A ESTÉTICA NA VIDA DA GENTE

A ESTÉTICA NA VIDA DA GENTE

A vida da gente vai descortinando muitas realidades vividas, em que, vai nos construindo, a cada dia, como pessoa, como ser humano, o nosso existir, e nos influenciando, dando-nos uma personalidade, um jeito de ser, que paulatinamente, vai se impregnando na gente, entra pelos nossos poros, na nossa alma, no nosso corpo, nos formando, muitas vezes, sem que percebemos.

Mas, as vezes, vamos nos acostumando, ou por já ter uma opinião formada, ou ainda por porque já existe em nosso espírito, alguma antecipação, do juízo das coisas, acabamos por ficar com nosso espirito fechado, perdemos a sensibilidade, perdemos a seiva da vida.

Puxar na memória e começar a lembrar dos momentos de sensibilidade, que já experimentamos, que em algum momento foram fundamentais em nossa vida, momentos estéticos profundos, cheios de beleza, sensíveis, lindos, que marcou profundamente nosso espírito, nosso corpo, é fundamental para recuperarmos a sensibilidade, o amor ao belo, ao pensar belo, recuperar em nossa memória, aquilo que é esteticamente perfeito, que nos torna profundamente humanos. Aperfeiçoar o nosso conhecimento sensitivo. Essa perfeição é a beleza.

Muitos são os momentos esteticamente vividos, que marcaram profundamente minha vida, que estão no meu espírito, no meu corpo, na minha formação, faz parte de mim. Da convivência prazerosa com minha família, ainda lá na área rural, num sítio belo, na minha primeira infância. Convivência com meu pai, amoroso, referência, inteligente, cheio de beleza, para mim; do meu avô, figura marcante, esteticamente perfeito para mim, profundo na sua simplicidade, simbologia pura, no seu silêncio, presença, autoridade; minha avó, linda, morena, falava com o olhar, cheia de silêncio que falava por si, de gestos, amor, era o belo, ali presente; minha mãe, frágil, mas poderosa em sua fragilidade, carinhosa, atenta, amor; meus tios e tias, sempre presentes; meus primos e primas, vizinhos, tudo era esteticamente belo.

Dos passeios pelo sítio, da liberdade sem fim, sem pressa, no tempo certo, no ritmo do tempo, no ritmo do corpo, na contemplação total, na totalidade de tudo, do belo, integrado com tudo naturalmente, êxtase total; das brincadeiras inventadas, livre, liberdade, criatividade plena, sem pressa, fantasia total, sensibilidade a flor da pele, era o belo sendo vivido intensamente; da natureza intensa, vivia-se dentro dela, ela era nossa amiga plena, nós éramos natureza também com ela; do verde; da semente, plantada com tanto amor, com tanto trabalho e carinho, brotando na terra limpa, logo depois da chuva, com um sol ardido, mas brando, quente, a semente brotando, rasgando a terra, víamos ela brotar, ela nascer, nascendo verde, viçosa, cheia de vida, com promessa de fartura, de abundância, nós ali olhando, contemplado tudo aquilo, aquele milagre da vida, da natureza, do nosso trabalho, formando a lavoura cheia de promessa, nossa alegria era completa, intensa, o nosso coração enchia de contentamento, era fruto de nosso trabalho, lindo; as árvores frutíferas, com seus frutos doces; o capão de mato; o pé de goiaba, novo ainda, com seus galhos se arrastando com vento pelo chão, viçoso, na beira do rego de água, que passava no meio do nosso sítio, com suas frutas madurinhas, saborosas, vermelhinhas por dentro, que pegávamos, comíamos, vendo o filete de água que corria; o bambuzal na beira do rio, na curva do rio, onde se formavam um remanso, onde nadávamos a qualquer hora, sob a sombra do bambuzal; o pé de amora, com seus frutos vermelhinhos, no barranco do rio, onde subíamos para comer seus frutos doces; o subir até as copas das árvores, para contemplar, sobre suas copas, o horizonte distante, sem fim, que ia até a onde os nossos olhos alcançavam, onde o céu se encontrava com a terra, beijando-a, era lindo de ver; o barulho do vento livre; a chuva; o rio de água que corria depois das chuvas intensas; a mina brotando da terra; o rio limpo, os peixes, o remanso, a correnteza, o banho, o brincar na água; o andar nos filetes de água, descalços todo molhado debaixo da chuva; o rio cheio, a enchente, o rio roncando, alargando suas margens, o medo, a água sem fim; o fim do dia, o entardecer, o anoitecer, o sol se pondo no horizonte, lindo; a noite, a lua em todas as suas estações, fases, marcando o ritmo de nossa vida, o céu estrelado, as três Marias, o cruzeiro do sul, o relâmpago distante rasgando o céu escuro, o trovão anunciando que vinha chuva, a conversa, no sereno, sentado na relva, os causos, as histórias, a poesia. Tudo esteticamente belo.

Era um lampejo de plenitude, eterna, pleno de harmonia, graciosa dignidade. Tudo sendo estético, sem saber, sentíamos. Toda beleza é uma verdade, tudo é invenção, verdade geradora da perfeição, de beleza, de delicada beleza, persuasão íntima, vida.

A arte, a poesia, a literatura, a música, o mundo, a vida, a luta, pulsando nos sonhos da juventude.

A estética da vida da gente é a beleza.

Precisamos adquirir o hábito de ver e pensar com beleza, esteticamente. Mas isso pode ser oriundo da liberdade, liberdade em todos os seus sentidos. Sem essa liberdade, liberdade do espirito livre, não é possível pensar, ver o mundo, a vida, de modo belo, esteticamente.

A arte, o belo, nos humaniza. Nós temos a necessidade da arte, do belo, da estética. Tudo isso está com a gente. Basta olhar, ver, sentir.

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