Maternidade continua sendo uma escolha quase antagônica à vida profissional.

56% das mulheres são demitidas após licença-maternidade (Exame.com).

Mulheres perdem trabalho após terem filhos (Portal FGV).

Trabalhadoras com maior escolaridade apresentam queda de emprego de 35% [...]. A maior parte das saídas do mercado de trabalho se dá sem justa causa e por iniciativa do empregador (valor investe/globo.com).

Essas são algumas das notícias que regularmente lemos quando o assunto gira em torno da maternidade no mercado de trabalho. Uma pesquisa realizada pelo IBGE em maio de 2023, afirma que a maternidade continua sendo uma escolha quase antagônica à vida profissional.

Embora não exista uma 'justa causa', suspeita-se que a dificuldade para conciliar a vida profissional com a responsabilidade pela criança ainda predomine como um dos principais motivadores.

Frente a essa realidade, como mulher, mãe e executiva de uma das maiores empresas de alimentos do mundo, considero-me privilegiada por fazer parte dos 44% que não foram – embora conheça alguém que tenha sido – demitidos devido à maternidade.

 E sobre essa perspectiva, meu intuito não é enfatizar os 56%, mas mostrar que, sendo mãe – muito jovem, não apenas me tornei uma pessoa melhor, mas também desenvolvi habilidades e competências que organizações, por mais competentes que pudessem ser, talvez não fossem capazes de ensinar.

Como mãe, pude aprender o significado da necessidade. Sempre gostei de trabalhar e adoro o que faço, mas, vindo de uma família humilde, por muito tempo, minha motivação foi garantir o sustento básico da minha família.

Como mãe, encontrei um propósito de vida. E com ele, uma necessidade intrínseca de realizar algo que fosse significativo, que proporcionasse, por mais insignificante que fosse, um mundo melhor para as pessoas.

Como mãe, percebi que a vida não oferece muita margem de erro.

Eu sempre quis ser a melhor mãe do mundo porque, na minha cabeça, o risco era - e é - absurdo. Uma decisão errada, uma conversa mal interpretada, a falta de confiança que pudesse haver na nossa relação, poderia mudar o rumo das coisas. E o medo de errar fez de mim uma pessoa muito mais planejada, racional, cautelosa e preparada.

O fato é que ter alguém que depende inteiramente de você reorganiza suas prioridades. E, família, trabalho, seu papel social, educação, espiritualidade passam a ocupar lugares diferentes .

Foi nas conversas com meu filho que aprendi sobre empatia, respeito, justiça, resiliência, afeto, paciência e responsabilidade.

Foi pensando nele que percebi que precisava de independência financeira. E isso me motivou a sair da zona de conforto, a me capacitar, a fazer escolhas ousadas e a não temer os desafios - que, com o tempo, foram se tornando menores.

Foi sendo mãe que aprendi sobre gestão de tempo, prioridades e urgências.

Fiz faculdade, pós-graduações, mestrado, estudei inglês, espanhol, mudei de área, mudei de cidade (diversas vezes) e, incrivelmente, não deixei de cuidar de mim ... de viajar, sair com amigos, me apaixonar, conhecer lugares diferentes, passar férias com meu filho, ir à academia, etc.

Foi sendo mãe que pude sentir na pele a dificuldade em conciliar a vida profissional com a responsabilidade da maternidade [que não é trivial].

E como mãe, não posso reforçar verdades tão enraizadas como essa de que a maternidade descredencia uma mulher no mercado de trabalho. Pelo contrário, com base na minha experiência e nos 44% que compõem essa estatística, considero uma grande incoerência permanecermos ignorando os efeitos da maternidade na mulher, quando muito do que aprendemos como mãe é exatamente o que buscamos incessantemente nas organizações.

Dito isso, meu conselho é que, sempre que pensar em contribuir com os 56%, lembre-se do que você pode estar perdendo com os 44%.