“Resolvi mudar de profissão, e aí?”: os percursos e percalços de uma transição de carreira
Sandra Acosta
Dava pra dizer que a minha vida profissional era bastante satisfatória: eu era gestora de equipes havia dez anos, trabalhava na minha quarta empresa no setor financeiro, meu salário e benefícios me deixavam tranquila ao fim de cada mês, ia a pé para o meu trabalho em São Paulo (sonho!), atuava na mesma área já tinha um bom tempo. Aliás, estava tudo dentro do programado. Quando eu me formei em Economia pela Unicamp, na metade dos anos 2000, achava que me satisfaria em ter uma carreira executiva e de poder usar sapatos de salto fino no ambiente de trabalho. Fiz “check” pros dois objetivos. Mas o tempo é um senhor levado e nos prega algumas surpresas: os bancos já não pedem mais scarpins no dress code, o mundo corporativo não foi o “bicho” pra mim.
Comecei a perceber uma falta de encanto das minhas horas, sobretudo as passadas no trabalho. Mesmo tendo as melhores condições e oportunidades para desenvolver projetos, me relacionar com pessoas diferentes e ser estimulada a fazer o além, faltava alguma coisa. Muitas coisas. Sentia falta da naturalidade para tornar aquilo parte de mim. Pode parecer um papo um tanto quanto etéreo, mas a minha teoria é a de que quando sua alma murcha dentro da esfera profissional, vai ser muito mais complexo e extenuante gerar aquela faísca de energia capaz de motivar as pessoas do seu time, impressionar o seu chefe, de te fazer ir atrás de soluções mirabolantes para problemas impossíveis.
Eu me sentia morna em um mundo bege.
No fim de 2019, uma conjuntura de fatores tornou possível a loucura de recomeçar. Eu havia conseguido a cidadania italiana, a minha família tinha o desejo de imigrar para a Europa, havíamos feito um planejamento financeiro para viabilizar um período sem renda. Pronto, estavam montadas as peças para fazer funcionar essa geringonça chamada “período sabático”. O plano era simples: ficaríamos alguns meses aproveitando as passagens low-cost e os países europeus, em seguida a gente se fixaria em Portugal para procurar emprego e um novo lar. E assim foi, eu venci o meu medo do incerto e pedi demissão, meu marido fez o mesmo e embarcamos em dezembro para a França, nosso primeiro destino. Foi um bom momento de curtir o presente. Apenas estudar francês, sentir os aromas nas fromageries, assistir a filmes cult no meio da tarde, flanar pelas ruas, tentar absorver por osmose a cultura francesa por meio de seus cafés, livrarias e caves.
Quando íamos começar a vida de verdade em Lisboa, a realidade da nossa completa falta de controle sobre as variáveis do cosmos deu as caras antes. O coronavírus bagunçou todo o planeta e não fez diferente com a gente. Depois de avaliar que ainda não tínhamos casa, trabalho e rede de apoio em Portugal, decidimos voltar a Curitiba para passar a quarentena em terras brasilis. A quarentena virou duzentena e todo mundo já conhece esse causo. Se antes eu só tinha incertezas e um plano vago, agora eu só tinha incertezas, nenhum plano e um vírus amalucado amedrontando o cotidiano confinado.
Entremeando toda essa história de mudança, eu vivenciei um reencontro. Há uns três anos, redescobri uma antiga alegria de infância, Escrever. Aqui eu faço uso da liberdade poética pra usar a maiúscula na grafia das palavras “Escrever/ Escrita”. Isso se deve à reparação histórica que eu faço agora em decorrência aos muitos anos de negligência a esse prazer na minha vida. Quando criança, eu Escrevia cartas para amigos em vários cantos do mundo, uma espécie de diário espalhado pelos continentes. Mas esse regalo foi sendo deixado de lado para o pragmatismo da monografia, da dissertação de mestrado que quase ninguém leu, das atas de reuniões já esquecidas, dos e-mails supérfluos.
Nesse reencontro, fui lançada ao oceano das crônicas, das poesias, da literatura infantil. E foi como abraçar um velho amigo, depois de longo exílio. Para mim, Escrever é como costurar uma colcha de retalhos, um eterno escolher e montar de palavras para mostrar ao mundo quem a gente é e o que a gente quer dizer. E é isso o que eu desejo fazer nessa nova fase da vida. Quero poder Escrever histórias minhas (crônicas sobre o cotidiano, contos sobre as minhas colagens, historinhas pra minha sobrinha e outras crianças, lançar um livro), mas também histórias de outras pessoas e empresas. Quero ajudar e servir àqueles que não tenham tempo ou não possuem habilidade com a Escrita em dizer o melhor de si próprios por meio das palavras. Construir em conjunto com o outro uma narrativa para envolver o leitor a ponto de fazê-lo se apaixonar e se conectar a um indivíduo, marca ou estilo de vida.
Não posso dizer, sob hipótese alguma, que eu me arrependa das escolhas feitas até hoje. Foram justamente elas que me fizeram aprender mais sobre a vida e me fizeram conhecer pessoas que me ajudaram a construir essa versão de mim mesma, alguém com mais consciência sobre as minhas potencialidades, fraquezas e aptidões. Se essa nova etapa será bem-sucedida? Não sei. Na verdade, o que seria “bem”? E “sucedida”? Mas que dá um frio na barriga, oooô se dá!
Minha esperança é a de que esse mergulho em novos mares me torne mais interessante, justamente por me propiciar falar e Escrever sobre novas experiências e superações. Ou, no mínimo, espero que me faça perder, enfim, o medo de mergulhar.
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4 aSandra Milena Acosta, parabéns pela sua coragem! Fico admirada com histórias de transição de carreira. Sucesso para você, sempre! 🌺
Analista de Fraudes
4 aBoa sorte, minha querida. Com sua competência e essa forma leve de escrever, o sucesso já está garantido. Voa, voa!!!
Empreendedora área de Educação | Gestão de Negócios, Produtos e Canais | Serviços Digitais
4 aAdmiração por sua coragem, Sandrinha. E o que eu mais te desejo nessa nova etapa: aprendizados! O que faz a vida valer a pena é aproveitar intensamente a jornada... então se joga!
Advogada Corporativa / Compliance / LGPD / Governança Corporativa / EXIN Essentials / CPPD
4 aQue texto lindo! Você escreve muito bem e é muito talentosa em tudo que faz, tenho certeza que vai ter muito sucesso!