Saúde Mental e seus impactos na sinistralidade dos planos de saúde.

Saúde Mental e seus impactos na sinistralidade dos planos de saúde.

Mens Sana in Corpore Sano”. Assim citou o autor Juvenal na época do Império Romano buscando fazer referência a relação da mente com o corpo para o vigor e a saúde do exército Romano. Milhares de anos se passaram e continuamos trazendo essa citação para os dias atuais buscando novas formas de introduzi-la em nosso estilo de vida.  No cenário pós-pandemia, a relação mente e corpo nunca foi tão evidenciada. Novos modelos de intervenções, mais integrais e integrados, são colocados em evidências devido a existência de uma relação de causalidade muito grande entre corpo e mente e vice-versa.

Em relação aos riscos causados pela saúde mental na sinistralidade geral dos planos de saúde, na maioria das vezes, nos concentramos nos riscos advindos das DCNT (doenças crônicas não transmissíveis) em detrimento das doenças relacionadas ao tema. Fato é que apenas 2,6% dos programas aprovados no PROMOPREV (Programas de Promoção da Saúde e Prevenção de Riscos e Doenças) da ANS estão relacionados a saúde mental. Dos 610 programas aprovados apenas 16 estão registrados nessa área.

A visão fragmentada e ainda um pouco míope deste risco, impacta fortemente os índices de sinistralidade de um grupo populacional visto que o gatilho para a utilização dos planos de saúde está, muitas vezes, ligado ao emocional dos indivíduos que os compõem.

Em compasso com os números do PROMOPREV, ao abordar as grandes empresas contratantes e as próprias operadoras de planos de saúde, fica claro que o foco da gestão de seus sinistros em saúde, atestados e afastamentos, nessa ordem, ainda está muito incipiente quando o assunto é a saúde integral, mente e corpo. É fato que as grandes empresas compradoras destes planos estão mais evoluídas e organizadas do que as próprias operadoras de planos de saúde, que pagam diretamente por essa sinistralidade. A lacuna evidenciada gera bilhões de dólares em prejuízos anuais devido aos seus afastamentos e desdobramentos ocupacionais e previdenciários. Mas estranha o fato que, ao final dos ciclos de utilização, as operadoras gastam milhões com esses riscos e ao mesmo tempo estejam fazendo tão pouco.

Recentemente, tive a oportunidade de participar de alguns congressos relacionados ao tema no segmento corporativo e a ausência das operadoras foi percebida. Quando questiono os gestores destas operadoras quanto a isso, sinto que os pontos abaixo, de forma resumida, ainda não estão bem evoluídos internamente e são recorrentemente encontrados:

·      Falta de Cultura. De forma equivocada, a saúde mental “ainda” está vinculada à loucura e só se lembram do tema na hora da internação psiquiátrica ou nos meses de setembro devido as campanhas da área;

·      Os custos com as DCNT são mais identificáveis, controláveis e mais “caros” em comparação aos da saúde mental e isso soa melhor para aqueles que tem a tarefa de reduzir custos em “linhas gerais”. Resumindo, centrar nas DCNT dá menos trabalho, mais rápido e é mais fácil de mensurar resultados. Já na saúde mental, mal se conhece esse risco;

·      Não possuem equipes de gestão de riscos com expertise nas abordagens de saúde mental e ela não está introduzida na atenção primária;

·      Desconhecem os indicadores de saúde mental e raramente possuem, de pronto, estudos sobre o tema, embora este ponto esteja mudando, de forma reativa, pós- pandemia;

·      A busca e a intervenção dos riscos não estão integradas com a parte assistencial, tão pouco com os indicadores ocupacionais das empresas contratantes, logo seria uma tarefa difícil e cara para as operadoras gerirem de forma integral esse risco.

 Fato é que as operadoras, culturalmente, ainda fazem intervenções em seus grupos populacionais de forma reativa. Quando falamos em gestão de saúde mental o assunto tende a ficar mais complicado. Foi necessário que a pandemia viesse para que algumas, não digo todas e nem a maioria, começassem a se movimentar mais no sentido de clarear esse cenário. E é simples comprovar isso. Coloque na mesa de sua operadora o tema e questione quais os impactos a saúde mental traz à sua sinistralidade? A maioria, garanto, vai responder que “agora” vai estudar o assunto, mesmo com os custos crescentes de forma exponencial desde 2019. Porém, existem exceções, como no caso das autogestões que vem olhando para a saúde mental com mais zelo, mesmo antes da pandemia. Já se encontram estudos e evidências publicadas dando conta do estrago que a miopia da saúde mental pode trazer para a sinistralidade das operadoras. Cito abaixo um exemplo de publicação em que uma autogestão comparou seus números finais da utilização de um grupo que possuía pelo menos um transtorno mental, com um grupo que não possuía transtornos mentais. Os números do grupo inicial foram elevados em 12,8% (estresse) e 28,2%(depressão) para as consultas, 5,6% (estresse) e 16,0% (depressão) para exames e nas internações alcançaram um aumento de 49,2% (estresse) e de 76,2% (depressão) contra o grupo de comparação.

Corroborando com os números publicados pela OMS, onde temos no Brasil hoje uma média de 31% da população com algum tipo de transtorno mental, não precisamos fazer muita conta, é só pensar em quantos beneficiários aproximadamente os planos de saúde tem com esse risco e confrontá-los com os gastos publicados em suas consultas, exames, terapias e internações, acrescendo os impactos acima nesse grupo. Essa é a ponta do iceberg quanto aos impactos da saúde mental na sinistralidade dos planos de saúde.

Ainda existe, na parte não visível deste iceberg, outras questões como aquelas ligadas à falta de engajamento, aos subtratamentos e/ou as utilizações excessivas e as advindas das automedicações e/ou de sua falta, que tem o gatilho emocional (mental) como o seu maior ofensor. Quanto custa isso? Já fizeram essa conta?

Encerro aqui deixando estas constatações pessoais em um tom de provocação aos demais colegas e gestores desse segmento. Que possamos juntos buscar uma aproximação e com todos sentados à mesma mesa, possamos discutir soluções integrais e integradas para reduzir os riscos de sinistralidade de nosso setor e contribuirmos para a melhoria da qualidade de vida das pessoas.


Por Luiz Coelho.

Vicentina Arruda

Auxilio hospitais e clínicas especializadas na reestruturação de seus processos operacionais, com ênfase em ampliar o faturamento. Professora de MBA em Gestão de Clínicas e Consultórios na PUC.

2 a

Parabéns uiz!

Parabéns Luiz Coelho, sempre à frente do seu tempo! Precisamos abrir os olhos para essa pandemia invisível com toda certeza! Grande abraço. Sucesso!!!!

Rômulo Costa

Master of Business Administration - MBA | Fundação Getulio Vargas

2 a

Excelente texto! Parabéns!

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