Reforma da previdência da Esplanada para a mesa de bar

Reforma da previdência da Esplanada para a mesa de bar

Previdência é um tema importante demais para deixar que outros joguem, decidam e
formem opinião por você

Novamente temos uma proposta de reforma da previdência nas ruas. O envio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019 pelo governo Bolsonaro à Câmara dos Deputados no dia 20 de fevereiro deu início ao jogo. Um jogo que promete ser tumultuado e que exigirá uma grande habilidade dos jogadores. E que precisará, sobretudo, de muita atenção do público que o assiste.

Em um lado do campo, estão os defensores da necessidade de uma reforma da previdência brasileira, tendo como seu grande capitão o Ministério da Economia. Os argumentos são fortes: sem uma reforma de regras o enorme deficit fiscal se tornará incontrolável; as consequências econômicas serão catastróficas; a taxa de desemprego só irá aumentar e a injustiça social reinante somente aumentará.

O capitão do time deu o chute inicial e com força. A PEC 6/2019 é dura e ambiciosa: fixa idade mínima para requisição da aposentadoria para todos; equipara as regras para os servidores públicos e os trabalhadores da iniciativa privada; aumenta o tempo de contribuição necessário para se aposentar; dificulta a possibilidade de se alcançar o teto dos benefícios do INSS; cria novas alíquotas de contribuição ao INSS de forma progressiva; abre a possibilidade para o regime de capitalização no futuro e retira do texto constitucional algumas regras de aposentadoria para que outras alterações que vierem a ser propostas no futuro possam ser feitas por projetos de lei complementar e não mais por emendas constitucionais, exigindo-se assim menos votos favoráveis no Congresso Nacional. 

Do outro lado do campo, o segundo time – contrário à reforma - não está passivo e nem só aguardando a bola chegar aos seus pés. Nos últimos dias, as redes sociais, o espaço para artigos nos jornais e em portais de internet foram inundados de contra-argumentos: os cálculos orçamentários usados pelo governo federal para afirmar que há deficit na previdência são enviesados, pois desconsideram todo o cipoal de contribuições sociais existentes para financiar a chamada seguridade social; não há preocupação das autoridades em combater os desperdícios, as fraudes e a corrupção existente na previdência; a proposta ignora os direitos adquiridos e demoniza os servidores públicos.

Ao longo do jogo que começa, os dois lados terão que reforçar suas frentes para poder ganhá-lo. Os reforços terão que ser conquistados por meio da comunicação, das explicações, da transparência de dados e do convencimento. E onde buscar esses reforços? Na opinião pública, no primeiro momento. Mas, sobretudo, entre deputados e senadores que, em última instância, são quem darão a palavra final sobre a reforma.

É uma completa perda de tempo imaginar que, por melhor que seja a articulação política do Executivo junto ao Legislativo (algo que neste momento é extremamente duvidoso), o projeto será aprovado do mesmo jeito que entrou. Experientes neste tipo de jogo, os técnicos do Poder Executivo já embutiram no texto da PEC 6/2019 muitos “bodes” que deverão ser alvo de negociações para serem retirados em troca da permanência do que considerarem ser a espinha dorsal da reforma.

A questão essencial, a meu ver, é que o público que está assistindo o jogo não deve e não pode ficar apenas observando os dois lados jogarem. Previdência é um tema importante demais (seja para as contas públicas, seja para a conta individual de cada cidadão deste país) para deixar que outros joguem, decidam e formem opinião por você.

Assim, ler, se informar, discutir e acompanhar o assunto é obrigação de todos nós. Vamos fazer com que esse jogo da arena Esplanada dos Ministérios seja um dos nossos assuntos de mesa de bar, da pausa para o cafezinho e da caminhada matinal. Aos poucos, previdência deixará de ser pensada somente em momentos de crise fiscal para ser lembrada sempre. Como deve ser. 

Sheila D´Amorim

Head de Comunicação, Marketing e ESG, jornalista e economista

5 a

Bela análise Isabel

Isabel, há quanto tempo! A única coisa que não mudou foi a Previdência.

André Meira

gerente de soluções comunicação | Banco do Brasil

5 a

Muito relevantes os pontos que você levantou, Isabel. Parabéns pela abordagem técnica e impessoal! Também acredito que o governo foi muito habilidoso ao incluir na proposta de reforma pontos específicos (bodes) para roubar a atenção, protegendo os pontos mais importantes.

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