Não seja menos do que você mesmo
Use o melhor de você a seu favor. É autoconhecimento, mas também é técnica e é simples.

Não seja menos do que você mesmo

O receio de ser sua melhor versão pode estar impedindo você de criar conexão

Com um desabafo a colunista Lucy Kellaway, do Financial Times, tornou público um medo que muita gente tem: “os ensaios que o TED exige me transformaram em uma versão barata e artificial de mim mesma”.

 Essa não é, nem de longe, a orientação que a organização do evento passa. Quem já acompanhou mais de perto sabe disso. Mas entendo que, no fim, o que vale é a sensação do que foi vivido. E, talvez, a sensação de se apresentar com um roteiro que não foi 100% autoral pode parecer artificial, principalmente para quem tem essa característica predominante. Cuidado: essa sensação não quer dizer que o resultado não tenha sido alcançado...

A principal objeção de muitos executivos às técnicas de apresentação é, exatamente, a de perder as rédeas do próprio discurso. Mesmo conscientes de um cenário internacional em que essa competência tem sido um diferencial estratégico (veja como o presidente do Google se destacou internacionalmente pela sua performance no último evento da companhia), no Brasil, a memória de comunicadores antiquados, propaga o pré-conceito aos treinamentos bem-sucedidos por lá.

Um exemplo: As técnicas de oratória, nascidas em um tempo em que a comunicação era bem diferente, pregam determinados comportamentos universais, que todos, igualmente, independentemente de personalidade e objetivo, deveriam adotar para alcançar melhores resultados. Fórmulas prontas que, se levadas a ferro e fogo, engessam - mesmo. Essa cartilha não é uma exceção no mundo da comunicação, mas é passado.

Quando entrei na Globo, na década de 90, havia um padrão muito rígido para apresentadores e repórteres. Todos deviam se vestir sob as mesmas regras, ter a mesma atitude quando no vídeo: mesma forma de narrar, mesma postura corporal. O padrão Globo, no geral, retirava as características pessoais em nome do profissionalismo. Nada que as redes internacionais também não fizessem.

Nos últimos anos, com a ascensão mundial do discurso da empatia como ponto de partida para relacionamentos, esses rostos também ganharam direito à personalidade.

E, realmente, com interações mais espontâneas, o público percebeu a mudança como fortalecimento do profissional. A entrada ao vivo não tem mais texto decorado, ufa!

No universo corporativo, com exceção do telemarketing, que continua a robotizar discursos, outros times também passam por essa transformação. O time de vendas, por exemplo, tem sido cada vez mais incentivado a buscar, em repertórios pessoais, os pontos de conexão com cada um de seus clientes. Pesquisas e mais pesquisas, com boas dicas sobre o comportamento humano criam base para novas formas de interagir.

Mas como usar esses instrumentos?

Se toda interação é uma apresentação de ideias e deve ser espontânea, como as técnicas contribuem? Contribuem com elementos que, comprovadamente, aumentam o alcance quantitativo e também qualitativo. Contribuem para aumentar o impacto da sua mensagem.

Sua performance não será uma versão de você. Será você inserido na vida de cada uma dessas pessoas, dentro da realidade como cada uma delas entende e vive. Por isso, elas vão te ouvir. E vão te seguir, já que terá criado conexão capaz de transformar.

Putz... Tá lindo, mas é nesse momento que vem aquela imagem de todo mundo olhando o celular enquanto fala?

Por outro lado, quando um grande orador está falando, você nem se lembra de checar mensagens, né? Nem quando aquele filme campeão de bilheteria, tá naquela cena decisiva...

Situações que não acontecem por acaso. São fruto de muito trabalho, de muito estudo para descobrir os ciclos de atenção próprios do ser humano. É a formatação nessa estrutura que garante que o público acompanhe tudo que tem a dizer ou mostrar do começo ao fim.

Sim, muito provavelmente usar o método quer dizer construir a comunicação de um jeito que pode não ser exatamente o que tinha pensado originalmente. O que não quer dizer mudar sua mensagem, sua intenção, nem você. É achar a composição para que ela reverbere mais longe, por mais tempo, com mais força para mobilizar.

Para quem é muito autoral, vai uma reflexão: bons autores se tornaram excelentes com um empurrãozinho de editores experientes.

Ah! Só mais uma: E até mesmo a Bíblia tem sido adaptada, com regularidade, para ser melhor compreendida. Será que teria o mesmo número de seguidores se continuasse com as palavras que eram usadas há centenas de anos e que hoje ninguém mais usa?



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