AS EMPRESAS E O RISCO: OPORTUNIDADES E RECEIOS
Aswath Damodaran, autor de Strategic Risk Taking, é uma das maiores autoridades mundiais em gestão do risco. Um de seus ensinamentos diz respeito justamente à construção de uma empresa afeita à tomada de risco (risk-taking organization). Ele enumera quatro condições fundamentais para uma empresa ganhar vantagem na tomada de decisão pautada pela incerteza. Este artigo mostra quais são elas e como funcionam.
Categoria: Gestão / Tempo de Leitura: 15 min.
As Quatro Condições da Empresa Tomadora de Risco
1.Equilíbrio entre Perdas e Ganhos. Empresas que sabem lidar com o risco de forma positiva não o fazem por acaso. Elas, antes de tudo, buscam alinhar os interesses dos tomadores de decisão (isto é, dos gerentes) com os proprietários do negócio (sócios, investidores, acionistas).
Em outras palavras: quem está na linha de frente diária, tomando decisões arriscadas e duvidosas, deve ter em mente o sucesso da empresa, e não seus próprios interesses. E isso só é alcançado se os gerentes souberem que irão ganhar pelos riscos assumidos que se revelarem acertados. Nenhum executivo assumirá riscos se não ganhar nada com essa ação e, pior, se perder caso ela se mostre equivocada. Há que se ter, aqui, um jogo de ganha-ganha.
Quando esse alinhamento descrito não estiver sedimentado a organização terá prejuízo duplo, pois: a) Deixará passar oportunidades de explorar riscos positivos; b) Ficará exposta a riscos negativos, dos quais deveria manter distância.
Uma balanceada distribuição entre as perdas e ganhos (para os gerentes) no que tange aos riscos tomados é a chave do equilíbrio. Esse significa um ponto ótimo entre os gerentes terem excessiva ou nenhuma participação nos resultados da empresa.
Damodaran explica que tomadores de risco (gerentes) sem participação (ações, distribuição de resultados) nos investimentos da empresa, se mostram mais tímidos em relação à tomada de risco e apresentam uma postura bastante conservadora. Por outro lado, gerentes que detêm grandes parcelas de investimento na empresa, também se mostram acanhados, pelo receio em colocar em risco a quase totalidade de seus investimentos.
Bons níveis de tomada de risco positivo (riscos que são oportunidades de negócio) aparecem mais quando os gerentes possuem investimentos significativos nas empresas, mas representando somente uma parte de um portfólio diversificado.
Vale aqui, uma releitura do velho ditado: gerentes tomam menos risco quando têm os ovos do investimento todos em uma mesma cesta. Ou não possuem ovo algum.
2. Seleção e Manutenção dos Risk-Takers. Empresas boas tomadoras de risco sabem escolher as pessoas certas para lidar com a incerteza. Como já dissemos aqui, alguns indivíduos lidam melhor com o risco do que outros. Eles são menos avessos à ambiguidade e conseguem lidar melhor com a possibilidade sempre iminente do fracasso atrelada às decisões.
Certo, pode parecer óbvio que empresas boas tomadoras de risco são feitas por pessoas não adversas à incerteza. A pergunta, no entanto, é: como identificar e reter o tipo de pessoa certa para lidar com o risco?
Para tanto, é mandatório reconhecer que:
a. Ter bons tomadores de risco é resultado justamente de saber contratar e reter bons tomadores de risco. Isso passa por um processo de seleção de gerentes que inclua medições de aversão ao risco em seu contexto. Existem testes muito interessantes que mensuram o grau de aversão ao risco das pessoas como significativa precisão.
b. É imperativo entender que tomadores de risco são, geralmente, profissionais mais instáveis e temperamentais. Sua manutenção na empresa, muitas vezes, constitui um verdadeiro desafio.
c. Tomadores de risco, quando não provocados constantemente, logo deixam a empresa em busca de ambientes mais desafiadores.
d. Tomadores de risco não se sentem confortáveis em meio a grupos de trabalho muito conservadores e lenientes.
Lembre-se: O papel da gestão de pessoas na construção de uma organização aderente ao risco é fundamental.
3. Políticas de Recompensa. Empresas eficientes em gerenciar a incerteza premiam a boa tomada de risco. Esse mecanismo calibrado de premiação, no entanto, não é fácil de ser implementado.
Políticas de bônus atrelados à lucratividade e participação na forma de ações foram tentativas aplicadas por um bom tempo. A correlação de tais práticas com uma menor aversão ao risco, porém, se mostrou duvidosa. De forma geral, no entanto, sabe-se que gerentes que não recebem qualquer compensação pelo resultado da empresa (apenas remuneração fixa) serão tomadores de risco extremamente discretos, para não dizer nulos.
Em resumo: riscos só são assumidos quando os sujeitos dessa ação – os gerentes – souberem que ganharão em correr o risco enfrentado. Sem ganho individual, nenhuma pouca ou nenhuma tomada de risco terá palco.
4. Estrutura e Cultura. Por fim, o porte e a cultura organizacional aparecem tendo um papel marcante na disposição à tomada de risco. Embora essa constatação algumas vezes não seja inequívoca, empresas de grande porte tendem a serem mais conservadoras diante da incerteza, em que pese terem muito a perder.
Elas geralmente se mostram mais lentas em acompanhar as mudanças no mercado, pois investiram muito na manutenção do status quo vigente. É só lembrarmos o caso da Kodak e sua relutância em entrar no mercado da fotografia digital (por força do risco de canibalizar o mercado analógico, em que detinha a liderança) e essa argumentação se torna clara.
Já startups e empresas emergentes estão interessadas justamente em subverter a ordem de mercado imposta, são mais proativas e lidam melhor com o risco. Também e de certa forma, por terem pouco a perder.
A cultura também tem participação cogente nesse contexto. Empresas, como as pessoas, apresentam comportamentos muito diferentes em reação à incerteza. Em outras palavras: algumas organizações lidam melhor com o risco do que outras, por motivos culturais altamente subjetivos (visão do fundador, experiências passadas, tolerância ao fracasso). Esses motivos variam enormemente de empresa para empresa, o que torna a gestão do risco, em última análise, uma idiossincrasia.
RESUMINDO: Riscos são oportunidades. Entender essa verdade é o grande primeiro passo para uma empresa saber lidar com os riscos estratégicos do negócio. Uma boa gestão dos riscos não pressupõe evitá-los a toda prova, mas, sim, saber diferenciar entre os riscos positivos (aqueles que devem ser explorados), dos negativos (os que realmente devem ser evitados). Um aprendizado nada fácil, mas fundamental para quem quer explorar novos mercados e estar na frente da inovação.