O fim é o começo

                      

           Artigo de Paulo Coelho, no Caderno C, p.2 do Correio Popular de 19.5.2014, com o título “Duas histórias reais e uma reflexão sobre os efeitos contrários” reflete o efeito positivo das contrariedades como inspiradoras de cultura.

           Na história sobre um velho que atrapalhava tudo. Citava G.I. Gurdjeff (George Ivanovich Gurdjeff, 14/01/1866 - 29/10/1949), uma das personalidades mais intrigantes do século passado. Bastante conhecido nos círculos que estudam ocultismo, é ainda ignorado como um importante estudioso da psicologia humana.

           A história a seguir passava-se quando ele, já morando em Paris, criou o seu famoso instituto para o desenvolvimento do homem.

           As aulas eram sempre bem concorridas. Mas entre os alunos havia um velho – sempre de mau humor – que não parava de criticar o que ali era ensinado. Dizia que Gurdjeff era um charlatão, os seus métodos não tinham qualquer base científica e o fato de se considerar um “mago” nada tinha que ver com a sua verdadeira condição. Os alunos sentiam-se importunados pela presença daquele velho, mas Gurdjeff parecia não se importar.

           Um belo dia ele abandonara o grupo. Todos se sentiram aliviados, achando que dali por diante as aulas seriam mais tranquilas e produtivas. Para surpresa dos alunos, porém, Gurdjeff fora até a casa do homem, pedindo-lhe que voltasse a frequentar o Instituto.

           O velho se recusara no início, só aceitando quando lhe fora oferecido um salário para assistir às aulas. A história logo se espalhara. Os estudantes, revoltados, queriam saber como um mestre podia recompensar alguém que não tinha aprendido coisa alguma.

           “Na verdade eu o estou pagando para que continue a dar as suas aulas”, fora a resposta.

           “Como?”, insistiram os alunos. “Tudo o que ele faz vai totalmente contra aquilo que nos está ensinando!”.

           “Exatamente’, comentara Gurdjeff”. “Sem ele por perto, vocês custariam muito a aprender o que é raiva, intolerância, impaciência, falta de compaixão”. “Entretanto, com este velho servindo de exemplo vivo, mostrando que tais sentimentos tornam a vida de qualquer comunidade um inferno, o aprendizado é muito mais rápido”. “Vocês me pagam para aprender a viver em harmonia e eu contratei este homem para ajudar a ensiná-los, pelo caminho oposto”.

           Na reflexão, sobre a essência da liberdade, enfocara Viktor E. Frankl (Viktor Emil Frankl, 29/3/1905 – 02/9/1997): “quando eu vivia num dos campos de concentração da Alemanha nazista, pude observar que alguns dos prisioneiros andavam de barraca em barraca, consolando os outros, distribuindo-lhes as suas últimas fatias de pão”. “Podem ter sido poucos, mas me ensinaram uma lição que jamais esqueci: tudo pode ser tirado de um homem, menos a última das suas liberdades: escolher de que maneira vai agir diante das circunstâncias do seu destino”.

           Em lugar algum o nosso destino deve estar traçado. Aquilo que podemos ser, ver ou fazer depende apenas das circunstâncias momentâneas do tempo e do lugar. O fim pode ser o começo. Ver para crer.

           

           Alonso de Oliveira, jornalista. Foi secretário de Administração, diretor de Suprimentos e coordenador de RH da prefeitura de Americana. RG 5.209.484. E. mail: alonsoliveira@hotmail.com.    

 

 

 

 

 

 

 


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