As pedras no caminho para a retomada econômica em "V"​
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As pedras no caminho para a retomada econômica em "V"

A pandemia do novo coronavírus colocou (e está colocando) inúmeras vidas em risco. O colapso do sistema de saúde, observado em diversos países no mundo e inclusive aqui no Brasil, trouxe à tona uma série de problemáticas que devemos lidar enquanto seres humanos: a efemeridade da vida, a imprevisibilidade do futuro e a nossa impotência quanto ao desconhecido.

           Apesar da já inerente dramaticidade desses eventos, outras complicações se evidenciaram no campo social: a garantia da mínima dignidade material aos indivíduos em situação de vulnerabilidade social que, devido a pandemia, não era a mesma quantidade de sujeitos do ex ante no post ante, a garantia de emprego e a proteção da renda. De repente, milhões de pessoas perdem os seus empregos, o que era, para muitos, a única fonte de renda que lhes sustentava. E agora?

           Claro que os colaboradores não sofreram sozinhos. Empresários, de pequeno à grande porte, sofreram com o corte nos fluxos de caixa provenientes da quarentena. Com menos empregos, o consumo despencou; com um cenário nebuloso quanto ao futuro, o investimento caiu; e essas duas circunstâncias abalaram o campo macroeconômico. Este tipo de crise, de decréscimo substancial no volume de despesas, é chamado pelos economistas de choque negativo na demanda agregada (equação composta por consumo das famílias, investimento privado, gastos do governo e exportações líquidas). Como o consumo das famílias representa 65% do nosso PIB, a sua queda tem, mais que a de todas as outras, grande peso na atividade econômica.

           Entretanto, fugindo da discussão mais técnica e cheia de jargões típicos do economês, manuais de economia apontam “luz no fim do túnel” em caso de crise decorrente de uma queda brusca da demanda agregada. É a chamada “recuperação em V”, que implica que, cessada a causa, a economia retomaria o status quo ante bellum. Isso significa que, cessada a pandemia, poderíamos sonhar com um nível de prosperidade que desfrutávamos antes do COVID-19, ao menos em teoria.

           Entretanto, o mundo real oferece percalços demais para atingirmos a utopia dos manuais econômicos. Por isso, eu listo aqui 4 obstáculos para a recuperação econômica do Brasil aos níveis pré-pandemia:

1.     Lentidão do Governo

O engajamento do Estado em momentos de crise é fundamental para o eventual alongamento ou encurtamento da mesma. Quanto mais cedo, mais gastos; quanto mais tarde, menos. O paradoxo é que pode ser tarde demais para tomar-se uma determinada medida. Em momentos de crise, celeridade é uma competência fundamental para vencê-la. Maior ainda, é saber quais setores devem ser auxiliados e os parâmetros para tanto. Entretanto, é da fisionomia do Estado o trâmite burocrático para essa análise, e aqui não foi diferente. Ainda assim, é possível citar casos de sucesso como as da Nova Zelândia, Alemanha e Coreia do Sul no controle da pandemia. No Brasil, por sua vez, o crédito não chegou nas micro e pequenas empresas, mesmo com o loteamento de 1,2 trilhão de reais pelo Banco Central aos bancos comerciais com esta finalidade. Estabelecer políticas públicas parece ser um pouco mais complicado do que nos livros.

2.     Falência de Empresas

Esse segundo aspecto é ligado ao primeiro. Se as linhas de crédito não chegam as empresas a tempo suficiente para que elas possam honrar as suas dívidas, o capital de giro vai se esvaindo e tornando-se escasso, até que a falência se torne inevitável.

           A partir do momento em que uma empresa decreta falência, os postos de trabalho a ela vinculados desaparecem do mercado de trabalho, e assim, deixam uma lacuna para a posteridade. Para que estes desempregados sejam reabsorvidos pelo mercado de trabalho, é preciso que novas empresas surjam, ou que as existentes se expandam.

3.     Ambiente de Negócios Propício

A terceira problemática surge de um dos cenários apresentados na segunda. A existência de um ambiente de negócios propício, isto é, menos burocrático, com expectativas de retorno excedentes ao de fracasso, é essencial. Porém, o Brasil não apresenta este cenário há um bom tempo. Em nosso país são necessários 107 dias para abrir uma empresa. O nosso código tributário é extremamente complexo e gastam-se 62 dias para uma empresa cumprir com as suas obrigações tributárias. Vale ressaltar que essa quantidade de dias não se dá pelo valor pago no imposto, mas com a sua quantidade. Uma legislação que simplificasse esse processo seria suficiente para otimizar o tempo, sem necessariamente reduzir as receitas do Estado.

           Para piorar, desde a crise de 2014-15, a economia brasileira anda de lado. Nosso crescimento médio é de 1% ao ano e isso mexe com a previsibilidade de sucesso dos negócios. Com receio de investir, nossas mentes empreendedoras evitam abrir empresas – reduzindo nosso nível de emprego e crescimento.

4.     Mudança Tecnológica

Por último, um desafio que corre por fora da curva de correlatados nos nossos obstáculos para a retomada econômica aos termos pré-pandemia, vem da mudança tecnológica. As novas tecnologias quebram paradigmas e mudam cenários quando absorvidas pela sociedade. E não há tempo em que elas sejam tão arrebatadoras – e radicalmente sobrepostas – quanto em pandemias.

           Um livro célebre chamado “Armas, Germes e Aço – Os Destinos das Sociedades Humanas” escrito por Jared Diamond traz exatamente este raciocínio. Nada perpetuou tantas mudanças na sociedade quanto guerras, pandemias e máquinas. Foi o surto da Peste Negra no século XIV que originou a ideia moderna de trabalho remunerado, sendo também a partir dessa concepção que o feudalismo se enfraqueceu na Europa Ocidental. As epidemias urbanas ocorridas após a Revolução Industrial na Europa forçaram a sanitização das cidades europeias no século XIX. A malária forçaria esse mesmo processo no Brasil, um século depois.

Dado o tortuoso caminho que já percorremos desde Março, e a flexibilização ocorrendo num momento ainda incerto da curva epidêmica, é muito difícil acreditar que a recuperação se dará em uma amplitude tão grande quanto a queda. Por isso, devemos ficar atentos as novas notícias e traçar planos de retomada robustos, priorizando sempre a segurança das pessoas.

E você, o que acha? Escreva nos comentários sua opinião!

Caio Henrique

Gerente de mídias sociais na Bolos Caseiros

4 a

Meu amigo Charles, seu artigo foi perfeito. Parabéns pelo seu conhecimento e pela facilidade na comunicação. Pessoalmente, tendo observado a evolução das variáveis epidêmicas e as ações quanto as mesmas, acredito que a retomada será em forma de "W". Isto, porque: Iniciamos planos de isolamento em um momento errado, o que resultou no número de casos e de mortes atuais; estas medidas não foram eficientes em seus nichos desejados, tampouco para as populações marginalizadas e mais vulneráveis; o movimento de reabertura está acontecendo sem o planejamento com embasamento científico devido e desassociado de um contexto de número de testes e resultados favoráveis suficientes. A partir deste cenário, é perfeitamente racional, apesar do enorme peso sentimental, afirmar que haverá uma ou mais evoluções drásticas de números de casos, as quais, inevitavelmente, puxarão a economia para uma nova parada.

Laura Beatriz Stein

Bacharelando em Direito na UFPE

4 a

Muito bom, Charles!

Excelente texto. Parabéns!

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