O restaurante - Parte II
Após um hiato de longos 8 meses, causado justamente pelo tema do último artigo escrito em janeiro desse ano, estava mais do que na hora de retomar esse projeto. O artigo anterior não estava completo. Precisava de continuidade! Se o tema do texto havia sido sobre todo o processo necessário para abertura de um restaurante, esse agora, deveria falar sobre quando a coisa acontece para valer. Quando chega a tão aguardada hora de abrir as cortinas e apertar o “play”. Um momento que parece fazer o mundo parar e você estar literalmente puxado para dentro do olho do furacão.
Abrir um restaurante demanda tempo, atenção e dedicação. É quase como o nascimento de um filho. Quanto mais energia colocar nos processos, menores são as chances de erro (ou pelo menos esperamos que assim seja). O fato é que, mesmo com tudo (ou quase tudo) que foi discorrido no longínquo artigo de janeiro de 2024, os momentos que antecedem a abertura de um restaurante, as coisas tendem a mudar de figura. Equalizar tempo, disciplina, rotinas e processos torna-se extremamente desafiador e os imprevistos tomam proporções jamais imaginadas.
Tempos e movimentos da equipe de cozinha, bar e salão, tão bem ensaiados, parecem não fazer mais o menor sentido. O clima amistoso dos treinamentos pré-abertura desaparece do ar e é tomado pela tensão e ansiedade. O que havia sido meticulosamente planejado por meses e meses, parece fora do lugar e desencaixado. A calma e a tranquilidade são rapidamente trocadas pela pressa e um enorme senso de urgência. Tudo é para ontem. Em alguns casos, para anteontem. O sistema de vendas “trava”, os garçons erram e esquecem do que foi combinado, a cozinha atrasa a produção e saída dos pratos, os clientes reclamam. O padrão sonhado, torna-se rapidamente um pesadelo. É inevitável que alguns clientes saiam insatisfeitos, o que abala ainda mais o moral do time, que se dedicou tanto a esse objetivo. Toda inauguração envolve muitas emoções e expectativas, frio na barriga que se confundem num misto de alegria e apreensão.
Os dias que antecedem a inauguração, talvez sejam os mais tensos. Pois a data já está marcada e o cronograma não permite mais qualquer tipo de atraso. Tudo precisa acontecer, custe o que custar. A obra ainda está sendo finalizada, há gente chegando, entrando e saindo o tempo todo. Áreas que estavam isoladas até então, para que a cozinha possa produzir, são invadidas por pedreiros, marceneiros, eletricistas, encanadores, técnicos, instaladores e prestadores de serviço. Alimentos, bebidas e vinhos caros, são entregues juntos com peças, equipamentos, uniformes, caixas plásticas, material de escritório e de construção. Um frenesi que nos faz lembrar e repensar: “onde está todo aquele planejamento que fizemos? Onde foram parar todos os processos que foram pensados, desenhados e tão bem escritos?”. Conciliar testes finais de cozinha e atendimento, alinhamento e treinamento da equipe e ter tudo organizado num ambiente que beira o caos, demanda uma energia digna de atletas olímpicos.
Coisas que podem parecer simples como compras que não chegam no prazo certo, pequenos erros da cozinha, o nervosismo dos atendentes que esquecem de acompanhar suas mesas e trocam a numeração delas, definição de funções, o caixa que não fecha corretamente, organização da equipe... cada detalhe pode interferir na experiência do cliente e jogar por água abaixo tudo aquilo que foi planejado.
A criação de um restaurante vai muito além de boa decoração, boa comida e bom serviço. Um bom restaurante que deseja se tornar perene e criar reputação, precisa ser tratado como uma boa empresa. Com gestão profissional, moderna e eficiente. Principalmente num mercado que inova a cada dia, com alta taxa de mortalidade dos negócios, ainda engatinhando para sair da crise pós pandemia e que sofre uma crise mundial com a falta de mão de obra qualificada e postulantes a ingressar no segmento.
As variáveis são infinitas... gente servindo e gente sendo servida, intensamente, o tempo todo, em dias que parecem ter bem mais de 24 horas. Mas mesmo nesse momento conturbado, que o tempo parece correr mais rápido, é justamente o excesso dele, acumulado ao longo da vida profissional, que traz as respostas procuradas e necessárias.
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São justamente esses anos acumulados que nos levam a ter firmeza em seguir firme com o compromisso e o propósito traçado para esse projeto: transformar a hospitalidade no Brasil! Repensar um mercado tão machucado e combalido, com as pessoas realmente no centro dos negócios. Não estamos falando apenas de bom serviço para os clientes. Mas de oportunidades reais para todos aqueles que fazem a magia acontecer. Relações éticas, justas, honestas e transparentes. Tratamento digno para quem dedica sua carreira a criar momentos únicos para os clientes com coisas básicas como carinho, cuidado, atenção e gentileza. Premissas fundamentais de um bom atendimento e para quem trabalha com hospitalidade.
Uniformes de qualidade e no tamanho certo, para que todos se sintam confortáveis e com boa autoestima (ninguém gosta de vestir roupas desconfortáveis e que não sejam do seu tamanho!), vestiários e banheiros limpos o tempo todo, comida quente, bem-feita e à vontade, espaço para descanso, salários justos e acima do mercado, plano de saúde, escalas que permitam conciliar vida pessoas e profissional com mais folgas para um trabalho que é por natureza, fisicamente intenso e desgastante, entre outras tantas coisas pensadas para o time. Pode parecer pouco, mas é muito para um segmento que evoluiu muito pouco nas suas relações profissionais nas últimas décadas.
Criar e desenvolver projetos que tenham como premissa a qualidade, a excelência e a consistência em tudo aquilo que se faz, costumam ter sucesso. São características comuns a absolutamente todos os negócios de sucesso. E que, muito provavelmente, os torna longevos e fora das estatísticas de mortalidade.
Pessoas entrarão e sairão. Haverá momentos de dúvidas e nem todos permanecerão juntos o tempo todo. Mas é preciso colocar a bola no chão! Ter calma e saber que tudo isso passará. Dar tempo ao tempo e descobrir que nem sempre o nosso tempo é o tempo das coisas ou o tempo das coisas é o nosso tempo. Dar tempo para que cada pessoa envolvida no projeto se desenvolva e aprenda. Cresça e floresça! Dar tempo para tomar decisões racionais e não tomada pelos nervos que costuma estar à flor da pele. Jamais esquecer dos valores e propósitos que foram pensados para o negócio. Pois na dúvida, basta consultá-los para que elas sejam facilmente solucionadas e resolvidas.
No final das contas, nos resta aproveitar e desfrutar ao máximo esse momento especial e tão marcante. É preciso persistir, insistir e progredir! Se tudo foi bem pensando e planejado, não serão algumas falhas que farão você desistir da sua causa e do seu propósito maior. Se ele está bem definido e claro, uma vez que as coisas começarem a entrar nos trilhos, siga em frente com a maior consistência possível. E aguente firme! Nem tudo são flores. Seja firme para aguentar o tranco nos momentos de dificuldade. Paciência na turbulência e sabedoria na travessia! A jornada está só começando...
*continua no próximo artigo.
#EMFRENTE!
Executive Chef at Antonietta Cucina of Grupo Jacarandá
1 mMelhor impossível, vivenciando cada uma das situações aqui tão bem retratadas com a reabertura do Antonietta Cucina. Mais uma vez parabéns!
Operations and General Management Professional | Retail / Hospitality / Food Service / Services
4 mBoa Rodrigão, é bem por aí Inaugurar lojas é um dos momentos super especiais que vivenciamos Em frente sempre!
Gestão Administrativa | Gestão Financeira | Gestão de Pessoas | Gestão RH |
4 mRodrigo, que artigo extraordinário! Você capturou perfeitamente o turbilhão de emoções e desafios que antecedem a abertura de um restaurante. Cada detalhe, da gestão de equipe ao equilíbrio entre pressão e propósito, é crucial para o sucesso. Transformar a hospitalidade no Brasil vai muito além do bom serviço: trata-se de construir um ambiente saudável, digno e estimulante para quem está nos bastidores, o que naturalmente se reflete na excelência entregue aos clientes. Essa abordagem não apenas gera resultados sustentáveis, mas também fortalece relações de confiança e lealdade entre equipe e clientes. Uma verdadeira aula de liderança visionária e humana!
Como sempre, excelente reflexao e texto primoroso.
Consultora de Humanização
4 mA famosa frase de Carl G. Jung “ Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana” , vale para equipe e para clientes! A cada inauguração aperfeiçoamos as técnicas, os cronogramas, os processos… mas é com o foco nas pessoas que dá certo no final!