HIPÓTESES DE SAÍDA DE SÓCIO DE UMA EMPRESA E DE PAGAMENTO DOS HAVERES SOCIAIS
A saída de um sócio é um processo relevante tanto para a continuidade das operações da empresa quanto para a salvaguarda dos direitos do próprio sócio retirante. No Brasil, o Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) oferece uma regra de saída de sócios de uma sociedade e do respectivo pagamento dos haveres sociais. Porém, essa regra é uma diretriz geral que os sócios devem adequar aos seus interesses, ou seja, há liberdade para combinarem outro formato que mais se adeque à vontade de todos.
Quais seriam os formatos possíveis, ou os mais comuns? Neste artigo, vamos explorar as diversas hipóteses de saída de sócio, as formas de pagamento dos haveres sociais e uma inovadora alternativa de uso de seguro de vida resgatável.
HIPÓTESES DE SAÍDA DE SÓCIO
A saída de um sócio de uma empresa pode ocorrer de várias maneiras, conforme estipulado pelo próprio Código Civil:
A saída pode ser voluntária, quando o sócio decide deixar a sociedade voluntariamente, o que geralmente requer um aviso prévio aos demais sócios, conforme o acordado no Contrato Social da empresa.
Outra hipótese é a exclusão, geralmente por justa causa, que ocorre quando o sócio não cumpre determinada obrigação ou colocar em risco a continuidade da empresa por comportamento incompatível com as atividades empresariais. Nesse caso, tanto a obrigação descumprida como a consequente exclusão devem estar previstas no Contrato Social.
Outro evento que implica saída do sócio, obviamente, é seu falecimento, ou seja, a hipótese morte. A morte de um sócio geralmente leva à necessidade de liquidação de sua parte na sociedade, a menos que o Contrato Social preveja a sucessão pelos herdeiros.
Qualquer que seja a hipótese de saída do sócio, haverá necessidade de a empresa pagar seus haveres sociais, quer dizer, o valor correspondente às suas quotas. Obviamente, esse valor não é nominal, aquele que corresponde ao valor exato das quotas previsto no Contrato Social. Então, como definir esse valor e a forma de pagamento?
DEFININDO E PAGANDO OS HAVERES SOCIAIS
O Código Civil, no artigo 1.031 e respectivos parágrafos, oferece diretrizes gerais sobre o pagamento dos haveres, que devem ser efetuados com base no balanço patrimonial ajustado à data da resolução da sociedade em relação ao sócio que está saindo:
Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
§1o O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota.
§2o A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou estipulação contratual em contrário.
O artigo 1.031 indica a forma de cálculo dos haveres sociais com base na situação patrimonial da empresa na data em que o sócio dela se retirou. A empresa deve elaborar um balanço especial para apurar, nesse dia específico (data-base), sua situação (balanço de determinação), cálculo esse que resultará no valor da quota e, consequentemente, o valor a ser pago ao sócio.
A mesma regra é definida no artigo 606 do Código de Processo Civil, para os casos em que a saída do sócio está sendo resolvida em ação judicial, como a ação de dissolução parcial da sociedade, por exemplo.
Art. 606. Em caso de omissão do contrato social, o juiz definirá, como critério de apuração de haveres, o valor patrimonial apurado em balanço de determinação, tomando-se por referência a data da resolução e avaliando-se bens e direitos do ativo, tangíveis e intangíveis, a preço de saída, além do passivo também a ser apurado de igual forma.
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Analisando essas disposições legais vê-se a importância de a empresa ter um Contrato Social com regras bem definidas, não só com relação às hipóteses de saída dos sócios mas, também, em todos os aspectos.
E aqui fica um alerta: é comum, especialmente nas empresas familiares, não se praticar uma contabilidade que reflita o valor efetivo do negócio. As empresas possuem ativos intangíveis valiosos, como uma marca reconhecida, uma extensa carteira de clientes ou tecnologia avançada, que frequentemente não são registrados adequadamente. Além disso, é comum não haver uma distinção clara entre os bens da empresa e os dos proprietários, resultando no uso de ativos pessoais nas operações empresariais, o que impede uma contabilização adequada pelo método do valor patrimonial.
A falta de um Contrato Social ou de um Acordo de Sócios com regras claras, aliada à uma contabilidade precária que não reflita o patrimônio efetivo da empresa, pode gerar conflito no momento da saída do sócio que, invariavelmente, só será resolvido da forma mais custosa: ação judicial.
Apenas para registrar, já que muitos empresários buscam por essa opção diante da situação aqui tratada, outra forma, porém menos usual atualmente e já superada pelo Superior Tribunal de Justiça em 2021, é a apuração com base no critério econômico segundo a metodologia do fluxo de caixa descontado, cujo objetivo é retratar uma expectativa de rentabilidade futura da empresa. No julgamento do Recurso Especial 1877331 / SP, a 3a. Turma entendeu que essa metodologia “utilizada comumente como ferramenta de gestão para a tomada de decisões acerca de novos investimentos e negociações, por comportar relevante grau de incerteza e prognose, sem total fidelidade aos valores reais dos ativos, não é aconselhável na apuração de haveres do sócio dissidente.”
Por outro lado, vale lembrar que esse formato é mais utilizado na alienação da participação societária ou nas operações de fusões e aquisições, quando, aí sim, é necessário saber valores projetados para o futuro, visando entender o que o negócio pode alcançar.
Quanto à forma de pagamento, caso o Contrato Social não mencione nada a respeito prevalecerá o que diz a lei, ou seja, deverá ocorrrer em até 90 dias da liquidação. Isso pode impactar o caixa da empresa, a depender do valor apurado, então, é recomendável que os sócios definam formato diferente e que esteja mais alinhado com os seus negócios.
Assim, além dessa sugestão legal, existem práticas de mercado que podem ser adotadas, incluindo:
- Pagamento à Vista: A forma mais simples e direta, embora possa ser financeiramente onerosa para a empresa.
- Parcelamento: Comum quando o pagamento à vista poderia afetar a saúde financeira da empresa. O parcelamento pode ser mensal, semestral ou até anual, basta que todos concordem e constem isso por escrito no Cotnrato Social ou no Acordo de Sócios.
- Compensação com ativos não monetários: Em alguns casos, a empresa pode optar por compensar o sócio retirante com ativos da empresa, como imóveis ou participações em subsidiárias.
SEGURO DE VIDA RESGATÁVEL COMO ALTERNATIVA
Uma prática inovadora que tem ganhado popularidade é o uso de seguros de vida resgatáveis. Esse tipo de seguro permite que a empresa faça pagamentos periódicos a uma apólice de seguro de vida que, no evento da saída do sócio, pode ser resgatada para financiar o pagamento dos haveres sociais.
Esta solução oferece várias vantagens:
- Previsibilidade Financeira: Permite à empresa planejar financeiramente a saída de sócios, evitando impactos significativos no fluxo de caixa.
- Flexibilidade: As apólices podem ser ajustadas em termos de valor e periodicidade de pagamento, adaptando-se às necessidades tanto da empresa quanto do sócio.
- Proteção Adicional: Além de servir como um mecanismo de liquidação dos haveres sociais, a apólice também pode proporcionar proteção adicional ao sócio e sua família.
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A saída de um sócio de uma empresa é um processo complexo que requer compreensão clara das obrigações legais e das opções financeiras disponíveis. A legislação brasileira oferece um quadro sólido para a gestão dessas situações, mas isso não retira dos empresários a obrigação de refletirem documentalmente suas vontades em concordância com os negócios explorados, de modo a preservá-los e, ao mesmo tempo, pagar de forma adequada o sócio retirante (ouseus herdeiros, em caso de falecimento)
Além disso, pensar em alternativas de pagamento desses haveres sociais pode preservar o caixa da empresa e, ao mesmo tempo, evitar conflitos, como, por exempo, o uso de seguro de vida resgatável, que se apresenta como alternativa inovadora que pode beneficiar tanto a empresa quanto o sócio retirante.
De um modo ou de outro, as empresas devem procurar aconselhamento jurídico e financeiro adequado para decidir essas questões de forma eficaz.
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6 mMarina Flandoli seu artigo sobre as hipóteses de saída de sócios e o pagamento dos haveres sociais é extremamente esclarecedor e aborda um tema crucial para a saúde financeira e jurídica das empresas. Um ponto que merece destaque é a introdução do seguro de vida resgatável como uma solução inovadora e eficaz para essas situações. A importância do seguro de vida resgatável não pode ser subestimada. Ele oferece uma previsibilidade financeira essencial, permitindo que as empresas planejem com antecedência e gerenciem os pagamentos dos haveres sociais sem comprometer o fluxo de caixa. Além disso, essa abordagem proporciona uma camada adicional de proteção tanto para o sócio retirante quanto para a empresa, evitando conflitos e garantindo uma transição mais tranquila e segura. Parabéns pelo artigo e por trazer à tona soluções práticas e inovadoras para a gestão empresarial!