A PANDEMIA, A CAIXA DE PANDORA e 
                  a PSICOLOGIA

A PANDEMIA, A CAIXA DE PANDORA e a PSICOLOGIA

      “Não é a lei que estabelece o comportamento humano,   mas o comportamento humano que ajuda a estabelecer a lei.”  (Sérgio Marques da Cruz Filho)

        A pandemia mundial do Coronavírus-19, com todos os seus desdobramentos infecciosos foi devastadora, espalhando o caos. Em meio às tragédias, às mortes, à falência financeira, ao desemprego, aos conflitos, às dissoluções familiares e às perdas de vidas humanas.

Como se não bastasse, a saúde mental, sobretudo, vem pagando um preço incalculável com os efeitos imensuráveis causados pela doença. Os protocolos de segurança instaurados para conter o avanço do contágio, determinou o isolamento enérgico das pessoas, em um primeiro momento e flexibilizando, à medida em que imunizantes foram, gradativamente, sendo criados em laboratórios. E as diligências, neste sentido não param.

Um alerta vermelho foi deflagrado sobre o estado de insanidade humana que o evento espalhou mundialmente, implorando pelo inevitável repensar sobre uma nova ordem social a ser estabelecida, dentro de um clima emocional que já vem beirando ao colapso.

Na era em que estamos vivendo, nossas carências psicológicas explodiram. Os desentendimentos ocorrem no âmbito pessoal, na família, na sociedade, na vida profissional, na vida política, e demais segmentos da nossa humanidade.

E não é raro verificar-se essa constatação.

Diariamente, nos noticiários, na internet, nos grupos, nos debates, nas reuniões, nas campanhas de prevenção, enfim, o assunto permanente gira em torno dos desconfortos, dos impasses, e das necessidades psicológicas, tais como: “ Serviços de Apoio Psicológico”, “Transtorno Mental pode Surgir na Adolescência”, “6 Sinais que revelam que você pode estar sofrendo esgotamento emocional”, Psicóloga aponta sinais que indicam necessidade de buscar ajuda para cuidar da saúde mental”, “Janeiro Branco: por que tantos problemas na saúde mental?”, “Saúde Mental: Ansiedade é assunto mais pesquisado em plataforma de terapia online”; ”Inscrições para seleção de psicólogos”, “Felicidade é equilíbrio. E o organismo precisa de equilíbrio.” Entre tantos e tantos outros.

Os relacionamentos afetivos encontram-se em uma escalada de indefinição, dissolução, e o mais preocupante, em uma vertigem que vai da falta de um diálogo mínimo até a intolerância máxima.

Até que vêm adentrando, initerruptamente, nos fóruns da justiça.  

Estudos têm demonstrado que necessariamente não há relação entre as novas tecnologias e o comportamento agressivo. Vale lembrar que, se os jogos eletrônicos   não incitam à violência e ao suicídio, alguns são, no mínimo, inquietantes, tais como esta postagem na internet: “Eu deveria me matar?”: resposta de chatbot alerta sobre uso da tecnologia.” A verdade é, pode acontecer que, vivendo em uma família, ou meio conflituoso, os jovens podem potencializar a sua agressividade.

Em um boletim da CNN acerca da tecnologia, destacamos a advertência: “Mas, acima de tudo, ao culpar os videogames em vez de se aprofundar nas causas primordiais da violência, nós reduzimos o valor do discurso político sobre o tema, porque estamos buscando respostas fáceis em vez de encarar verdades duras.

Mas, sobre qual psicologia estamos falando aqui? Evidentemente que de todas. Pois cada uma foca em aspectos importantes da nossa vida, merecendo iguais visibilidades. Cada área oferecendo o seu suporte em busca do equilíbrio mental.

Mas, sou Psicóloga Especialista em Psicologia Jurídica. Durante 15 anos trabalhei como psicóloga concursada no Tribunal de Justiça de Pernambuco – TJPE. Inicialmente como psicóloga da VCCCA - 1ª Vara de Crimes contra a Criança e o Adolescente, sendo a citada Vara pioneira no gênero a se instalar no País. E depois, como Chefe do CAP - Núcleo de Psicologia do Centro de Apoio Psicossocial do mesmo Tribunal.

Já àquela época, movida pela curiosidade de saber o que pensavam as pessoas, e a sociedade em geral sobre o nosso papel, foi que elaborei uma modesta pesquisa que foi veiculada no site do Tribunal, em 2008. Das 5.000 pessoas participantes da pesquisa, os percentuais foram os seguintes: 50,36% julgaram necessária a intervenção psicológica no Judiciário; 30,39% opinaram ser dispensável; e 19,25% desconheciam tal atuação. ¹  

Lado outro, os tribunais se encontram sobrecarregados pelas demandas de conflitos de várias ordens.

E o que faz a psicologia no âmbito da justiça? No dizer de Silva, Vasconcelos e Magalhães (2001): “A Psicologia contribui através da análise e compreensão do comportamento humano em contexto afetivo e social, estabelecendo a atuação do psicólogo jurídico ao conflito, mediando e conciliando nos processos judiciais.” ²

Em 2010, o Conselho Federal de Psicologia estabeleceu a Resolução CFP Nº 008/2010, a qual dispõe sobre a atuação do psicólogo como perito e assistente técnico no Poder Judiciário.

No Novo Código de Processo Civil, 2ª ed. 2016, encontramos na Seção XDa Prova Pericial:

Art. 465.O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de imediato o prazo para a entrega do laudo.

§ 1º Incumbe às partes, dentro de 15 (quinze) dias contados da intimação do despacho de nomeação do perito:

(...)

II – indicar assistente técnico.

 E assim foi que eu, que sempre fui uma crédula fiel da ação da psicologia junto a justiça, ao solicitar a minha aposentadoria voluntária em 2012, me lancei na área judicial como Assistente Técnica.

Como essa atividade ainda não possuía o devido reconhecimento em nossa cultura social, sempre que havia uma oportunidade, eu escrevia um artigo discorrendo sobre o tema, como por exemplo: Revista do Centro de Estudos Jurídicos – CEJ da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco – PGE/PE, Revista ADVOCATUS Pernambuco, Revista do CEJ – Centro de Estudos Judiciários do Tribunal de Justiça de Pernambuco – TJPE.³

Sempre com o intuito de divulgar o trabalho do psicólogo na justiça.

Devo reconhecer, no entanto, que, em nossos dias, muito mais do que antes, a solicitação da expertise psicológica vem sendo amplamente requisitada, não somente na área clínica, mas sobretudo nas demandas judiciais.

O conhecido mito grego da Caixa de Pandora nos conta que Pandora, a mulher de Epimeteu, abriu a caixa que Zeus entregara a seu marido sob a promessa de nunca a abrir. Não resistindo à curiosidade, porém, Pandora entreabriu-a. Vozes suplicantes ressoaram de dentro pedindo a Pandora, mulher bondosa, que as libertasse. Feito isso, uma multidão de criaturas se atirou sobre Pandora, lhe infligindo enormes sofrimentos.  

A Caixa de Pandora fora escancarada. Dela saltaram todos os males que se espalharam pelo mundo. Todas as consequências dos nossos erros, da nossa cegueira produzida por modelos de existência focados nos objetivos externos e o descaso com o nosso equilíbrio interior.

De repente, do fundo da caixa, Pandora escutou uma voz que dizia: “Meu nome é Esperança. (...) Enquanto tiverem Esperança, não precisarão temer misérias, nem desgraças, serão capazes de superar tristezas e desespero. Enquanto tiverem Esperança, nada os derrotará.” 4

Em psicologia o espelhamento, ou técnica do espelho, significa uma escuta ativa do indivíduo visando auxiliá-lo ao reconhecimento do seu próprio comportamento, e como os outros o percebem e reagem a ele.

O que nos leva a refletir: não seria a esperança representada aqui, neste contexto, pela psicologia?

Pois, a psicologia significa a interpretação da nossa conduta, permitindo a que os fatos e os aspectos acerca de um comportamento sejam mais bem compreendidos, com seus erros e acertos. O que nos oferece a chance de corrigi-la, otimizá-la.

E com isto poderíamos vislumbrar uma justiça mais e mais justa, a cada dia.

O jurista Sérgio Marques da Cruz Filho (1947-2022), pioneiro na especialização em Direito de Família e das Sucessões no Brasil - IBDFAM, faleceu em 6 de fevereiro passado, aos 75 anos.

É dele o trecho da entrevista ao site Consultor Jurídico, em 2008, na introdução deste artigo.

_________

TANIA GUERRA – CRP-02/10546

Psicóloga aposentada do Tribunal de Justiça de Pernambuco - PE

Psicóloga Clínica  

Especialista em Psicóloga Jurídica

Assistente Técnica nos Processos Judiciais

Associada ao Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM

E-mail: taniaguerra.psi@gmail.com

WhatsApp: (81) 991625589

 Referências Bibliográficas

¹ GUERRA, Tania – Psicologia, Justiça e Sociedade: o que (des) conhecemos? – Revista Clareando Projeto Clarear- ABCC, Pastoral da Criança, Movimento Pró-Criança e OAF – dezembro, 2008.

² SILVA, Denise M. P. da – Psicologia jurídica no processo civil brasileiro: a interface da psicologia com o direito nas questões de família e infância – 1. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 13)

³ Revista ADVOCATUS Pernambuco - Ano 7 – Dezembro 2015 – Nº 16 – “O

 assistente técnico em psicologia nos processos judiciais – o suporte

psicológico a assertividade da prestação jurisdicional”

4.Revista do CEJ – Centro de Estudos Judiciários do Tribunal de Justiça de

 Pernambuco – TJPE – novembro – 2015 – nº 5 – “O assistente técnico e psicologia nos processos judiciais – o que todos os operadores da lei precisam saber”

 Revista do Centro de Estudos Jurídicos – CEJ da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco – PGE/PE, volume 09, 2016 – “De ‘Ciência Invasora’ a sua consolidação o CPC brasileiro – relevância e inovação na justiça.”

4 Mitos Gregos – 3ª ed. – São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013 - p. 6 



Excelente texto! Não tenho dúvida quanto ao papel de protagonismo que a psicóloga jurídica deve ocupar na formação, e no dia a dia, de todos os operadores do direito. Parabéns Tania Guerra !

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