Quando você foi mais feliz no trabalho?
Pensei nisso agora pouco, enquanto dirigia e ouvia The Cure no rádio.
Explico a conexão, que pode parecer estranha à primeira vista.
Em 1996 eu trabalhava na assessoria de imprensa que divulgava o Hollywood Rock, um dos maiores festivais de música do país. Uma das minha tarefas era pegar o set list das bandas antes de cada show e passar para os jornalistas a relação de músicas que seriam tocadas. Em geral, eu falava com o assessor do aspone do carregador de instrumentos da banda, mas quando bati no camarim do The Cure e entrei, só quem estava lá era Robert Smith, vocalista do grupo. Muito magro, pele branca, batom vermelho, cabelos pretos. Tímido, falando num tom de voz baixo, ele me disse uma a uma as canções que iria tocar. Embora trêmula e gaguejando, anotei tudo. Como eram tempos pré-selfie, não há registro desse momento - ou melhor, só há na minha memória.
Trabalhar no festival em SP foi tão legal, ainda que durante quase uma semana eu tenha vivido num ritmo insano, que pedi ao meu chefe se poderia it também para o festival no Rio. Ele respondeu que não tinha verba para pagar mais uma pessoa. Respondi que iria de graça - era só arcar com passagem e hospedagem. Ele topou. Dias depois lá estava eu, participando de um projeto incrível e encerrando tudo numa festa da qual participaram quase todos os artistas do festival. Para resumir: eu olhava para um lado e via Jimmy Page; olha para outro e via Robert Plant. Surreal.
Anos depois, quando trabalhava na revista IstoÉ, fui chamada para uma entrevista na Exame. Quando a pessoa que me entrevistou ouviu qual era meu salário na publicação concorrente, disse: "Puxa, não tenho como fazer uma oferta para cobrir isso". Minha resposta: "Se você gostou de mim, salário não é problema. Venho pela mesma coisa que recebo lá. Meu sonho é trabalhar aqui." Minha entrevistadora me olhou espantada, mas me contratou. Vivi na Exame alguns dos meus melhores anos profissionais.
Quando decidi sair da revista para escrever o Sonho Grande, dei um tremendo salto no escuro. Deixei para trás o que parecia ser um emprego estável, com bom salários e muitos benefícios, para me arriscar numa empreitada que eu não tinha a menor ideia de em que ia dar. De novo, a decisão não teve nada a ver com dinheiro. Ao contrário. Durante quase 18 meses - o tempo que levei para escrever o livro e até ele ser publicado - só recebi da editora um adiantamento simbólico (como é a praxe no setor). Mas que alegria esse livro me trouxe! E, à reboque, uma carreira como escritora e palestrante que eu jamais imaginei ter.
Posso dizer com segurança que NENHUMA das minhas melhores fases (ou decisões) profissionais esteve ligada a dinheiro. Felicidade no trabalho, para mim, é outra coisa. É acordar na segunda-feira com disposição para encarar a semana. É não fazer contagem regressiva para a chegada da sexta-feira. É achar que o que você faz importa. É aguentar os perrengues do dia a dia na certeza de que no final das contas o resultado vai valer a pena.
Quando eu não sinto mais nada disso, sei que é hora de mudar. E, embora eu tenha contas para pagar, a remuneração nunca é meu principal critério de escolha.
E você? Quando foi mais feliz no seu trabalho?
Jornalista especializada em economia, finanças, tecnologia. Produção de conteúdo, gestão de talentos e de projetos
6 aNossa, que delícia ficar ao lado dos ídolos! Eu também tive uma passagem assim, de realizar um sonho, quando fechei os olhos e pensei "já posso morrer, e bem feliz". Entrevistei a banda Rush, da qual sou fanática, para uma matéria na revista da MTV, isso em 2002. Geddy Lee e Alex Lifeson olhando para mim, respondendo para mim, me chamando de "LouAnna". Registrado na memória e na fita cassete, que eu guardo com o maior carinho. Quando eu entrei na faculdade de jornalismo, na Cásper, um professor perguntou qual era o objetivo de cada um ali na sala em relação à profissão. Respondi que queria entrevistar meus ídolos do rock, em especial o Rush. Missão cumprida. Hoje, acompanho a doideira do mercado financeiro, tem dia que é punk. Mas a vida é esse heavy metal progressivo apoteótico, né?!