O Enem é uma estupidez. Vamos acabar com essa palhaçada

O Enem é uma estupidez. Vamos acabar com essa palhaçada

O Enem mede uma única coisa: o quanto os alunos daquela escola estão preparados para tirar nota alta no Enem. Só isso. É facílimo falsear o resultado. Basta os professores treinarem seus alunos usando as provas de edições anteriores do Enem, ou de vestibulares, Fuvest etc.

Fui checar a lista das escolas que melhor pontuaram em São Paulo. No alto da lista não estão as melhores escolas da cidade, as que colocam seus alunos nas melhores universidades. Por quê? Porque essas escolas são pagas, caras, não estão nem aí com o resultado do Enem, e portanto não treinam a garotada pra tirar nota boa.

O que dá mais polêmica no Enem é a redação. A razão é que é mais difícil treinar para ir bem em redação. Não basta decoreba. Há que aprender a, puxa, pensar. Uns anos atrás os estudantes que foram mal na prova até exigiram revisão. O Exame Nacional do Ensino Médio de 2012 teve quatro milhões, centro e treze mil e quinhentas e cinquenta e oito redações avaliadas. Destas, cerca de 75 mil foram entregues em branco, e 72 mil foram anuladas por motivos diversos (como, por exemplo, escrever menos que as sete linhas exigidas).

Do total das redações, 76,32% foram avaliadas por dois corretores, 20,1% por três corretores, e destas, 2,43% por uma banca extra. A avaliação foi feita por 5.683 corretores, que passaram por dois treinamentos - um geral, e outro específico para ajudar na análise do tema da prova.

E mesmo assim, candidatos acionaram o ministério público federal para terem direito de vista à redação. Uma petição com mais de nove mil assinaturas coletadas pela internet bancaram a representação. E no Rio, uma estudante conseguiu da justiça o direito de ver a correção de sua redação. Houve movimentos pelas ruas, passeatas, protestos em doze capitais. Nos anos seguintes, menos protestos, mas mesmas polêmicas.

Segundo o MEC, a avaliação leva em conta os seguintes itens: compreensão da proposta, domínio da norma padrão da língua escrita, e a capacidade de selecionar, relacionar, organizar e interpretar informações, fatos, opiniões e argumentos em defesa de um ponto de vista.

É evidente que a maioria dos jovens do mundo não tem a menor condição de fazer isso. Aliás, nem dos adultos. Muito menos jovens e adultos brasileiros, considerando o patamar patético de nossa educação. O que o MEC exige é que ao final do terceiro ano do ensino médio nossos jovens tenham aprendido a pensar por si próprios, e defender o que pensam por escrito. É o que Michel de Montaigne batizou no século 16 de ensaio, e o próprio slogan do Enem 2015 faz referência a isso: "Um Ensaio Para a Vida".

É mais que pedir demais. É bobagem, porque a maioria das faculdades não exige pensamento independente, nem saber escrever. Aliás, a maior parte dos empregos disponíveis também não (não que hajam muitos empregos disponíveis no Brasil de hoje). O que já conheci de jovem diplomado e semi-analfabeto não é pouca coisa. Sempre foi assim e assim continua sendo; quem sabe um dia muda; não há sinais no horizonte e muito pelo contrário.

Não sei quase nada na vida, mas escrevo profissionalmente desde 1988, aprendi, e ensino grátis. Não tem segredo. É fácil escrever direito e é muito difícil escrever magnificamente. Como nossas escolas não ensinam nem um nem outro, esta exigência do MEC é um insulto. Até porque os temas da redação não fazem parte do currículo escolar.

Em 2012 foi "A Imigração para o Brasil no Século 21". Em 2013, "Efeitos da Implantação da Lei Seca". Em 2014, "Publicidade Infantil em Questão no Brasil". Em 2015 foi "A Persistência da Violência Contra a Mulher na Sociedade Brasileira". Dã, o aluno vai escrever o que, "sou contra bater em mulher"?

Nosso governo defende que a redação aborde "questões contemporâneas". É insano. Nossa escola não é contemporânea! É do século 19. Não desafia os alunos. Valoriza a decoreba, não a reflexão. Nossos professores são os mais mal pagos planeta afora, tem que procurar no quarto mundo para encontrar salários tão baixo...

Uma professora de uma escola pública modelo, dessas que aparecem em propaganda no horário político, me contou: lá não tem e nunca teve papel higiênico para os alunos. A Associação de Pais e Mestres é que tem que bancar. O papel que o Estado manda é só para os traseiros de professores e funcionários. Já dinheiro para computador, há bastante. Mas a escola não precisa de mais PCs. A urgência é tirar os computadores entregues há um ano de suas caixas. Eles estão mofando. Precisa instalar, e treinar os professores para utilizá-los.

Os professores dessa escola também gostariam de poder escolher livros à altura de seus alunos. E não ter que encomendar algum do menu disponível, sempre pobre, sempre conservador, sempre das mesmas editoras e autores. Ah, e seria bom ter uma marmiteira, para que os alunos possam esquentar seus almoços, em vez de comer tudo frio. Outra amiga me conta de suas visitas a escolas da periferia de São Paulo, onde a porta para a quadra fica aberta toda noite, para poder rolar festa funk. Quem vai peitar os traficantes do bairro, a coitada da diretora?

Isso é em São Paulo, imagine nos grotões. Pelo que li no jornal hoje, o grande plano do nosso atual governo para acertar as contas públicas, fora diminuir as pensões de deficientes, velhinhos e viúvas, é diminuir o investimento em educação (e saúde) nas próximas décadas. Os resultados são mais que previsíveis.

E o Enem quer que alunos que estudaram em escolas assim saibam construir um ensaio com começo, meio e fim? É injusto exigir de nossos jovens o que não demos a eles. Vamos acabar com a prova de redação no Enem. Aliás, enquanto não tivermos escolas minimamente decentes, e salários minimamente decentes, vamos acabar com o Enem. É a única coisa justa a fazer com nossos filhos.

Ruth Couto Rosa Villela

Profissional Autônoma na Fazenda Correnteza / Proprietária

8 a

Acabar com o ENEM não resolve os outros problemas. O salário dos professores é realmente vergonhoso, mas não basta aumento de salário; é preciso Qualificar os professores. Quanto aos recursos para equipar as escolas, mesmo quando são suficientes, são muito mal aproveitados, é preciso Qualificar todo o pessoal envolvido com a educação, desde a administração!

Edson Melo

Analista de Gestão Municipal na Prefeitura Municipal de São José dos Campos

8 a

...de tudo é preciso algo para medir o desempenho dos alunos e das escolas, senão o país não cria indicador nenhum para comparar a evolução histórica e comparada com outros países.

miguel espanhol

gerente vendas na SS RUBBER

8 a

Caro Andre concordo que o ensino está cada vez pior , o nível é muito baixo mesmo , estudei numa época( de 1968 a 1980 ) em que se tinha que estudar para passar de ano. Inventaram depois que não haveria mais repetência e deu no que deu...O Enem ajuda um pouco mas tem que ser revisto também , não acredito que se corrijam mais de 4 milhões de redação , de forma justa...

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