A função do ensino superior
Sou professora no ensino superior há mais de uma década. Nesse período, tenho lecionado em diferentes instituições: em uma Universidade Federal, em uma IES privada e em um Instituto de Pós-Graduação. Imagino que esteja implícito os diferentes perfis de aluno com os quais convivi (digo no passado, pois estou licenciada neste momento).
Após a discussão sobre cotas no último texto, o comentário de um conterrâneo acabou por me despertar para mais uma reflexão, que trata da atual função do ensino superior no Brasil. E a inquietação veio justamente porque o debatedor acima referido mencionou a questão da "piora" na qualidade do ensino nas universidades brasileiras (sim, sabemos que isso ocorre há muitos anos com o ensino fundamental e médio gratuitos, chegar ao ensino superior era mais do que previsto).
Por experiência própria, posso atestar que a qualidade de escrita/interpretação textual dos alunos tem caído muito (sem mencionar a capacidade de abstração e a reflexão crítica, que são intrínsecas ao domínio da Língua). Em alguns casos, a dificuldade com o uso da língua portuguesa beira o impensável. E não pensem que se trata de algo reservado ao ensino privado!
Por outro lado, já presenciei inúmeros casos de ex-alunos que se formaram "aos trancos e barrancos" e que se deram muito bem no mercado, e ocupam atualmente funções de gerência e diretoria em suas áreas (Gestão, Publicidade e Marketing, a saber).
É, portanto, oportuno questionarmos qual seria a função do ensino superior hoje no Brasil. Estariam as universidades formando mentes capazes de grandes teorizações, de reflexões/descobertas originais? Ou o utilitarismo assaltou o espaço anteriormente destinado à subjetivação (nos aspectos de singularidade e de sujeição que o termo abarca) e à produção crítica?
Em tempos de total orientação para o mercado, é mais importante formar alunos medianos que conseguem, com certo esforço, obter um emprego, comprar um carro e ajudar a família a pagar as contas, inserindo-se na aclamada "nova classe média", ou priorizar/restringir o saber (e a titulação) do ensino superior àqueles que, nivelados por esquemas do tipo vestibulares concorridos e ENEM, teriam condições de formar o grupo da "elite intelectual"?
Ainda, e principalmente, faz sentido na contemporaneidade opor estas duas classificações (techné x episteme)? Há a quem seja interessante fazê-lo?
E abrimos para o debate.
Arquiteto BIM na BIMSTONE
8 aOlá Camila. Primeiramente, quero dizer que fico contente em saber que meu comentário foi produtivo, não esperava por isso. Foi apenas a opinião de um humilde rapaz. Quanto à sua explanação, o que tenho a dizer é que vivenciamos aí justamente o reflexo daquilo que as camadas superiores do ensino e do saber estão influenciando nas camadas inferiores. Isso é uma evidência que mostra o quão uma elite intelectual pode direcionar uma sociedade, caso aquela seja boa ou ruim. E pelo que se vê, então, pode-se concluir que a vigente elite intelectual brasileira não anda bem das pernas não. Ainda mais se tratando de uma elite que admite teses mestrado sobre Valeska Popozuda, performances Macaquinhos e coisas do gênero. Hoje, os ensinos básico, fundamental e médio são totalmente direcionados para o vestibular/Enem. Enfim, as escolas seguiram essa influencia mercadológica, como você citou com propriedade no seu texto. Vemos aí a camada superior puxando, conduzindo a inferior, porque chegar à faculdade (e depois ao emprego) tornou-se o alvo, o objetivo principal do ensino. Assim, temos que cobrar de nós mesmos e (principalmente) daqueles tem papel mais direto no Educação do país. Não se pode cair na conveniência de esperar apenas "mais escolas", "sistema de cotas" ou "uniformes bonitos". Os aspectos formais são importantes, mas crucialmente os de conteúdo. E isso está mais que sintomático. A nossa língua talvez seja um dos primeiros aspectos de nossa cultura que vem sentindo essa degradação da inteligência. Então é possível aferir as por meio dela perspectivas para as quais o Brasil está seguindo. Portanto muito trabalho a fazer na esfera intelectual sim. Como disse no comentário anterior do outro texto. As mudanças tem que partir de lá, caso se queira uma evolução integral.
PhD em Ciências da Comunicação. Gerente de Marketing. Publicitária.
8 aMurilo Noleto, é você meu interlocutor aqui. Gostaria de saber sua opinião!