Protecionismo e Nacionalismo: perigo adiante.
“Em tempos de dificuldades econômicas, os eleitores se inclinam notoriamente a culpar qualquer partido ou regime que esteja no poder, mas a novidade das Décadas de Crise foi que a reação contra governos não beneficiou necessariamente as forças estabelecidas de oposição. Os maiores perdedores foram os partidos trabalhistas do Ocidente, cujo principal instrumento para satisfazer seus seguidores – ação econômica e social dos governos nacionais – perdeu a força... Na nova economia transnacional, os salários internos estavam mais diretamente expostos à competição estrangeira que antes, e a capacidade de governos protegê-los era muito menor.” (HOBSBAWM, 1994).
A frase acima, escrita pelo importante e famoso historiador marxista Eric Hobsbawm, relata em poucas linhas a situação econômica mundial quando do fim da chamada era de ouro, ou seja, do início da década de 1970 em diante.
O problema da falta de respostas por parte dos políticos para que cidadãos e eleitores o qual representam tenham melhores salários e consequentemente melhores condições de vida, vem acarretando danos, muitas vezes irreparáveis, a milhões de pessoas em todo o globo. O que se tem, de fato, é que as respostas tentadas vêm trazendo mais problemas do que soluções.
Uma das respostas que trazem mais problemas do que soluções é o protecionismo. O protecionismo é um produto de uma ideologia que trouxe e traz problemas mundiais, muitas vezes, perigosíssimos. Essa ideologia é o nacionalismo.
O nacionalismo é uma ideologia política. Tem por característica proclamar que cidadãos pertencentes a uma região, que falem a mesma língua, que tenham cultura similar e que também tenham uma mesma etnia, possam formar uma nação. Não é preciso que todas essas características estejam juntas, pois às vezes uma só basta para que se tenha uma afinidade nacional.
O problema é que tal ideologia carrega em seu cerne o radicalismo que, maioria das vezes, não pode ser contido. Se o seu advento pode em algum momento ser benéfico para determinada nação, em outra trará sérios problemas.
É inegável que o nacionalismo possibilitou que duas potências pudessem surgir, neste caso Alemanha e Itália. Naquele momento foi muito bom para seus povos, mas em poucas décadas a característica radical e deletéria do nacionalismo surgiu com toda força e o resultado é bem conhecido, ou seja, guerra mundial.
Esse tipo de nacionalismo mais radical surgiu em fins do século XIX, apesar de não ser um fenômeno novo (HOBSBAWM, 1988). O nacionalismo radical carrega em si uma política contra estrangeiros, liberais, socialistas e pode muito bem ser combinado com religião e com alguma outra ideologia. Essa característica foi e é muito bem aproveitada por políticos oportunistas, que a utilizam irresponsavelmente com fins apenas eleitoreiros e que encontram vozes que a replicam como também muitos ouvidos em qualquer parte do mundo.
Um bom exemplo foi o que ocorreu no século XX quando povos coloniais, recém-independentes após a Segunda Guerra Mundial, se auto afirmaram com características nacionais. O que se teve foi primeiramente a supressão do idioma da metrópole. Mas, ao se conseguir a independência, essa nova sociedade tinha de ter sua liderança e elite e ambas precisavam, de alguma forma, se distinguir do restante do povo. A forma encontrada foi a fluência do idioma de sua antiga metrópole, normalmente inglês, francês ou ainda outro qualquer do ocidente e que foram, e ainda são, utilizadas para comunicação entre si e com nações ocidentais (HUNTINGTON, 1996).
Ocorre que a distinção perante a antiga metrópole tinha de ter outras características além da linguística, tanto na intenção do novo país se mostrar realmente independente, como também mostrar ao novo povo livre que seus recém-líderes mereciam sua lealdade e obediência.
Por consequência, boa parte destes povos recém-libertos não iriam seguir uma doutrina social e econômica de sua antiga metrópole, ou seja, o capitalismo, mas iriam seguir uma que fosse oposta que, naquele momento, era o socialismo. Houve, no entanto, alguns países que não se sentiram muito inclinados ao socialismo e tentaram um caminho alternativo, se autodenominando não alinhados, dando origem aos atualmente denominados países do terceiro mundo.
Mas, o que se teve em comum nesses novos líderes, agora a elite, ocupando uma cadeira presidencial ou qualquer outra de poder e sendo nacionalistas e anticapitalistas ou não, foi a democracia solapada, pois boa parte destes líderes implantaram ditaduras, normalmente, populistas. Assim, nacionalismo e terceiro- mundismo isolaram esses países, muitos deles agora entrando em estado de guerra civil quase que permanente ou ainda entrando em conflitos com os países vizinhos, pois se o conflito com a antiga metrópole não mais havia, o que restava era o conflito com o mais próximo. Em resumo, o que se teve de concreto foram mais conflitos e agora em vez de se ter um tirano a milhares de quilômetros de distância tinha-se outro a poucos quilômetros de casa.
A característica de um político típico populista é afirmar-se nacionalista e anticapitalista, pois apesar das tentativas do não alinhamento, os ditadores e populistas perceberam rápido que nacionalismo e capitalismo não tinham como trabalhar em conjunto. Ainda ele podia, muitas vezes, ser ditador, nacionalista e anticapitalista ao mesmo tempo, contudo, podia não ser um ditador no termo mais amplo. Por exemplo, países que realizavam eleições, dizendo-se, portanto, democráticos. Contudo, o sistema político fez apenas que se trocasse o nome do político, mas os termos de doutrina ditatorial lá permaneceram, seja por influência de um único populista ou por causa de sistema político adotado, que normalmente é aquele do único partido. Quem pode negar que agora na primeira metade do século XXI não seja uma situação típica de alguns países da América Latina, repúblicas do centro da Ásia ou mesmo da Rússia?
No entanto, em termos de problemas globais, políticos que sejam ditadores, nacionalistas e anticapitalistas, isolados em países da África, Ásia ou mesmo na América Latina, pouco significam no grande jogo econômico mundial. Mas o jogo do nacionalismo e anticapitalismo serve para um objetivo, ou seja, como desculpa dos políticos populistas, os quais afirmam que os problemas de seus países são derivados dos outros países, pois estes os impedem de fazer seu país prosperar. Essa é uma falácia impossível de se sustentar, contudo, muito difícil de se fazer não acreditar pela grande massa do povo. Vamos rapidamente a este ponto.
O jogo da relação entre países não se faz demonizando sempre outro país. Imaginar que um país é pobre porque outros países assim querem não tem fundamento. As escolhas internas de um país têm muito mais a dizer dos seus próprios problemas do que aqueles que eventualmente possam ser derivados de outros países. O Japão é um caso típico desta afirmação, pois saltou, no final da década de 1860, de uma sociedade de castas que impedia qualquer tipo de desenvolvimento social e econômico que pudesse rivalizar com os países ocidentais, para um desenvolvimento industrial e econômico impressionante, o qual iria mudar seu status como nação perante os países mais desenvolvidos. Evidente que pode se argumentar que tal desenvolvimento descambou para uma ditadura militar, mas é bom ressaltar que tal se deu em razão do nacionalismo ali também adotado. Os resultados são bem conhecidos, ou seja, o país precisou ser devastado pela guerra para não mais cair em tal armadilha.
O problema maior do nacionalismo, acompanhado de seu produto mais conhecido, o protecionismo, acontece quando grandes potências resolvem recorrer a ele. Países periféricos nacionalistas quanto muito atormentam relações comerciais e políticas em seu entorno, contudo, potências ocasionam problemas sérios globais, pois seu campo de atuação é também global. Em resumo, nacionalismo e protecionismo levam a conflitos que muitas vezes levam nações a guerras, de início comerciais, mas que muito bem podem levar as armas. Ludwig Von Mises, conhecido economista liberal, desta forma afirma:
“O que provoca a guerra é a filosofia econômica adotada quase que universalmente pelos governos e partidos políticos. Segundo essa filosofia, prevalece na economia de mercado não obstruído um conflito irreconciliável entre os interesses de várias nações. Segundo ela, a liberdade de comércio é prejudicial a uma nação; provoca seu empobrecimento. É, portanto, dever do governo impedir os males do livre comércio pela imposição de tarifas alfandegárias. Podemos, só para argumentar, deixar de considerar o fato de que o protecionismo também prejudica os interesses da nação que a ele recorre. Mas não pode haver dúvida de que o protecionismo visa prejudicar os interesses de povos estrangeiros, e o consegue. É uma ilusão presumir que os povos injuriados tolerarão o protecionismo de outras nações, se acreditarem suficientemente fortes para eliminá-lo pelos recursos das armas. A filosofia do protecionismo é uma filosofia de guerra. As guerras do nosso tempo não estão em contradição com as doutrinas econômicas populares; pelo contrário, são o resultado inevitável de uma aplicação consistente destas doutrinas.”(VON MISES, 2010)
No fim, o que se quer dizer é que políticas isolacionistas, altamente estatizantes e autoritárias não servem para um mundo globalizado. Podem servir para ganhar eleições e trazer resultados de curto prazo com alguma sensação de prosperidade, contudo, a conta chega. O preço a se pagar por esta é sempre alto, leva muito anos para quitar e normalmente não se paga só com dinheiro, mas também com muitas vidas.
Bibliografia:
HOBSBAWM, E. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo, Ed. Companhia da Letras, 1994.
HOBSBAWM, E. A Era dos Impérios 1875-1914. São Paulo, Ed. Paz e Terra, 1988.
HUNTINGTON, S.P. O choque de civilizações e a recomposição da ordem mundial, Rio de Janeiro, Ed. Objetiva, 1996.
VON MISES, L. Ação Humana. São Paulo, Instituto Ludwig Von Mises Brasil, 2010.