História da Mineração no Brasil (16) – A polêmica do minério de ferro em Minas Gerais

História da Mineração no Brasil (16) – A polêmica do minério de ferro em Minas Gerais

Na primeira década do século XX, mais precisamente em 1909, vários grupos estrangeiros passaram a adquirir terras em Minas Gerais, as quais continham no subsolo jazidas de minério de ferro, lembrando-se que, segundo a legislação mineral vigente à época, o superficiário era proprietário também do subsolo. Desde então, a política adotada pelo governo era de criar obstáculos para a exportação. Leis e decretos foram promulgados estabelecendo que apenas os empresários que produzissem aço teriam direito a exportar uma parte do minério. Ciente dessas condições a companhia inglesa Brazilian Hematite Syndicate adquiriu, em 1910, uma das maiores jazidas do país, localizada em Itabira, Minas Gerais, com reserva estimada em mais de um bilhão de toneladas.

Em 1910, foi realizado em Estocolmo o XI Congresso Internacional de Geologia, oportunidade em que foi divulgado um estudo detalhado sobre as jazidas de ferro da região de Itabira, Nele Derby apresentou o estudo de avaliação da possança das jazidas de minério de ferro da região Centro de Minas Gerais, assinalando as reservas inferidas, suas posições geográficas e as vias férreas que as ligavam ao litoral do país, ou seja, aos portos de exportação. Essa comunicação reportava o pensamento e trabalhos de várias gerações de engenheiros de minas formados na Escola de Minas de Ouro Preto sobre as possibilidades industriais daquela região que, mais tarde viria a ser chamado de Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais.

De Claude Henry Gorceix a Clodomiro de Oliveira, passando por Joaquim Cândido da Costa Sena e Pandiá Calógeras, entre outros, desde fins do século XIX já vinham assinalando as possibilidades da fabricação do ferro, do fero-gusa e do aço, com base no carvão de madeira disponível na região. Com trabalhos específicos de alto nível científico, esses autores mostravam as possibilidades do desenvolvimento da siderurgia a carvão de madeira. Esta visão de industrialização contrapunha-se à posição defendida por outros siderurgistas que, tais como o professor Ferdinando Laboriau, na década de 20, mostravam-se radicalmente descrentes desse tipo de siderurgia, não crendo senão na grande siderurgia a coque. A comunicação realizada no Congresso de Geologia de Estocolmo seguia, portanto, uma política deliberada e precisa do Governo Federal, no sentido da facilitação da exploração e exportação dos minérios de ferro, visando o fortalecimento da pauta das exportações e reforço da balança de pagamentos do país, no curto prazo, bem como no desenvolvimento de uma política siderúrgica realista em um futuro próximo.

Em 1911, a companhia inglesa supracitada organizou a Itabira Iron Ore Co., o que provocou a oposição de vários grupos nacionais, tendo como opositor principal o mineiro Artur Bernardes (Presidente do Brasil entre 1922 e 1926). Quando Presidente da Província de Minas Gerais (1918 a 1922) promulgou uma lei majorando o imposto de exportação do minério de ferro para as companhias interessadas apenas na exportação e reduziu o imposto para as empresas que instalassem usinas siderúrgicas em Minas Gerais. Assim, em 1920, a Itabira Iron, agora também com capital norte-americano representado pelo empreendedor Percival Farquhar*, assinou contrato com o governo brasileiro (Presidente Epitácio Pessoa), permitindo a construção e exploração de altos-fornos de coque, fábricas de aço e laminação, além de duas linhas férreas que ligariam as minas à Estrada de Ferro Vitória Minas (EFVM), além de um cais em Santa Cruz, Espírito Santo. Esse contrato, após inúmeras discussões envolvendo o Tribunal de Contas e o Congresso Nacional, foi finalmente legalizado em 1928.

No entanto, o contrato estipulava que a Itabira Iron só poderia começar a exportar minério de ferro quando entrasse em funcionamento a usina siderúrgica, que, para sua instalação e administração, deveria ser constituída uma companhia nacional, o que não aconteceu. Já durante o governo Vargas, em 1939 foi declarada a caducidade do referido contrato, conforme Decreto nº 1.507. Embora a Itabira Iron tenha sido mantida, um grupo de brasileiros constituído por Gastão Vilela, Oliveira Castro, Ribeiro Junqueira, Mário Tibiriça, Amintas Jaques de Moraes e Atos de Lemos Rache, fez uma aliança com Percival Farquhar para fundar a Companhia Brasileira de Mineração e Siderurgia, que incorporou a EFVM e obteve o arrendamento das minas de Itabira mediante o compromisso de pagamento de royalties pelo prazo de 25 anos.

Por fim, durante a Segunda Guerra Mundial, iniciada em 1939, quando a Inglaterra necessitou de uma fonte emergencial para o abastecimento de minério de ferro à sua indústria bélica, as minas de Itabira foram transferidas para o governo brasileiro através dos Acordos de Washington, com a participação conjunta do governo americano, ratificados pelo Decreto-Lei nº 4.352, de 1º de junho de 1942. Esse documento criou também a empresa de economia mista Companhia Vale do Rio Doce S.A., a qual, além das minas e jazidas, adquiriu o acervo da EFVM. Encerrava-se, assim, a saga da Itabira Iron Ore.


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* Percival Farquhar (1864 – 1953, foto google.com), nascido na Pensilvânia (EUA), iniciou suas atividades empresariais no Brasil em 1904 fundando a Rio de Janeiro Light & Power, companhia que unificou várias concessões de serviços públicos do Rio de Janeiro relativas ao transporte por bondes, à iluminação a gás e à energia hidrelétrica. Na região amazônica obteve a concessão para construir e explorar o Porto de Belém; formou a Companhia de Navegação da Amazônia; criou a Amazon Development Company e a Amazon Land & Colonization Company, para a qual foram doadas terras que hoje constituem o território do Amapá. Em 1906 fundou a Brazil Railway Companhy, com o projeto de constituir um grande sistema ferroviário unificado na América do Sul, adquirindo várias estradas de ferro, em São Paulo, no sul do Brasil e em países vizinhos. Instalou uma grande serraria em Três Barras (SC), além de extensas fazendas de gado em Mato Grosso e em Minas Gerais, fundando, também, o primeiro grande frigorífico do Brasil, em Osasco (SP).

Após um período de decadência de seus empreendimentos, devido à conjuntura da Primeira Guerra Mundial, voltou a atuar no Brasil em 1919, com o projeto de ativação da Itabira Iron Ore Company, mas que não obteve sucesso devido à oposição nacionalista encabeçada por Artur Bernardes. Em 1939 Faquhar fundou a Companhia Brasileira de Mineração, o qual detinha 47% das ações, bem como os bens parciais e jazidas da Itabira Iron. Em 1942, o governo fundou a Companhia Vale do Rio Doce e comprou todos os direitos e propriedades da Itabira Iron. A última iniciativa de Farquhar no Brasil foi a criação, entre 1946 e 1950, da Companhia Aços Especiais Itabira (Acesita), cujo controle passou ao Banco do Brasil em 1952.

Fonte:

Machado, I. F. e Figueirôa, S. F. de M. História da Mineração Brasileira. Curitiba: Editora CRV, p. 149 a 153, 2020.

 

O texto foi extraído, em sua essência, do livro História da Mineração Brasileira. As referências bibliográficas não foram explicitadas no texto e devem ser obtidas nas páginas indicadas na referência. Objetiva-se, nesta postagem, divulgar fatos, dados e curiosidades que alimentam, desde o início de sua colonização, a história da mineração no Brasil.

Data: 16/07/2022

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