O "mais ou menos" Novo Normal
Old habits die hard - Ditado inglês:
Velhos hábitos são difíceis de morrer
O ano é 1999. Você vai nas lojas e há prateleiras e mais prateleiras com pacotes de softwares para serem instalados para que você se previna contra o "bug do milênio". Anunciado como o novo apocalipse digital, a mídia divulga inúmeras histórias, de compromissos perdidos e agendas totalmente loucas a sistemas enlouquecidos e dinheiros nas contas sendo perdidos porque muitos dos formatos de ano consideravam apenas dois dígitos e, na hora que virasse de 99 pra 00, o sistema entenderia que, na verdade, voltamos no tempo em 100 anos. O horror, o horror...
Pois bem. O ano virou e, à exceção de um ou outro probleminha, quase nada do que foi anunciado aconteceu. Mesmo quem não estava protegido pelos pacotes da MS e Norton, mal viu a diferença, simplesmente porque pequenos ajustes foram feitos com um ajuste mínimo de programação.
Essa história é só pra mostrar como o mercado cria e se utiliza do medo e do pânico para vender segurança. E não estou dizendo que não há mudanças vindo. Elas vêm e vêm com força, mas a pergunta, não era isso que estávamos já vendo há algum tempo? Uma aceleração das mudanças?
Tomemos alguns exemplos que temos ouvido:
O trabalho agora será remoto: O trabalho da maioria das grandes empresas já era parcialmente remoto, o que está acontecendo agora é que está havendo uma popularização desse conceito e ampliação desse movimento que já havia. Algumas empresas estão de fato desocupando andares inteiros de seus escritórios, mas muito provavelmente em muitos casos esse movimento já vinha ocorrendo e foi apenas acelerado.
As viagens a trabalho agora serão muito reduzidas: Outro movimento já vinha acontecendo. Algumas empresas inclusive já vinha investindo pesado em sistemas de teleconferência para poupar gastos com viagem. Cheguei a ver há alguns anos, uma multinacional com um sistema de teleconferência onde a metade da mesa daqui se completava com a metade da mesa na matriz e havia um sistema de som que permitia identificar de que lado vinha o som da pessoa falando, como se fosse ao vivo. E a empresa se gabava de ter reduzido em muito o valor de diárias e passagens com isso.
O consumo será totalmente repensado, outro movimento que já vinha em curso. Movimentos de consumos conscientes e de uma vida mais saudável vêm crescendo ano a ano e se há 10 anos os veganos sofriam em qualquer restaurante, hoje em dia qualquer restaurante que não tenha essa opção perde não só o vegano, mas o low carb, o ovolacto e todos os amigos que topam ir a um restaurante que tenha essas opções em detrimento de outro.
Seremos mais caseiros: Esse é meu preferido. Cada vez mais as novas gerações têm escolhido mais quando sair. Sair agora tem que ser uma experiência épica e por conta disso, o setor de casas noturnas em geral, as "baladas", têm minguado enquanto eventos como lollapalooza têm crescido. Assim, nada de muito novo, só a aceleração desse processo. É inclusive muito comum ouvirmos a famosa fala: "Eu sou muito caseiro, assim estou até que gostando desse confinamento".
Enfim, o que tenho observado como padrão dessas mudanças não é nenhuma mudança radical. A maioria das grandes mudanças são apenas acelerações de movimentos já existentes anteriormente e mesmo que vejamos algumas tendências ganhando força, elas são exatamente isso, tendências que já existiam e estão se expandindo. Sem grandes surpresas.
Por conta disso, se eu fosse você, eu não esperaria por um novo normal turbo. Creio que um novo normal "meh" seria algo muito mais dentro das expectativas. Mesmo porque, se com a pandemia rolando a gente vê tanta coisa normal já, quando houver uma vacina, você acha que vai ficar mais alterado ainda? Eu, sinceramente, duvido. Posso até quebrar a cara quando estiver lendo esse artigo em um ou dois anos, mas essa é minha aposta.
Discorda?
Cientista de dados | Professor na ESPM | Prof. convidado na USP-ESALQ-Pecege e FGV/EESP
4 aU Bacana a reflexao... sem até coragem pra discordar me lembro de eu ter comparado o COVID com h1n1 em um raciocínio semelhante de “isso aí não vai dar em nada”. Mas com a devida venia, prefiro não me posicionar ainda.
Product Value Chain Chief Architect Officer (CAO) at Innofact - The Innovation Factory
4 aÓtimo texto grande mestre budista! Concordo, alguns países estão se aproveitando e tomando ações mais incisivas, como o caso da Alemanha e sua política de eletrificação da frota, outros vão pelo "meh", mesmo. As empresas vão sim acelerar as mudanças, imagine a redução nos custos ao se devolver um andar inteiro de escritórios? Entretanto o trabalho remoto tem seus limites, por exemplo, como um colaborador recém contratado irá se aculturar estando em casa? Vamos em frente.
Convertido ao Budismo. Sempre ótimos textos. Espero fazer seu curso em breve !
Criadora do Método Inovação Não Violenta . Formadora de Líderes, direciono empresas através de palestras e treinamentos para alcançar Alto Desempenho, Comunicação Eficaz, Segurança Psicológica e Alta Performance.
4 aConcordo plenamente, o novo normal já era normal não percebido.