Rodas de Conversa: origens, modalidades, vantagens e desvantagens.

Rodas de Conversa: origens, modalidades, vantagens e desvantagens.

O ano de 2020 foi também o ano das Rodas de Conversa. Conduzimos mais de uma centena delas, em diferentes empresas, com pessoas muito diferentes entre si. Tivemos ótimos resultados, com relatos emocionantes dos participantes, que nos enchem de alegria e renovam a nossa esperança na capacidade do ser humano de encontrar caminhos onde o diálogo é facilitado.

 Mas as Rodas podem ser utilizadas como ações de Treinamento e Desenvolvimento? Não apenas podem, como foi assim que elas nasceram. É óbvio que o ser humano não começou a conversar em roda no século passado, mas temos nos Grupos-T o embrião desta atividade no ambiente corporativo.

 “Anteriormente a 1947, Kurt Lewin, um famoso psicólogo do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, trabalhando com a sua equipe e com estudantes, desenvolveu a ideia de que o treino das capacidades em relações humanas era um importante mas esquecido tipo de educação na sociedade moderna. O primeiro, então chamado T-group (T, significando “training”, treino) foi realizado em Bethel, Maine, em 1947, pouco depois da morte de Lewin. (...) Formou-se uma organização, os “National Training Laboratories”, com escritórios em Washington, e que desde então e durante mais de duas décadas se tem constantemente desenvolvido. A primeira tentativa dos grupos NTL foi no campo industrial, atingindo administradores e diretores.” (ROGERS, 1970, p. 13)

 Ou seja, não é de hoje que as organizações procuram sanar déficits no desenvolvimento socioemocional dos seus funcionários, mas a necessidade e o desejo permanecem atuais. O fato observado desde os anos 40 é a alta frequência de relatos de experiências pessoais de mudança, a partir dos laços de confiança construídos nestes encontros. Confiança esta tecida a partir de um ambiente facilitador, onde os indivíduos aprimoram a sua capacidade de falar e escutar, mas, sobretudo, de se interessar pelo mundo interno do outro.

 Além do pensamento lewiniano, outro alicerce conceitual dos Grupos-T foi o trabalho de um dos pais da linha humanista da psicologia (além de ser uma das pessoas que eu escolheria para ser meu avô, junto com Michael Caine), Carl Rogers. Ele tinha um nome mais poético para os grupos: Grupos de Encontro. Segundo o próprio Rogers, um dos aspectos centrais destes grupos era a possibilidade de acontecer o encontro básico.

 “Ao mesmo tempo que algumas tendências que descrevi, sobressai o fato de os indivíduos tomarem entre si um contato mais íntimo e direto do que é frequente na vida corrente.” (ROGERS, 1970, p. 42)

 Quanto às suas modalidades, as Rodas de Conversa podem ser:

 Abertas

 Vantagens: os participantes da empresa não precisam se comprometer com um horário fixo nessa nova vida de 17 reuniões remotas por dia.

 Desvantagens: todo encontro o grupo “começa do zero”. Entre as aspas porque existe alguma continuidade e eventualmente participantes cativos em alguns horários.

 Fechadas

 Vantagens: o grupo amadurece mais rápido, cria mais intimidade e os laços de confiança são mais consistentes. Deste modo, os integrantes se tornam cada vez mais capazes de oferecer feedbacks congruentes e resolver os seus conflitos interpessoais de maneira mais funcional.

 Desvantagens: o “boca a boca” resultante dos encontros gera interesse em pessoas que, a princípio, não queriam participar das rodas. Caso a empresa não se disponha a abrir novos grupos, estes colaboradores podem se sentir excluídos.

 Rodas de Acolhimento e Escuta

 Vantagens: com uma condução pouco diretiva, mais aberta a receber relatos espontâneos, facilitador e grupo podem acessar mais rapidamente os seus conteúdos latentes. As queixas iniciais são livremente investigadas e temos acesso às demandas reais e compartilhadas no aqui e agora. Sua característica é mais terapêutica, conectada com as necessidades de saúde mental e emocional.

 Desvantagens: a falta de um tema pré-estabelecido pode, em princípio, aumentar o nível de ansiedade dos participantes, que não estão acostumados a adotar uma postura ativa em seus processos de desenvolvimento. Querem, em geral, que o facilitador comande e fale para eles como devem resolver as suas questões.

 Rodas Temáticas

 Vantagens: quando utilizadas como uma evolução natural das rodas de acolhimento e escuta, costumam ser muito assertivas, uma vez que focalizam nas demandas já escolhidas pelo próprio grupo como prioritárias naquele momento. Se aproximam mais da área de T&D.

 Desvantagens: quando o tema é escolhido por agentes externos ao grupo pode ser um esforço em vão.

 Presenciais

 Vantagens: os integrantes têm acesso à totalidade das suas expressões não verbais. Isso não só enriquece a interação como também economiza energia psíquica, já que dispõem de mais informações e precisam investir menos esforço para compreender os movimentos do grupo. O facilitador tem mais possibilidades de atividades, como, por exemplo, as Rodas de Tambores.

 Desvantagens: deslocamento, congestionamentos, eventualmente até aluguel de espaço.

 Remotas

 Vantagens: os integrantes podem estar em locais distintos, o que pode facilitar a integração entre departamentos localizados em cidades diferentes.

 Desvantagens: algumas atividades precisam ser adaptadas e o grupo passa a depender de fatores tecnológicos que podem dificultar o processo.

 Tenho convicção (e provas) de que as Rodas de Conversa são uma excelente opção para o desenvolvimento das Habilidades Humanas. São a “mão na massa” que muitas vezes falta em processos que confiam demais na força do conteúdo levado pelo consultor e de menos na capacidade dos grupos de encontrarem soluções coletivas para os seus problemas. É um espaço seguro onde a gestão do estresse, das emoções e dos conflitos se misturam de uma forma dinâmica e bela. É também onde a criatividade e a inovação se tornam possíveis.

 *Dica de leitura: Grupos de Encontro, de Carl Rogers.

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