizar de demonstrações vazias de poder, como “eu mando”, “manda quem pode, obedece quem tem juízo”, etc. E tomar muito cuidado com as brincadeiras. Definitivamente são de muito mau gosto quaisquer abordagens sobre a situação física do interlocutor, sua etnia, raça e orientações de gênero. Se tiver dúvida quanto a isso, leia outro artigo meu: “Desmistificando conceitos mal interpretados”. Nele tem uma parte onde trato do “politicamente correto” – veja antes de torcer o nariz, se esse for seu caso. E para deixar claro: racismo é crime - nunca é brincadeira. Discriminação ou preconceito de etnia, religião, procedência nacional, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero e orientação sexual também são crimes.
Tá bom, mas o funcionário pode ser resistente e desafiar o poder do gestor. E aí, como fica? O gestor deve ter segurança plena do que precisa para atingir seus resultados. Para isso precisa de objetivos e metas bastante claros. Além do que já citei neste artigo, deve estar aberto a bons argumentos contrários, que o façam mudar ou reavaliar seus pontos de vista. Sempre que for necessário.
Por sua vez, um subordinado deve ter claro que um bom gestor precisa apresentar resultados. Se mesmo assim o funcionário continuar sem entender ou não se convencer das razões, o gestor ainda é o responsável e deve conversar claramente com seu colaborador. Até que seja atingido o limite da convivência aceitável, e seja dada a oportunidade ao colaborador buscar novos desafios no mercado. Atitude adulta de romper um relacionamento que, infelizmente não vai dar mais frutos, além de preservar o que tenha sido construído de bom.
Defendo que o cargo de gestor seja resultado de evolução na carreira. O gestor com “bagagem” tem melhores condições de liderar. Não que eu seja contra a promoção da juventude. Mas a falta de experiência de comando de equipes, a insegurança da falta ou conhecimento incipiente na área, trazem possibilidades de falhas na abordagem com os funcionários.
A diferença cultural também pode afetar. Já trabalhei com estrangeiros que tinham uma forma diversa de pedir ou comunicar suas intenções. Assim as falas deles soavam rudes para os brasileiros. Estrangeiros devem fazer a preparação e os treinamentos necessários para não cometerem as gafes culturais. Como eu costumo dizer: faça o primeiro movimento e aconselhe o gestor que precisa de adaptação. Assim você colaborará para evitar mal entendidos.
Recomendo, em todos os casos, o diálogo e a exposição clara dos problemas para que a convivência seja harmonizada. Na dúvida respire, espere um melhor momento para que as emoções não “tomem as rédeas” da comunicação, o que aumentaria os riscos de desentendimentos. O gestor não precisa gritar, não precisa inventar trabalho inútil, não precisa tomar medidas para afirmar seu poder. O exercício do poder deve ser algo natural. O local de trabalho não deve ser um inferno para os colaboradores. Se há baixa iniciativa, pouco diálogo e resistência passiva, é bem provável que os colaboradores se sintam assediados moralmente.
Detalhes finais importantes: seja humilde e sempre pronto a aprender com os subordinados. Isso não diminui o gestor em nada. Também esteja pronto para ensinar o que você souber. Não tem nada mais nobre do que um gestor capacitado para formar seu time. Assim se estabelece uma relação de confiança. Nesse caso, trabalho nunca será um fardo. E o local de trabalho sempre será de relacionamento e engrandecimento profissional.