QUERO UM TIME MAIS OUSADO E PRÓ-ATIVO
Ah, um time mais pró-ativo, que dê mais ideias e soluções, que se arrisque a acertar. É tudo que queremos! Além de bons resultados, teríamos uma liderança com mais tempo para estimular o time a se desenvolver. Mas do outro lado ouvimos o time dizendo que não se sente motivado ou confortável para tanto. O que será que falta para equilibrarmos esse jogo?
Tenho um casal de filhos e sempre acreditei que autonomia era tudo que as crianças precisavam para se desenvolverem. Até que uma amiga me convidou para um papo e me contou que o que para mim eram “asas” podia estar sendo percebido por minhas crianças como falta de apoio, desorientação, ausência e, por fim, soar a rejeição. Daí veio o entendimento de que para esses voos era necessário um amadurecimento, receber boas instruções, voar junto primeiro e celebrar todas as conquistas.
Essa história se passou comigo, Carla, umas das autoras deste artigo, e a contamos para ampliar um pouco o universo e te convidar a encontrar alguma situação em que possa ter sido ofertada autonomia a você e na qual você tenha paralisado.
Sim, é de paralisia que estamos falando, não de falta de comprometimento nem de desinteresse. Autonomia para ser aproveitada e gerar os resultados desejados (ou melhor, superá-los), precisa ser nutrida por responsabilidade compartilhada e objetivos bem compreendidos e abraçados pelo grupo.
E começando pela AUTONOMIA, não se trata de dizer “pode ir”, mas de “estou com você, por onde vamos?”. É ABERTURA para ouvir as ideias, ENCORAJAR a ação e estar disponível para ERRAR JUNTO e APRENDER COM O ERRO. Sim, não é um “pepino” sendo entregue para outra pessoa, talvez seja um “abacaxi descascado em conjunto”, em que compartilhamos a responsabilidade e os frutos dela.
E a RESPONSABILIDADE entra aqui, num lugar novo, em que a liderança não precisa concentrar controle e decisões, mas partilhar responsabilidade com o time para que ele possa tomar decisões também. Criar espaço para que use seu potencial criativo para gerar soluções e colocá-las em prática.
Temos um modelo educacional muito voltado para a obediência, em que dizemos para as demais pessoas exatamente o que precisam fazer boa parte do tempo. E ainda assim, esperamos que se sintam preparadas e encorajadas a ousar fazer diferente. Como? Precisamos recuar desse lugar, lembrar que tudo que pensamos sozinhos pode ser melhor se pensado em conjunto, convidar o time a criar o caminho e apoiá-lo nesse percurso, como um observador encorajador. Aí sim, temos autonomia e responsabilidade. Mas ainda falta um elemento: para onde esse caminho nos leva?
Encontramos agora os OBJETIVOS. Para onde queremos ir? O que queremos conquistar? Do que (valores, diretrizes, padrões) precisamos cuidar neste percurso? A organização tem sua missão, objetivos e metas a serem alcançadas e elas precisam ser conhecidas, compreendidas e fazerem sentido para o time. É fundamental fazer sentido e estar bem conectada com o propósito e objetivos do time para encorajá-lo a usufruir da autonomia, para motivarmos o time para a ação.
Segundo Henrik Kniberg¹, na Spotify autonomia é sinônimo de motivação e agilidade, por conta do time ter responsabilidade por todo o processo e por haver alinhamento. Os líderes focam no problema a ser resolvido (O QUE) e os times na solução a ser criada (COMO). A Autonomia de criar e colocar em uso resulta em baixa padronização e controle, o que é sustentado por forte polinização (estímulo a partilha de aprendizados), flexibilidade com consistência, respeito e ajuda mútua, confiança acima do controle, sem política nem medo e recuperação rápida sendo mais importante que não falhar.
Henrik Kniberg sustenta que o alinhamento permite a autonomia, que assim se faz uma organização inovadora que cultiva uma CULTURA COLABORATIVA. E completa dizendo que autonomia sem alinhamento gera uma cultura caótica, em que alguém sempre espera atitude de outra pessoa; e que alinhamento sem autonomia simboliza uma cultura conformista, em que a decisão vem sempre de cima.
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É, chegamos na cultura colaborativa e este quadro mostra a nossa visão no Projeto Cooperação² do que ela pode prover. Estamos vislumbrando um ambiente genuinamente colaborativo, que dá vez para a corresponsabilidade se consolidar em todos os níveis e o alinhamento se fazer a partir das demandas trazidas por todo o time e interesses organizacionais, para então a autonomia acontecer automotivada e nutrida por CONEXÃO, CUIDADO, PARTILHA, CONFIANÇA, COCRIAÇÃO, CULTIVO e CELEBRAÇÃO.
E lembramos aqui de uma jornada³ recente que fizemos com um grupo de professores de todo o Brasil, que se reuniram em torno do desafio de criar soluções para promover a cooperação na escola. Dentre as falas, nos marcou a percepção de que precisavam entregar o protagonismo para os alunos e convidá-los a trazerem seus conhecimentos para assim gerar mais interação e vínculos com a sala de aula (especialmente remota). E esse grupo, muito criativo e motivado, não tinha qualquer receio de perder sua liderança em sala de aula, via na parceria com os alunos a chance de aprendizado mútuo. Na celebração final dos projetos criados e iniciados, contamos com o brilho de um aluno se apresentando e nos contando sobre seu percurso com sua professora. Uma emoção só!
Este exemplo, nos conta que as futuras gerações talvez contem com uma educação que facilite o percurso para a autonomia com responsabilidade para alcançar objetivos partilhados. E nos lembra do desafio que temos hoje nas mãos, de movimentar toda uma cultura nessa direção, em nossas atividades profissionais e com os jovens que temos em casa.
Oferecer o controle das ações aos que as executam, entendendo que deles emana o conhecimento empírico (que resulta da observação e da prática, não da teoria), a partir do legítimo desejo da liderança de liberar o time para exercitar plenamente seu potencial com autonomia, dando a ele apoio e os direcionamentos necessários para que assuma responsabilidade pelos objetivos traçados.
Esta nova forma de inter-agir, diz respeito a como internamente cada indivíduo enxerga o todo e como abdica de atitudes anteriormente assumidas, para se abrir a um novo modelo, que passa por cocriar formas mais cooperativas de se apresentar para a ação. Um passo elegante para gerar autonomia e responsabilidade em prol de objetivos como-uns.
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Por Cambises Bistricky e Carla Albuquerque
Cambises Bistricky é focalizador do Projeto Cooperação, docente da pós-graduação em Pedagogia da Cooperação e Metodologias Colaborativas e co-autor do Livro “Pedagogia da Cooperação, por um mundo onde todas as pessoas possam VenSer",
Carla Albuquerque é colaboradora do Projeto Cooperação, co-fundadora de Coletivamentes, co-organizadora e co-autora do Livro “Pedagogia da Cooperação, por um mundo onde todas as pessoas possam VenSer".