FALCÃO E O FIM DA HISTÓRIA
O melancólico fim do baronato e a reconstrução da política em Patos de Minas
Em 1989, o economista e cientista político Francis Fukuyama publicava seu famoso artigo “O fim da história?”. O texto defendia a tese de que o capitalismo seria o fim da história da humanidade, sua forma final de organização social. Embora essa seja uma discussão interessantíssima, não é o foco deste escrito. No entanto, há algo de comum entre Fukuyama e o baronato de Patos de Minas. Em princípio, essa parece uma comparação esdrúxula, mas logo o raciocínio ficará mais claro. De maneira simples e apressada – não há espaço para o aprofundamento técnico e teórico necessário – Fukuyama nos leva a pensar que não há alternativas. É só aceitar o que está posto e pronto! Teóricos, do mundo inteiro, refutaram, ao meu juízo muito bem, por sinal, essa afirmativa.
Por aqui, nas terras altas do Paranaíba, uma parte considerável das tradicionais lideranças políticas defendia – de modo capenga e porco – o fim da história de Patos de Minas. Para essa gente, não havia horizonte além de Elmiro Nascimento, Arlindo Porto e seus apadrinhados. Durante um bom tempo, isso até que foi verdade, assim como muitos pensavam ser verdadeiro o argumento de Fukuyama. No entanto, como diria Marx, no genial O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, a história se repete “a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”. Poucas frases na filosofia definem tão bem a trajetória política dos nossos caciques. Com exceções pontuais, o que fica, na cabeça do povo, é a sensação de que a nossa cidade era, na realidade, um puxadinho das famílias donas do poder. Quando uma administração não era trágica, era uma farsa: um esbirro daquilo que muitos viram no passado.
Em 2020, Falcão sepulta um círculo vicioso e viciado de política, embora muitos não admitam a derrota feia nas urnas, até hoje. Dia desses, uma fonte ligada aos grupos tradicionais da cidade me disse que, nos bastidores, eles ainda tentam entender o que mudou no eleitor. Minha resposta foi a seguinte: quando a pergunta está errada, a resposta também será igualmente errada. Não foi o eleitor de Patos de Minas que mudou; foram eles que pararam de ouvir o eleitor e, acreditando no fim da história, se julgavam acima do bem e do mal. Dizer que o baronato perdeu para si mesmo não retira os méritos da campanha do prefeito. Muito pelo contrário: evidência a habilidade que teve em encontrar uma brecha em um sistema até então impenetrável.
Muitos personagens deste espetáculo encerram a vida pública de maneira melancólica. Perderam em 2020 e perderam em 2022, sem eleger sequer um aliado para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais ou para a Câmara dos Deputados. Também não conseguiram alavancar um nome competitivo para as eleições de 2024. Fracasso, fracasso e mais fracasso. Do outro lado, apesar de alguns erros, Luís Eduardo Falcão e seu grupo saem vencedores, com a eleição da primeira dama, Ludmila Falcão, e do Deputado Federal Zé Vitor (que não é de Patos, mas foi apoiado pelo prefeito e obteve mais de 8 mil votos na cidade).
Os resultados são espantosos! Afinal, o grupo chegou ao poder há pouco tempo. São dois anos de vida pública. Muitos, inclusive, com o primeiro cargo eletivo da vida. É preciso admitir o óbvio: Patos de Minas experimenta a ascensão de nomes inéditos. Eles passam e fecham a porta atrás de si. Um novo ciclo se inicia e encerra uma parte da história na política local. No entanto, este também não é o fim da história!
Para não ser injusto, o passado político do município não é de todo obtuso. Há grandes conquistas, apesar das falhas, dos erros e do reacionarismo. As últimas duas décadas é que não foram nada generosas com o baronato. Seja pelo sentimento de insatisfação nascido dos porões da lava-jato, seja pelo empobrecimento das ideias de uma geração inteira de políticos. São vários fatores que nos levaram a uma mudança radical de nomes e práticas. A ideologia segue a mesma; Patos de Minas é uma cidade conservadora.
O Chefe do Executivo Municipal encerra uma fase da história política da cidade e, ao mesmo tempo, abre outra, também à direita. E repito: a história não termina com Falcão! Estamos diante de um momento crucial. O momento de reconstrução das forças políticas para o surgimento de novos nomes que podem e devem disputar com o prefeito e seus aliados. Política de uma nota só resulta em atraso e enviesa a percepção da realidade. O baronato caiu no esquecimento, sem conseguir transmitir um legado, exatamente por falta de uma terceira via. O poder é fascinante e deixa ignorante fascinada. Por isso os políticos tradicionais bateram cabeça, até afundarem.
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Nestas eleições isso se tornou mais evidente. Bons nomes foram prejudicados pela falta de liderança ou pelo mau uso dela. O principal erro é não conseguir passar o bastão, deixar que outros assumam a campanha, que lidem com o povo. Não souberam a hora de parar e não transmitiram a liderança, não formaram e nem preparam novos nomes. Aí realmente fica difícil conseguir algum resultado relevante. Sem falar do marketing dessa turma que é um horror. A reconstrução será longa e demorada. Dificilmente conseguirão entrar de maneira competitiva nas próximas eleições municipais. Este cenário abre espaço para que novas forças se construam a partir de agora. Há uma avenida chamada oposição que precisa ser pavimentada. Hoje inexiste oposição ao governo de Falcão. As críticas partem de setores da imprensa e isso não representa oposição dura e pragmática.
O Legislativo como fiel da balança
A Câmara Municipal está órfã de opositores. Pode parecer pejorativo, mas, às vezes, a casa se comporta como chancelaria da prefeitura. Os debates são fracos e periféricos e incapazes de incomodar o prefeito. Individualmente há bons nomes, críticos, mas oposição organizada e estudiosa não há. A Casa terá um novo comanando a partir do ano que vem e, pelo que tudo indica, o prefeito vencerá mais uma eleição, ainda que sem entrar na disputa. Ao manifestar apoio ao vereador Gladston Gabriel (PODE) ele joga a oposição para escanteio. Olhando por essa ótica parece uma boa jogada. Entretanto, há excesso de confiança, o que aumenta a chance de traição ou mudança de votos de última hora. Embora não haja oposição organizada na Câmara, há uma espécie de “centrão”, fisiológico e interesseiro: hoje diz que vota, mas amanhã muda de ideia. Voltemos ao tema central do artigo. Falarei da eleição do Legislativo em outra oportunidade.
Com a oposição em frangalhos e o Legislativo como aliado, Falcão ganha boa vantagem para terminar o mandato com tranquilidade. Imagino que, embora seja muito cedo falar do assunto, ele queira disputar a reeleição e, depois, buscar um cargo mais alto. Presumo que deputado federal seja pouco pra ele. Lembrem-se da volta ao NOVO.
Antes, é preciso arrumar a casa
Falcão de fato saiu vitorioso das eleições de 2022. No entanto, criou animosidade dentro de casa. O não apoio a candidatura de José Eustáquio de Faria Júnior criou atritos na falcoaria. Particularmente, acredito que não apoiar um candidato da cidade é um erro. Há alguns meses, conversando com o secretário de Governo Emerson Azevedo, ele me explicou que a decisão do prefeito foi de priorizar o melhor para a cidade, já que Zé Vitor foi generoso como o município nos últimos anos. Além disso, o sentimento, segundo Azevedo, é de que o caminho para eleição do antigo colega de partido era mais complicado. Um bom argumento, mas insuficiente. Basta olhar a votação de José Eustáquio. Com o apoio do prefeito seria diferente? A resposta é sim! A influência dele na região é inegável. Um prefeito membro da AMAPAR me confidenciou, certa feita, o seguinte: “Flávio, o Falcão vai por o Arlindo Porto no bolso. O povo aqui da cidade tudo conhece ele e gosta dele.” Todo esse capital político aplicado em um candidato da casa... É pena o tempo não retroagir. No entanto, reafirmo: o prefeito apoia quem ele quiser. É direito dele. Essa é uma decisão que apenas discordo. Não posso afirmar que há conflitos entre José Eustáquio e Falcão. Não tenho essa informação, mas é preciso deixar essa história bem clara, para que o futuro político deles saia vitorioso.
Caminho livre
Com a lacuna deixada pelo baronato, é chegado o momento de novos nomes assumirem a liderança e se apresentarem para o debate político. Aqueles que estão no jogo levam vantagem, mas, em política, as coisas mudam em questão de segundos. Falcão não é o fim da história, mas colocou ponto final em uma era política e será um dos autores da história que é construída agora. Resta saber se ele apenas ele estará à frente das decisões.