Read to me

Passei os meus dois últimos meses em um período sabático na pequena cidade de Ithaca, no estado de Nova Yorque, como visiting scholar na Cornell University. Dedicando-me ao estudo sobre economia digital no Brasil no Emerging Markets Institute dessa renomada universidade Ivy League, pude conviver com essa belíssima e marcante cidade universitária.

A cidade estampa nas suas ruas sustentabilidade, cultura, respeito à história e à diversidade. É a cidade da valorização da diversidade racial, de gênero, de origem. Em cartazes afixados nas casas, lojas e espaços públicos, Ithaca clama por paz e por respeito aos direitos humanos, direitos dos negros, dos LGBTs, dos idosos.

Em debates que se realizam na universidade ou em outros espaços da cidade, o tema é aprofundado. No meu segundo dia na cidade eu já participei de uma atividade com a comunidade sobre protagonismo dos idosos. Vários foram os cursos, eventos e mostras dentro e fora da Universidade onde a diversidade era o tema central: mulheres no empreendedorismo digital, mulheres no estudo e nas profissões em STEM (Ciências, Tecnologias, Engenharias e Matemática), diversidade racial, entre outros.

Cornell estimula o engajamento dos estudantes, funcionários e professores com a comunidade local, evitando que a universidade seja uma ilha. Também me entranhei nos workshops que buscavam capacitar a comunidade acadêmica, formar líderes capazes de entender a realidade local e apoiar nas necessidades dos menos assistidos da cidade.

A cidade, fundada no final do século 18, preserva a sua história e seu patrimônio histórico em belíssimas casas e edifícios públicos, sem a hipocrisia de esconder que as suas origens se ligam à dizimação dos indígenas, os primeiros habitantes da região, pelos militares americanos.

Ithaca e a universidade de Cornell são recortados por cachoeiras, riachos, canais, que levam ao lindo Cayuga Lake, que, ao congelar no inverno, nos convida a brincar sobre o gelo. Ao invés de cobrir os rios, como muitas vezes o fazemos no Brasil, a cidade os usa com belo ativo.

É uma cidade humana, sustentável e inteligente, com eficiente sistema de transporte público interligado por aplicativos, onde os ônibus contam com sistema para carregar bikes, além da disponibilidade de bikes e carros compartilhados.

Valoriza os produtos locais, aguardando com ansiedade o fim do inverno rigoroso para que possa ser reaberto o Farmer Market, onde os fazendeiros locais comercializam seus produtos orgânicos e artesanais. Legumes, verduras, plantas decorativas, sabonetes se somam a variadas comidinhas e a deliciosa cidra. Cidade que privilegia o Green Market, cooperativa de produtores de orgânicos, ao contrário do Walmart.

Cidade cujas escolas públicas realizam uma campanha em prol da leitura, compartilhando a responsabilidade com as famílias pela formação das crianças. A ampliação do conhecimento e da cultura certamente é semente para a empatia, para o reconhecimento da diversidade como ativo – e não como problema.

Que possamos ler mais para nosso filhos, para os idosos das nossas famílias ou que visitamos nos asilos, para os analfabetos, para as crianças que estão ao nosso redor ou nos orfanatos. Assim, poderemos ter esperar que tenhamos diversas ideias a prosperar. Afinal, concordando com a frase de Émile-Auguste Chartier, em placa afixada no centro de Ithaca,

Nada é mais perigoso que uma ideia, que se tem somente uma ideia.