Nossos hábitos nos controlam mais do que você possa imaginar

Nossos hábitos nos controlam mais do que você possa imaginar

“Toda a nossa vida, na medida em que tem forma definida, não passa de uma massa de hábitos — práticos, emocionais e intelectuais — sistematicamente organizados para nossa felicidade ou nosso sofrimento e nos conduzindo irresistivelmente rumo ao nosso destino, qualquer que seja ele”. (William James)

Pode parecer estranho ler que somos controlados pelos nossos hábitos e que eles irão direcionar o nosso destino, mas o fato é que somos “programados” a viver em função deles. Isto é o que diz Charles Duhigg, autor do livro “O Poder do Hábito”, que explica detalhadamente a partir de diversos exemplos e estudos como os hábitos afetam nossas vidas.

Os hábitos surgem porque o cérebro está o tempo todo procurando maneiras de poupar esforço e energia. Se deixado por conta própria, o cérebro tentará transformar quase qualquer rotina num hábito, pois estes permitem que nossas mentes desacelerem com mais frequência. Este instinto de poupar esforço é uma enorme vantagem evolutiva, pois nos permite parar de pensar constantemente em comportamentos básicos, tais como andar, comer, tomar banho, para pensar em novas ideias e invenções que foram revolucionárias à humanidade.

Os pesquisadores constataram que os hábitos são mantidos em umas das estruturas mais primitivas e profundas do cérebro: os gânglios basais. Essas estruturas se encontram na região mais central do crânio e são parecidos com aquilo que se encontra dentro da cabeça de um peixe, réptil ou outros mamíferos. De fato, constata-se que os próprios animais mantêm seus hábitos. Portanto, os hábitos são práticas naturais e instintivas de sobrevivência do ser humano desde seus primórdios.

Mas como que o cérebro cria e mantém os hábitos? A reposta está no chamado loop do hábito que está representado na figura abaixo:

A deixa é um estímulo que manda o cérebro entrar em modo automático e indica qual hábito deve usar. Normalmente a deixa surge devido um lugar, horário, estado emocional, outras pessoas ou uma ação imediatamente anterior. A rotina é o hábito de fato, que pode ser físico, emocional ou mental. E, finalmente, a recompensa é o estímulo que ajuda o cérebro a saber se vale a pena memorizar esse hábito em específico para o futuro.

Como exemplo, temos o hábito de escovar os dentes, em que a deixa seria o final de uma refeição, a rotina a ação de escovar os dentes em si e a recompensa a sensação de ardido na boca (isso mesmo, a recompensa para o cérebro não é ter os dentes limpos e sim a sensação de refrescância na boca).

Porém, o que realmente irá manter o hábito de uma pessoa é a ansiedade pela recompensa. No exemplo acima, de escovar os dentes, todos nós que mantemos este hábito temos o anseio pela sensação de ardido da pasta de dente após as refeições. O mesmo é válido para a espuma do sabonete e do shampoo. Ambas as características (ardência e espuma) não modificam em nada a eficiência dos produtos, mas os fabricantes sabem que, sem estas funcionalidades, boa parte dos clientes não irão criar o hábito de utilizá-los.

Outro exemplo é o fato de algumas pessoas manterem o hábito de fazer exercícios físicos pela ansiedade do bem estar no final dos exercícios (especialmente pela liberação de endorfina que aprenderam a ansiar).

Mas o que pode ser feito para mudar os hábitos?

De fato, mudar nossos hábitos, especialmente os ruins, não é fácil. Como explicado acima, nosso cérebro literalmente aprende a praticar os hábitos no “piloto automático”, sem darmos atenção direta a eles. Sem falar no fato que cada hábito, para ser mudado, requer uma estratégia diferente. Mas existe uma linha geral que pode ser seguida.

Segundo Charles Duhigg, a regra de ouro para a mudança de hábito é manter a mesma deixa e a mesma recompensa do hábito antigo para a inclusão de uma nova rotina. Por exemplo, se quiser parar de fumar, é necessário descobrir uma rotina diferente que vá satisfazer os anseios preenchidos pelo cigarro. Se quiser parar de roer unha, é necessário realizar uma outra rotina para o anseio por estímulo físico. A estratégia que pode ser adotada está listada abaixo com um exemplo do autor do livro para parar de realizar um hábito no trabalho que o fazia engordar:

1º passo - Identifique a rotina: este é o passo mais simples, porque, de fato, trata do próprio hábito em si. No exemplo do livro, a rotina é sair da mesa de trabalho para ir à cafeteria comer um cookie.

2° passo - identifique qual o anseio/recompensa que se busca no hábito: Este passo é mais difícil, pois muitas vezes não estamos cientes de qual recompensa buscamos em um hábito. A estratégia para esse entendimento é realizar experimentos com rotinas um pouco diferentes para proporcionar recompensas diferentes. Por exemplo, para descobrir qual a recompensa buscada quando o autor saía de sua mesa de trabalho, ele fez alguns testes em dias diferentes - apenas andava pelo quarteirão, apenas comia uma maça ou apenas ia na mesa de um colega para bater um papo (recompensas testadas: uma pausa, saciar fome e conversar, respectivamente). Ele descobriu que, na verdade, ele queria apenas conversar e ter contato humano.

3° passo - isole a deixa: este passo também é difícil porque somos bombardeados com muitas informações quando nossos comportamentos se manifestam. O segredo, nesse caso, é perceber e anotar o atual estado da deixa em cinco categorias: lugar, hora, estado emocional, outras pessoas e ação imediatamente anterior. O autor percebeu que era o horário que dava a deixa para o seu hábito (entre 3 e 4 horas da tarde).

4° passo - tenha um plano: uma vez descoberto o loop do hábito, que é o mais difícil, agora é só traçar um plano para substituir a rotina por algo mais "saudável". No exemplo, o autor, em vez de ir à cafeteria quando tinha a deixa, passou a ir na mesa de algum amigo para conversar por 10 minutos. No começo foi difícil, mas no final a rotina se tornou automática, já que ele tinha descoberto que a recompensa a ser buscada não era o cookie e sim conversar.

Se desejar, veja o próprio autor contando sua estratégia no vídeo abaixo:

 O mais importante é ter a consciência

Entretanto, nenhuma estratégia será o suficiente se realmente não percebemos que vivemos em função de nossos hábitos. É muito comum as pessoas não saberem que algumas de suas práticas e pensamentos são hábitos enraizados em seus cérebros.

O autor cita alguns exemplos de ações e comportamentos que poucas pessoas reconhecem como hábitos. Fazer compras é umas delas. Nós tendemos a comprar sempre os mesmos produtos e as mesmas marcas de forma involuntária, sem nenhum raciocínio complexo. Outro exemplo é ouvir músicas no rádio. Nós tendemos a ouvir sempre as músicas que temos familiaridade com as melodias e ritmos que estamos acostumados e não porque raciocinamos que seja uma música que a gente gosta de fato.

O interessante é que os hábitos não se manifestam apenas nos indivíduos, mas também podem ser vistos em instituições (empresas, governo e etc) e na sociedade de forma geral (bairros, comunidades, grupos específicos e etc). É claro que são as pessoas que mantém esses hábitos, mas a manifestação é coletiva. Um exemplo são os hábitos alimentares que variam muito em diversos países.

Para finalizar, segue uma metáfora que simboliza o fato de viver sem ter consciência dos seus hábitos:

“Um grande peixe encontra dois outros pequenos nadando em sentido contrário e lhes diz... bom dia meninos, como vai a água? Aí, um deles olha para o outro e diz... água? O que vem a ser água? ” (David Foster Wallace)

A água são os nossos hábitos, as escolhas impensadas e decisões imprevisíveis que nos cercam todos os dias e que, pelo simples fato de olharmos para elas, se tornam visíveis de novo.

Dessa forma, o primeiro passo é ter a consciência que podemos estar sendo controlados pelos nossos hábitos sem percebemos. Após, é necessário acreditar que pode mudar e fazer disso uma rotina, um novo hábito. Assim, a mudança irá se tornar real para qualquer área de sua vida (financeira, profissional, social, saúde e etc).

Este é o verdadeiro poder do hábito: a revelação de que seus hábitos são o que você escolhe que eles sejam. Uma vez que essa escolha ocorre, e torna-se automática, ela não apenas é real, como começa a parecer inevitável, como na citação de William James do começo do artigo, que nos conduz “irresistivelmente rumo ao nosso destino, qualquer que seja ele”.

Tiago A Nascimento, PMP

Project Manager | Business Development | Data Center

7 a

parabéns! muito bacana!

Carolina Company Bonito de Assis

Operações | Qualidade | Treinamento | Projetos | NPS | CSAT | VoC

7 a

Guilherme, que fantástico!! Parabéns pelo artigo. O mais incrível disso tudo é que os dias se repetem e acreditamos estar no controle, mas a verdade é que na maior parte do tempo só estamos repetindo um montão de hábitos predeterminados. Adorei como você abordou o tema. Parabéns novamente!!!

Natalia Andrade Zancan

P&D Cosméticos, Tricologia, Professora Graduação e Pós Graduação

7 a

Parabéns pelo artigo! Muito bem escrito! Você interpretou e sintetizou muito bem a essência do livro de Charles Duhigg... Li recentemente e achei fantástico... Realmente nossos hábitos "comandam" muitas de nossas atitudes e nem nos damos conta disso.

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