A estabilidade básica
“No princípio era o Caos. E tudo era sem forma e sem vida, e nada havia por dentro e por fora do Caos. E o Caos quis ocupar o nada. E criou a Noite e a Noite reinou sozinha na imensidão desconhecida. E o Caos criou o Érebro e a imensidão foi dividida. E disse o Caos: Haja forma. E o Érebro e a Noite se conjugaram e houve forma. E viu o Caos que era boa a forma. Mas não havia luz, nem sombra. E disse o Caos: Haja luz. E o Érebro e a Noite geraram o Éter e o Dia, e fez-se a luz (...)”
Na mitologia grega da origem do universo, podia-se dizer que Caos era uma divindade rudimentar e a partir dele surgiram todas as coisas que dentro do tempo e do espaço foram se alocando, se organizando até estabilizar-se de alguma forma mas sempre dentro de disputas de forças. No mundo fabril é possível verificar-se a ação do caos e dentro desse caos uma crise. Lembremos que a palavra crise em chinês é formada por dois ideogramas: wei, (que quer dizer ameaça) e ji (que significa oportunidade). Assim o caos fabril enquanto crise, pode ser as duas faces de uma mesma moeda. Encarando como oportunidade, a fábrica deve buscar o que se chama na manufatura enxuta de estabilidade básica.
As quatro dimensões personificadas pelo homem, máquina, material e método são tanto as que geram riqueza quanto possivelmente as que geram o caos. O importante é saber quando cada um desses fatores pode representar fontes de instabilidade para o universo da manufatura.
A estabilidade básica pretende dar aos gestores duma unidade fabril o domínio sobre quatro dimensões distintas e interdependentes: homem, máquina, material e método. Entendamos domínio como sinônimo de previsibilidade geral e disponibilidade constante. Lembro-me aqui do segundo senso da metodologia dos cinco sensos (utilização, ordenação, limpeza, padronização/saúde e autodisciplina). Em japonês o segundo senso é chamado de Seiton que resumidamente pode ser entendido como colocar em ordem o que está desarrumado . Assentar, estabilizar-se de uma só vez, ao mesmo tempo. Então dentro desse mundo do trabalho é preciso sedimentar o seiton.
A origem do caos dentro da manufatura
As quatro dimensões personificadas pelo homem, máquina, material e método são tanto as que geram riqueza quanto possivelmente as que geram o caos. O importante é saber quando cada um desses fatores pode representar fontes de instabilidade para o universo da manufatura.
O homem (mão-de-obra) se torna uma fonte de caos quando não tem competência - produto entre conhecimento, habilidade (saber fazer) e atitude (querer fazer); falta de trabalho em equipe, deficiência de habilidades gerenciais dos superiores. No modelo Toyota estimula-se a multifuncionalidade, buscam sempre clarificar as responsabilidades de cada um estimulando a enxergar melhorias e a transmitir conhecimento. Acreditam que assim estão suprimindo a instabilidade dessa dimensão.
A máquina por vezes pode se tornar uma importante fonte de instabilidade quando há falta de disponibilidade devido a freqüência de quebras dos equipamentos, tempos longos de setup (troca de ferramentas para produzir outro modelo); performance (problema de capacidade fabril e pequenas paradas não registradas); qualidade (refugo e retrabalho, perda por incialização). Essa instabilidade gerará desperdícios como superprodução, esperas e estoques desnecessário.
O material algumas vezes é apontado como fonte de instabilidade porque há indícios de problemas de qualidade da matéria-prima ou mesmo porque houve falta ou atraso de abastecimento dos mesmos causados por mal planejamento ou falha no abastecimento interno. É importante sempre avaliar os fornecedores buscando assegurar a qualidade dos itens fornecidos.
O método gera caos quando se nota que há múltiplas formas de fazer a mesma coisa; quando há perdas de tempo em pequenas tarefas; quando coisas simples não são comunicadas; pela ausência de padrões; pela variação induzida pelo funcionário, pelo uso incorreto do método etc.
A estabilidade das quatro dimensões citadas é o pré-requisito para a iniciar a jornada de implantação da manufatura enxuta e demandará disciplina para se chegar o mais próximo possível do modelo ideal de perfeição. Para resolver a questão do caos dentro do universo fabril, deve-se fazer algumas perguntas fundamentais que irão conduzir às ações: quais treinamentos e conhecimentos básicos são necessários para criar estabilidade? ; que ferramentas são mais apropriadas?; Como deixar o método o mais claro possível? Como tornar as pessoas mais comprometidas alinhadas na mesma visão de futuro? Etc. No princípio era o Caos, mas no fim o cenário pode ser melhor.
Ósculos e amplexos a todos.