Só envelhece quem perde a curiosidade
O mundo está muito óbvio. As coisas têm sido analisadas pelos pontos de vista mais superficiais e, em geral, equivocados. Julga-se por aparência, por condição financeira, por orientação sexual, religiosa, posições políticas e o que mais nos convença que os outros não passam de embalagens que precisamos organizar em nosso supermercado mental. Até aí nenhuma novidade em relação à história da humanidade.
A sociedade está ficando cada vez mais juvenilizada
As pessoas criativas, atualizadas, modernas, que sabem das coisas não passam dos 30 anos. É aquela história: uma mulher não pode passar dos 30 senão vira tia. Graças à nova ordem mundial púbere, a população de tios e tias no mundo tomou uma proporção inimaginável.
Envelhecer se tornou em um termo pejorativo. Da mesma forma que antigamente se criticava alguém por ser jovem demais. Duas bobagens. As pessoas são diferentes e não é sua idade, sua raça, sua religião, sua nacionalidade que definem sua capacidade e criatividade.
A sociedade vendeu para estas pobres criaturas ingênuas que elas são o esteio do futuro, que são os líderes de um movimento civilizatório e evolutivo. Que vão salvar o mundo com suas startups e qualquer um que não esteja nessa bolha, não merece ser ouvido, respeitado, sequer percebido.
Estive convivendo alguns meses com este novo estrato social e tirei algumas conclusões: a maioria das startups são inúteis, a despeito da excitação de seus CEOs de vinte e poucos anos e de seus funcionários, (ou qualquer que seja a palavra que se use hoje). Filhotes bastardos do vale do silício.
São mal educados, mimados e preconceituosos com relação à idade. Mas como em todas as épocas da humanidade, a maioria dos jovens é tão criativa quanto uma propaganda de guaraná Dolly. O sistema os convenceu de que a simples iniciativa de lançar uma startup os catapultaria à condição automática de New Zuckers.
São seduzidos pela ilusão de que saber mexer com desenvoltura com todos os gadgets e navegar tranquilamente em todos os aplicativos disponíveis na loja do Google faz da pessoa um indivíduo interessante, inteligente, conectado e … criativo.
Mas vou dizer o que eu aprendi em todos os meus anos de vida, quase todos praticando e estudando a criatividade. A idade cronológica não tem nada a ver com o envelhecimento. É a visão de mundo que faz diferença. É o desejo incontrolável de aprender, não só em como se cria stories no Instagram, mas aquele conhecimento que alimenta a alma, que fala de nós como seres maravilhosos e desprezíveis, que nos ensinam a observar o mundo e a vida com assombro, paciência e curiosidade.
Idosos de vinte e poucos anos
Não é incomum eu sentir que meus filhos são mais velhos que eu, cheios de certezas encontradas no wikipedia, desprezando a experiência como um valor, confundindo informação com cultura, comparando maturidade com fossilização, ignorando que a avaliação das pessoas se dá por sua capacidade de enxergar o mundo com subversão, de transformar as coisas de fato e não por arquétipos primários.
Mas a culpa não é deles. Os jovens sempre tiveram, a partir do século passado, uma postura subversiva e questionadora. Ainda bem. Mas antes eles tinham de lutar contra uma barreira poderosa de crenças conservadoras. Serviam como novos temperos à pratos já consagrados. O resultado era uma espécie de acordo que resultava em avanços lentos mas sólidos. Hoje eles são os proprietários do mundo, então, não há mediação, não há consenso, apenas a realização de caprichos de reis levados ao trono ainda ostentando várias espinhas em sua face real.
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O que faz uma pessoa envelhecer de verdade é perder a curiosidade
Pode prestar atenção. As pessoas que não se desafiam, não se encantam com novidades, não têm mais paciência, que acreditam que não precisam mais aprender e todos aqueles que deixam a vida lhes levar, vão perdendo a vivacidade, o brilho nos olhos e a capacidade de enxergar o mundo com todas as cores. Os olhos vão ficando opacos e o semblante cada vez mais carregado e lânguido. A fruta que perde o viço, a água que parada apodrece aos poucos. Isso é envelhecer.
Para terminar, vou repetir o conselho que Nelson Rodrigues, aquele vetusto que escrevia no século passado, deu aos jovens: envelheçam.
Artigo publicado originalmente no meu Blog do UOL
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Sobre mim
Henrique Szklo é pesquisador da criatividade com abordagem neuropsicológica. É autor do livro "Você é Criativo, Sim Senhor", professor, escritor, palestrante e sócio-fundador da Escola Nômade para Mentes Criativas.
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