Presencial Subversivo
"Você vai acordar cedo para ir para o trabalho, precisa estar descansado", ela me disse. Eu ouvi: "Você vai cedo para o trabalho, vai poder descansar."
Sair de casa sem nem ligar o computador ganha ares de algo completamente libertário, depois de quase dois anos no regime de "lar-escritório". Tal como parecia no começo da pandemia, que ficar em casa significaria passar o dia zerando séries no Netflix, sem saber o que fazer com "essa tal liberdade", que foi tudo menos isso, mas ainda não fazíamos ideia do que estava por vir.
Chegar ao local de trabalho, e ele não ser a sala da sua casa, um puxadinho no quarto ou a mesa da cozinha, traz uma outra avalanche de sentimentos, sendo o mais forte deles o de que você sobreviveu. Já seria bastante para tornar impossível (ou inútil tentar) conter a emoção.
Mesmo que o local formal de trabalho esteja com a mesma cara (e ouso dizer que, na maioria dos casos, não está), ele já não é mais o mesmo. Colegas e amigos se mudaram. Novos chefes chegaram, outros se foram. Algumas pessoas, nunca mais veremos, no melhor dos casos porque receberam outras oportunidades profissionais.
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Fora isso, como o retorno é gradual e nem todos os funcionários vão trabalhar presencialmente no mesmo dia, é estranho chegar e ver tudo vazio. Eu não sei para vocês, mas, para mim, embora eu racionalmente saiba que todos meus colegas de trabalho estão nas mesmas condições, na minha cabeça a imagem que prevalece o dia todo é de que todos estão na redação e só eu estou em casa.
O lado bom é saber que não precisarei mais tomar o meu café, feito por mim. E que, se der um problema na pia do banheiro, não vou ser eu que precisarei consertar.
Mas, se tem uma certeza que é possível ter hoje, é que o temporário não existe. Ou, pelo menos, não sabemos quanto tempo ele vai durar. Se você já tinha passado da adolescência quando a pandemia começou, também já tinha aprendido que o "para sempre" sempre acaba.
O momento é de alegria, mas também de coragem. Para que a vida de todos possa voltar ao normal logo. E a máscara no rosto não nos deixa esquecer que ainda temos um longo caminho até lá.