Gestão do Risco de Desastres nos Estados do Rio Grande do Sul e Amazonas: Um Enfoque Integrado

Gestão do Risco de Desastres nos Estados do Rio Grande do Sul e Amazonas: Um Enfoque Integrado

Autoras: Maria Isabel Barros Bellini (PUCRS), Leticia Batista da Silva (FIOCRUZ), Fernanda Xavier Arena (PUCRS)

PUCRS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

O aumento exponencial de desastres como calamidades, pandemias, enchentes, secas, deslizamentos, incêndios, mudanças extremas de temperatura, emergências climáticas gerou  uma preocupação mundial e mobilizou as Nações Unidas quanto a importância e urgência de implementar um gerenciamento integral e integrado entre políticas públicas com ênfase nos seguintes aspectos: resiliência a desastres, eficiência dos recursos, mitigação e adaptação às mudanças climáticas expressas no Marco de Sendai para a Redução do Risco de Desastres 2015-2030. 

Por sua vez, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), no que tange Saúde Única, preconiza a colaboração e articulação entre diferentes instituições (governamentais e não governamentais), seja através de políticas, programas e rede de serviços, seja através da formação de profissionais para enfrentamento de eventos que incidem na interface homem-animal-ambiente. Essas constatações impõem cada vez mais o comprometimento da sociedade como um todo e que estudos e pesquisas sejam realizadas com o intuito de criar possibilidades de enfrentar uma realidade cada vez mais preocupante.

Nessa perspectiva esse artigo apresenta o projeto “INVESTIGAÇÃO DA GESTÃO DO RISCO DE DESASTRES NOS ESTADOS DO RIO GRANDE DO SUL E AMAZONAS: contribuição para prevenção/mitigação de desastres, adaptação às mudanças climáticas e construção da resiliência”, que tem como o objetivo geral investigar os processos de gestão do risco de desastres realizado nos estados Rio Grande do Sul e Amazonas, com ênfase nas políticas de saúde e de assistência social, a fim de fomentar a cooperação e articulação entre gestores públicos contribuindo na tomada de decisão para fortalecimento da resiliência, prevenção e/ou mitigação destes eventos e seus efeitos.

Em consonância com a OPAS o projeto articula diferentes atores da Rede Saúde Única (RSU/FIOCRUZ) quais sejam: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Secretaria da Saúde (SES/RS) através da Escola de Saúde Pública/ESP/SES, Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul - FAPERGS, Universidade Federal de Santa Maria/UFSM, Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz e como co-participante a Universidade Federal do Amazonas.

Conta ainda com pesquisadores de universidades internacionais como Università degli studi Internazionali di Roma /UNINT/ Itália, University of Southern Queensland/USQ/Australia e Zululand University/África do Sul localizadas em territórios frequentemente atingidos por desastres e que, nesse projeto tem a função de consultores somando aos esforços no aprofundamento e na internacionalização de um tema tão árduo quanto urgente. É sobre esse projeto que tratam os subitens a seguir.

 

DESASTRES: eventos disruptivos da dinâmica social

 A Política Nacional de Defesa Civil define desastres como “resultado de eventos adversos, naturais ou provocados pelo homem, sobre um ecossistema vulnerável, causando danos humanos, materiais e ambientais e consequentes prejuízos” (BRASIL, 2007, p. 8).  Os desastres são classificados como: naturais biológicos (epidemias, infestações por insetos, ataques animais), geofísicos (terremotos, vulcões, movimentos de massa sem água), climatológicos (secas, temperaturas extremas, incêndios), hidrológicos (inundações, movimentos de massa com água) e meteorológicos(tempestades). Independente da classificação este tipo de evento perturba a dinâmica social com graves danos e prejuízos os quais extrapolam a capacidade dos sistemas e das populações afetadas e seu aumento exponencial global tem motivado interesse e preocupação mundial pelos efeitos catastróficos que provocam. 

Pesquisas sobre o tema destacam que as definições sobre desastre são diferenciadas e afirmam a importância de aprofundar e promover o debate sobre desastres para integrar definições e incluir diferentes áreas de conhecimento (Marques, 2018; Britton,1986; Quarantelli,1998; Garcia-Renedo,2008; Valencio, 2012; Marchezini,2009; Fritz,1961).  As lacunas dessas indefinições estão expressas também nos protocolos, legislações e planos de saúde repercutindo na limitação da gestão pública que direciona prioritariamente os recursos à infraestrutura urbana como resposta única aos desastres ambientais.

Desastres ou eventos disruptivos da dinâmica social não são fenômenos recentes, embora atualmente tenham se repetido como resultado da exploração desenfreada dos recursos naturais, do economicismo e da mercantilização podem ser enfrentados por processos de gestão  que desenvolvam “informações sobre risco de desastres específicos a cada local, incluindo mapas de risco, para os tomadores de decisão, o público em geral e as comunidades em risco de desastre, em formato adequado ...” (Marco de Sendai 2015, p.10).

Estima-se que,

entre 2008 e 2012, 144 milhões de pessoas foram deslocadas por catástrofes. Desastres, muitos dos quais são agravados pelas mudanças climáticas e que estão se tornando mais frequentes e intensos, significativamente impedem o progresso para o desenvolvimento sustentável. Evidências indicam que a exposição de pessoas e ativos em todos os países cresce mais rapidamente do que a redução da vulnerabilidade, gerando novos riscos e um aumento constante em perdas por desastres, com significativo impacto sobre a economia, a sociedade, a saúde, a cultura e o meio ambiente, a curto, médio e longo prazo, especialmente nos níveis local e comunitário. (Marco de Sendai, 2015, p.4).

A compreensão de desastre como situação complexa que impõe a criação de respostas rápidas, eficazes e articulação de diferentes atores sociais reitera que é “urgente e fundamental prever, planejar e reduzir o risco de desastres, a fim de proteger de forma mais eficaz pessoas, comunidades e países, seus meios de vida, saúde, patrimônio cultural, patrimônio socioeconômico e ecossistemas, fortalecendo, assim, sua resiliência” (Marco de Sendai, 2015, p.4).

O DOC 59-9-SAÚDE ÚNICA: um enfoque integral para abordar as ameaças à saúde na interface homem-animal-ambiente, propõe  na Linha de ação estratégica 6  ações para “Promover pesquisas e fortalecimento da capacidade sobre ameaças à saúde na interface homem-animal-ambiente em diferentes setores e disciplinas” (OPAS, 2021,p.6), e reitera que deve ser incorporado “ um enfoque de análise de riscos, levando em conta o comportamento humano e outros fatores, particularmente os desafios que afetam os sistemas dos quais a sociedade depende: saúde, produção agropecuária e meio ambiente” (OPAS, 2021,p.19). O resultado esperado seria o “fortalecimento da capacidade dos países para o gerenciamento do risco de desastres e emergências de saúde que abarque todos os tipos de ameaça, para tornar o setor de saúde resiliente aos desastres” (OPAS, 2021,p.20)

A assembleia do Escritório de Redução de Riscos de Desastres da ONU, realizada em 2015 no Japão e que gerou o Marco de Sendai 2015-2030, estabeleceu diretrizes para orientação dos governos locais afirmando a importância da “articulação clara das responsabilidades de cada uma das partes interessadas públicas e privadas, incluindo empresas e universidades, para garantir a comunicação, parceria e complementaridade de funções, bem como responsabilidade e acompanhamento” (idem, p.4).

Além de atender ao Marco de Sendai, a OPAS, as Nações Unidas em seu escopo o estudo em tela contempla os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) em especial os a seguir destacados:

“ODS 1- Erradicação da pobreza: considerando que os desastres atingem mais fortemente as comunidades já vulneráveis repercutindo na perda da renda e consequente insegurança alimentar, na precarização/perda da habitação, nas dificuldades no acesso a rede de saúde, no adoecimento físico e emocional a gestão adequada poderá mitigar os efeitos e fomentar processos de resiliência; ODS3 - Saúde e bem-estar: considera-se que os processos de vulnerabilização acentuados por desastres promovem o adoecimento emocional, as violações, a violência, as mortes, bem como a destruição dos recursos naturais e a falta de alimentos para uma parcela significativa da população o que impõe criar formas de enfrentamento e resiliência que garantam o bem-estar da população atingida; ODS11 - Cidades e comunidades sustentáveis: os 2 estados selecionados são frequentemente atingidos por desastres, o que reitera a importância de promover ações inclusivas que incluam a população atingida de forma mais direta, mas também as cidades não atingidas diretamente, promovendo formas de enfrentamento factíveis, consequentes, resilientes e sustentáveis e ODS13 - Ação contra a mudança global do clima: ao investigar os processos de gestão do risco de desastres pretende-se contribuir para o aprofundamento e conscientização a respeito da realidade dos desastres ambientais e suas repercussões” (OPAS, 2021 )

As constatações quanto as repercussões desses eventos impõem à ciência o compromisso de investigar e compreender os desastres em seus processos sócio históricos para além da “tragédia local” e em seus impactos e fatores a fim de propor respostas mais rápidas, eficazes e consistentes e prevenir /mitigar o aumento de óbitos, perda da renda, insegurança alimentar (não acesso a alimentos, doenças por alimentos insalubres, etc),  precarização/ destruição das moradias, dificuldades no acesso à rede de saúde, adoecimento humano físico/emocional (proliferação de vírus, depressão, lesões, suicídio), destruição da natureza, mortes de animais e proliferação de doenças de origem animal (doenças zoonóticas, resistência antimicrobiana, etc.). 

 

Gestão do risco dos desastres e gestão dos desastres

 No Brasil os estudos sobre desastres centralizam nos: vendavais, chuvas, secas entre outros, eventos que promovem fraturas na dinâmica social com repercussões imensuráveis e perdas de vidas atingindo violentamente comunidades, em especial as mais vulneráveis, com incremento das vulnerabilidades.

Para além da gestão dos desastres destaca-se a importância da centralidade nos processos de gestão do risco dos desastres conforme preconizado nas afirmações do Marco de Sendai (2015, p.4).

A gestão eficaz dos riscos de desastres contribui para o desenvolvimento sustentável. Os países têm reforçado suas capacidades de gestão do risco de desastres. Mecanismos internacionais de consultoria estratégica, coordenação e construção de parcerias para a redução do risco de desastres, como a Plataforma Global para a Redução do Risco de Desastres e as plataformas regionais para a redução do risco de desastres, bem como outros fóruns internacionais e regionais pertinentes para a cooperação, são fundamentais para o desenvolvimento de políticas e estratégias e para o avanço do conhecimento e da aprendizagem mútua.

Nessa perspectiva, o projeto de que trata esse artigo tem como Problemas de Pesquisa: Como a gestão do risco de desastres prevê a distribuição de recursos e investimentos a fim de potencializar ações preventivas, prevenir vazios assistenciais e construir processos de resiliência? Como as políticas de saúde e de assistência social organizam a gestão do risco de desastre principalmente o incremento dos processos de vulnerabilidade como aumento de óbitos, perda da renda, insegurança alimentar (não acesso a alimentos, doenças por alimentos insalubres, etc),  precarização/perda da habitação, dificuldades no acesso a rede de saúde, adoecimento humano físico/emocional (proliferação de vírus, depressão, lesões, suicídio), destruição da natureza, mortes de animais e proliferação de doenças provocadas por animais (doenças zoonóticas, resistência antimicrobiana,etc)? Quais as orientações quanto a ações preventivas e ou/de mitigação, ações de proteção e fomento da resiliência constam nos protocolos, planos de contingência e programas de enfrentamento de desastres?

A inserção e delimitação do estudo às políticas de saúde e de assistência social se ampara no Marco de Sendai (2015-2030) quando afirma que, tanto a redução como a gestão do risco de desastres “dependem de mecanismos de coordenação intra-e intersetoriais e com as partes interessadas em todos os níveis, exigindo também o empenho integral de todas as instituições públicas de natureza executiva e legislativa em nível nacional e local” (Marco de Sendai,2015, p.4).

A eleição dos 2 para a execução do projeto está amparada em vários estudos, como o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais e o Sistema Integrado de Informações de Desastres informam que a região Amazônica frequentemente decreta situação de calamidade pública (Sena et al., 2012ª apud Pereira, 2015) devido a desastres naturais, e que o estado do RS é frequentemente atingido por alterações extremas de temperatura que produzem estiagens e enchentes. A seguir destaca-se a realidade de cada estado em relação a desastres.

O Amazonas sistematicamente sofre com enchentes, queimadas e outros eventos desencadeados pela ganância humana pelo desejo imensurável do aumento do lucro atacando a natureza e provocando o desequilíbrio,

[...]a degradação ambiental e, em certos casos, desastres ambientais e/ou deslocamentos forçados de populações que historicamente sobreviviam dos bens da natureza. Todos estes processos constituem determinantes que incidem sobre os processos de saúde-doença das populações sendo que, na área rural da Amazônia brasileira, os resultados da apropriação privada da terra revelam-se ainda mais desafiadores por colocar em risco a vida de contingentes historicamente destituídos de direitos, particularmente as chamadas populações tradicionais constituídas por indígenas, quilombolas, ribeirinhos etc. (ARÊDA-OSHAI e Col, 2022, p.117).

            No período de 1991-2010 de acordo com CEPED/UFSC (2012) a região Amazônica registrou, 

1.117 ocorrências de desastres naturais .... Os 21 municípios com mais de 40% de seus territórios na área da bacia do rio Purus somaram 104 registros de desastres de 1971 a 2012. Os mais recorrentes (70%) foram os desastres associados ao incremento das precipitações como enchentes, enxurradas, erosões fluviais e lineares, alagamentos, rastejos, vendavais e tempestades. Os demais registros referiram-se a desastres associados à intensa redução das precipitações como secas, estiagens e incêndios florestais (SEDEC, 2014). (Pereira, 2015, p.77).

A proximidade dos municípios aos recursos pluviais “e a sua estreita relação de dependência dos recursos hídricos têm favorecido, em casos de inundações e secas, a ocorrência de desastres naturais, levando muitos municípios a decretar situação de calamidade pública” (Sena et al., 2012ª apud Pereira, 2015, p.70).

No Rio Grande do Sul registros apontam que todos os anos o estado sofre com enchentes e alteração extrema de temperatura. Desastres classificados na literatura como: meteorológicos, climatológicos, hidrológicos oriundos de eventos extremos de chuva e temperatura (Peres, 2021), e tem assolado o estado ao longo dos últimos 30 anos, com  fenômenos severos, sendo registrados 7.083 desastres naturais como secas, tempestades, ondas de frio ou calor extremo e inundações com base em notificações por município, ou seja, efeitos das mudanças climáticas, caracterizando como o estado que mais sofre com os dois extremos da umidade com a ocorrência de estiagens e inundações, desabrigando parte significativa da população.

O trabalho intitulado Desastres Meteorológicos, Climatológicos e Hidrológicos: Os Casos da Região Sul do Brasil, apresentado no encontro nacional de geografia em 2021 apontou aproximadamente 236 notificações de desastres metodológicos ente 1991 a 2020, e revelou ainda que,

São considerados desastres climatológicos as estiagens e secas; desastres meteorológicos as tempestades locais e eventos de temperatura extrema; e desastres hidrológicos as inundações, alagamentos e enxurradas. No total foram registrados 13.596 desastres, onde 6.171 são climatológicos, 1.243 meteorológicos e 6.182 hidrológicos. O PR registrou 1.816, sendo 524 climatológicos, 373 meteorológicos e 919 hidrológicos. SC registrou 1.887 climatológicos, 528 meteorológicos e 3.043 hidrológicos (5.458 desastres no total). E o RS com 6.322 registros, sendo 3.760 climatológicos, 342 meteorológicos e 2.220 hidrológicos)”. (PERES, 2021, p.1)

O Rio Grande do Sul é o estado que mais sofre com os dois extremos da umidade, os quais provocam estiagens e ao mesmo tempo inundações, alagamentos e enxurradas, segundo o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais (até 2012) e o Sistema Integrado de Informações de Desastres (de 2013 a 2020).  Destacam-se três classificações de desastres: meteorológicos, climatológicos, e hidrológicos que são oriundos de eventos extremos de chuva e temperatura (Peres, 2021).  O Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (CEPED) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), informa que a região Sul é historicamente,

marcada não somente pela ocorrência de grandes desastres, mas também pela frequência e variedade de eventos adversos. A região é frequentemente afetada por chuvas intensas, alagamentos, inundações, escorregamentos, estiagens, vendavais, tornados, nevoeiros e ressacas (CEPED UFSC, 2013a, 2013b, 2013c). No Brasil, a Classificação e Codificação Brasileira de Desastres (COBRADE) tem distintas classificações para a especificação de desastres. (BRASIL, 2012 apud Peres, 2021, p.3).

 Em acontecimentos mais recentes, no ano de 2023, o Estado do Rio Grande do Sul foi atingido por um ciclone extratropical, que causou enchentes, enxurradas e inundações deixando estragos em mais de uma centena de municípios. De acordo com o boletim divulgado pela Defesa Civil – RS (2023), até o dia 24 de setembro de 2023, já haviam sido contabilizadas 49 vítimas fatais, 9 pessoas desaparecidas, 943 feridos, 3.130 pessoas resgatadas, 106 municípios afetados, 5.177 desabrigados, 22.203 desalojados e 392.917 afetados diretamente. Em abril de 2024, os dados referentes ao número de óbitos atingiriam a marca de 54, alterando o número de desaparecidos para quatro (Defesa Civil - RS, 2024a).

No mês de maio de 2024, as fortes chuvas causaram estragos avassaladores no RS, aos quais, de acordo com balanço da Defesa Civil – RS (2024b), até o dia 10 de julho de 2024, totalizaram 478 municípios atingidos, 2.398.255 pessoas afetadas, 806 feridos, 29 pessoas desaparecidas e 182 óbitos. 

Ao repercutir na dinâmica social os desastres causam transtornos, danos globais e frequentemente esgotam as capacidades dos sistemas de proteção que apresentam dificuldades no planejamento, tomada de decisão e execução de ações tanto para mitigação e prevenção bem como no fortalecimento da resiliência.  Os processos de vulnerabilização acentuados por eventos diruptivos potencializam o adoecimento da população (ênfase em doenças emocionais como depressão, ansiedade, insônia, pânico e no extremo suicídio) com sequelas físicas /emocionais, as violações, a violência, a opressão, o suicídio, a falta de alimentos para uma parcela significativa da população,  perdas econômicas, danos ambientais com sérios prejuízos na fauna e flora, colapso da rede de proteção, profundos impactos nas políticas públicas e na sociedade em geral. e reiterando a importância de criar formas de prevenção /mitigação e resiliência a esses eventos.

Ao investigar a gestão do risco de desastres tendo como participantes gestores municipais, estaduais e trabalhadores das políticas de saúde e de assistência social esse estudo reitera a importância da articulação entre as políticas públicas, instituições de ensino e outras instituições e aponta que a complexidade dos desastres exige atores e análises diferenciadas e diversas e pesquisadores para consolidação de uma rede horizontal (Valencio,2012) impactando de forma potente na preparação de respostas às comunidades afetadas.

Importante salientar que as vulnerabilidades provocadas pelos desastres também são vivenciadas pelos trabalhadores das políticas e suas famílias e estão relacionados às condições de vida e de trabalho, a desproteção social, a fragilização dos direitos e as condições de vida que são drasticamente alteradas e pioradas. Quanto ao sistema de proteção e rede de serviços, a ocorrência de um desastre frequentemente esgota as capacidades existentes em muitos sistemas de proteção os quais enfrentam esse tipo de evento com muita dificuldade em planejar/executar/monitorar ações de enfrentamento. Esse é o alerta para as instituições prepararem recursos humanos capazes de enfrentar eventos adversos e disruptivos, e para evidenciar propostas e/ou respostas concretas que subsidiem as políticas públicas, as redes de saúde e de assistência social e qualificar o trabalho profissional na saúde e na assistência social com repercussões positivas nas condições de vida da população.

O objetivo geral de investigar os processos de gestão do risco de desastres realizado nos estados Rio Grande do Sul e Amazonas, com ênfase nas políticas de saúde e de assistência social, a fim de fomentar a cooperação e articulação entre gestores públicos contribuindo na tomada de decisão para fortalecimento da resiliência, prevenção e/ou mitigação destes eventos e seus efeitos se expressa de forma mais detalhada nos objetivos específicos: a) analisar e mapear os processos de gestão do risco de desastres mapeando atores, ações/programas / metodologias/planos de contingências previstas para o enfrentamento de desastres nas políticas de saúde e de assistência social nos 02 estados; b) fortalecer a capacidade dos estados e seus municípios para o gerenciamento do risco de desastres através da construção/proposição de metodologias (ações, programas, estratégias) de acompanhamento e monitoramento que possam subsidiar a tomada de decisão na gestão do risco fortalecendo a prevenção e/ou mitigação de desastres e a resiliência das populações e das cidades; c) ampliar a capacidade resolutiva das redes integradas de serviços de saúde e da assistência social para a prevenção, a vigilância e a organização de respostas mais ágeis a partir da articulação intersetorial das políticas públicas, instituições de Ensino Superior (com criação/fortalecimento de grupos de pesquisa, disciplinas, linhas de pesquisa, ampliação das agendas sobre o tema), sociedade civil e incorporação de novas instituições e associações dedicadas ao objeto da pesquisa; d) elaborar e socializar material científico como artigos, vídeos para capacitação, treinamento e orientação e educação de trabalhadores e da população, utilizando diferentes recursos, tecnologias digitais ou não, ferramentas científicas sobre desastres, impactos destes na interface homem-animal-ambiente e possibilidades de enfrentamento; e) organizar em conjunto com o poder público, instituições de formação, gestores/ trabalhadores de políticas públicas, órgãos de defesa, controle social e sociedade em geral eventos científicos, seminários nacionais e internacionais para socializar os resultados e estimular a colaboração entre esses atores relevantes.

Reitera-se que, para atingir os objetivos o mapeamento e análise dos atores é passo essencial “para assegurar a coordenação e a comunicação entre partes relevantes, compartilhar conhecimento e recursos, construir sinergias e identificar lacunas” (CD 59-9, 2021, p.8), assim como mapear e analisar ações/programas/serviços das políticas de saúde e de assistência social.

Diferentes realidades, políticas, processos de gestão quando investigados com rigor científico da pesquisa são qualificados e neste sentido a metodologia de pesquisa traça o caminho e a execução a serem realizados para a abordagem e apreensão da realidade. Constituindo-se de diferentes etapas a metodologia, se expressa na interação entre o processo de investigação e o seu resultado coletado, e assim inclui a teoria que fundamenta a abordagem (método) e os instrumentos utilizados para a operacionalização (técnicas) tudo isso ancorado na participação do pesquisador (Minayo, 2008), que não é neutra pois plena de experiências, valores, crenças, cultura para as quais deve atentar.  Utiliza-se o método misto que combina abordagens quantitativas e qualitativas, utiliza os pontos fortes de cada uma delas, essa opção se impõe para trabalhar com a escuta de participantes de diferentes áreas do conhecimento, em processos de trabalho diversos, tomando vários pontos de referência para aprofundar a apreensão do objeto de estudo.

A metodologia entendida como a interação entre o processo de investigação e o seu resultado coletado nas diferentes etapas da pesquisa inclui a teoria que fundamenta a abordagem (método) e os instrumentos que serão utilizados para a operacionalização (técnicas) tudo isso ancorado na participação não neutra do pesquisador. A metodologia prevê  realização de pesquisa bibliográfica; pesquisa documental; entrevista semiestruturada; grupo focal com gestores e trabalhadores das políticas envolvidas, observação e seminários para apresentação e discussão dos resultados. O estudo está delimitado aos estados do AM e RS e a seleção em cada estado de 10 municípios considera a frequência de desastres nestes municípios. As categorias de análise são: gestão do risco de desastres, resiliência, prevenção/mitigação de desastres.

O Método que guia o caminho teórico é o materialismo histórico-dialético que permite compreender o processo do desenvolvimento social, a dinâmica do real, o processo histórico no seu dinamismo e organicidade e a sua constante transformação e provisoriedade compreendida na perspectiva da totalidade. Esse método dialético compreende a realidade como em constante movimento, não estagnada ou rígida em um movimento de constante transformação.  Aprofunda sobre o contexto social, político, econômico e cultura, condições subjetivas implicadas e articula nas análises dados quantitativos e qualitativos (Prates, 2005). A ccombinação entre as abordagens quantitativas e qualitativas possibilita a elaboração de insights e uma maior compreensão do problema de pesquisa (Creswell, 2010).

As categorias historicidade, contradição e totalidade buscam a compreensão ampla da realidade e dos reflexos desta realidade no objeto de estudo,  o qual é parte de um contexto mais amplo, pois, o todo não deve ser entendido somente como o somatório das partes, e sim é um conjunto orgânico formado pelas partes relacionadas e articuladas o que significa que se influencia mutuamente para além de partes que andam lado a lado sem se influenciarem, ou seja, superando

[...] estudos contemplativos por investigações compromissadas com os temas e sujeitos envolvidos no estudo.  O pesquisador que se coloca consciente diante de uma realidade da qual faz parte e pela qual é necessariamente influenciado tem a sensação do ponto no universo, pequeno diante da complexidade do real e grande diante da possibilidade de seu desvendamento. (PRATES, 2005,p.2)

A natureza interdisciplinar da pesquisa contribui para formação de equipes compostas de profissionais de áreas diferentes, com perspectivas teóricas diferentes, porém com interesses e compromissos comuns na triangulação necessária para a confiabilidade da pesquisa.


Reflexões parciais

A pretensão com esse projeto de pesquisa é reiterar a importância de potencializar ações concretas, produção acadêmica, estudos e pesquisas, debates e articulações colaborativas para fortalecimento das políticas públicas no enfrentamento de eventos disruptivos da dinâmica social cada vez mais frequentes e destruidores da vida social e comunitária.  A complexidade do objeto eventos disruptivos da dinâmica social (calamidades, desastres, enchentes, secas, deslizamentos, incêndios de grandes proporções, mudanças extremas de temperatura, emergências climáticas) exige das equipes envolvidas, ousadia, inovação, criatividade na diversidade de recursos metodológicos que permitam um olhar mais completo e complexo.

 A inflexão para o tema dos desastres e/ou acontecimentos disruptivos da dinâmica social é uma inclusão de rota necessária no compromisso de investigar e compreender impactos e fatores e em parceria com outros países igualmente ou mais atingidos por eventos disruptivos.  A análise das falas dos gestores das políticas de saúde e de assistência social, das legislações, protocolos, planos e contingencia, a revisão da bibliografia e documental, as pesquisas, estudos brasileiros e outros fornecerão material consistente sobre a gestão do risco de desastres com possibilidade de propor orientações quanto as responsabilidades, articulações necessárias e ações a serem desenvolvidas.

As possibilidades de enfrentamento dos desastres e suas consequências exigem estratégias interdisciplinares e multissetoriais a fim de contemplar a proteção das vidas tanto das pessoas como dos animais e a proteção dos ambientes e contribuir na produção de conhecimento que repercuta em práticas “multissetoriais e orientadas para uma variedade de perigos, devendo ser inclusivas e acessíveis para que possam se tornar eficientes e eficazes” (idem, p.5) o que é apontado na literatura e nas pesquisas sobre desastres que as possibilidades de enfrentamento devem ser coletivas, interinstitucionais, intersetoriais e interdisciplinares.

A execução do projeto tem apontado seu potencial para contribuir e enriquecer o desenvolvimento científico na medida em que se volta para o estudo territorial das rupturas e, ainda, das ações de prevenção e mitigação implantadas e/ou previstas pelo Estado apresentando um potencial de colaborações e intercâmbios com instituições nacionais e internacionais por conta dos seus membros de equipe. e que ao fim e ao cabo fortaleça “as capacidades nacionais e regionais de preparação, prevenção, detecção, vigilância e resposta a surtos de doenças e às emergências e desastres que afetam a saúde da população” (OPAS, 2021,p.22).

As análises apontarão potencialidades, lacunas, informações quanto a organização, planejamento, tomada de decisão, e as possibilidade de proposição de ações coletivas e multidisciplinares de apoio e acesso aos serviços de proteção e aos direitos sociais fortalecendo políticas comprometidas com a satisfação das necessidades da população, repercutindo no melhor enfrentamento e na mitigação dos efeitos desses eventos na vida das populações.

Reitera-se que, investigar os processos de gestão do risco de desastres repercute na prevenção e/ou mitigação do desastre e, portanto, na prevenção de inúmeras doenças que atingem humanos, animais e a natureza como um todo, visto que os desastres atingem a sociedade na sua totalidade.

Entre para ver ou adicionar um comentário

Conferir tópicos