Santuário repatriado e/ou valorizado
Detail from a limestone relief, showing an image of the Great Shrine itself and the Buddha in bodily form, c. AD 250. Imma Ramos, Curator of South Asia. 11 August 2017. British Museum Blog.

Santuário repatriado e/ou valorizado

Como lidar com o fato de que obras indianas de um importante santuário budista do século 2 a.C. estão no Museu Britânico, mesmo depois de toda a história dominadora e exploradora que a Inglaterra impôs a Índia?

Os mármores Amaravati faziam parte de um santuário budista na atual região de Andra Pradexe, um local que deixou muitas heranças culturais para a Índia desde os tempos Antigos. Eles marcam inclusive um novo estilo escultural e arquitetônico na história da arte indiana e retratam fiéis e elementos importantes do Budismo.

Os mármores também podem ser chamados de Elliot, uma referência a Sir Walter Elliot que realizou as principais escavações do local nos anos 1840 mas elas não foram as primeiras. Em 1853 as esculturas foram levadas para a Inglaterra devido sua importância.

Ao observar (ou tentar, pelo menos) todas as obras dispostas no Museu Britânico, o espectador pode não entender a dimensão do impacto que o Museu tem: ao entrar, somos bombardeados com obras e objetos de todos os cantos do mundo, inclusive de locais que fazem parte do imaginário quando se pensa em História Antiga. O visitante fica admirado ao ver e chegar próximo a múmias, portais e até pedaços de colunas gregas.

Mas uma questão deve ser sempre apontada quando se pensa em museus, especialmente europeus: De onde vieram todas essas obras que não são da história inglesa? Quando chegaram na Inglaterra? E talvez a mais importante: o que pensam os nativos sobre sua história estar exposta num local a tantos quilômetros de distância? 

O santuário Amaravati abrigava esculturas que, para os budistas, tinham significado religioso, que transcendia a realidade e entrava no campo da fé. Os fiéis davam voltas em torno do local como forma de honrar e conhecer mais sobre Buda e a religião em si. A partir do século XIV o santuário já não tinha a fama que teve nos anos iniciais à sua construção mas continuava tendo seu significado transcendental e religioso.

Hoje em dia, expostas dentro do Museu de um país que explorou, maltratou e subjugou a religião e o povo que as adorava, as esculturas perdem seu significado e são vistas pelos olhos ocidentais “apenas” como obras de arte. Essa situação demonstra todo o desprezo e falta de cuidado que uma metrópole europeia poderia ter pelo local que dominava: a religião e os costumes não eram levados a sério, sequer eram considerados “verdadeiros” pois fugiam do padrão religioso e cultural europeu ocidental branco cristão.

Obviamente o Museu Britânico, que reúne tantos artigos de tantas culturas diferentes que foram exploradas sem o consentimento do governo local ou até mesmo da população originária, não foge a essa regra.

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The Asahi Shimbun Display Virtual pilgrimage: reimagining India’s Great Shrine of Amaravati.




O Museu tem tido maior sensibilidade para lidar com tais questões num período temporal mais próximo a nós, desenvolvendo intensos estudos sobre suas obras e as culturas que elas representam: nas visitas presenciais, o Museu utiliza o acesso a tecnologia e os recursos financeiros que tem para desenvolver ferramentas que ensinem mais para o espectador (dessa forma, ele não apenas observa e analisa a obra em sua parte artística e/ou técnica mas também aprenderá sobre novos costumes e locais); nas pesquisas e visitas virtuais, imagens 3D das esculturas, artigos, vídeos e publicações em redes sociais sobre a relação delas com a cultura e história indiana budista também cumprem essa agenda educacional.

Mesmo com tudo isso são raros os casos em que um museu como o Britânico procura governos dessas outras nações para acordos em relação às obras, seja para devolver, pagar algum valor, criar um regime de revezamento, dependendo, é claro, das condições de conservação das obras, etc.O caminho de reparação a ser percorrido é longo, de fato. 

A história exploratória que a Índia sofreu (e ainda sofre, dependendo da visão de mundo de cada um) não acabou no final da década de 1940 quando conseguiu sua independência, depois de uma longa luta colonial e violenta contra a Inglaterra. As consequências ainda estão muito presentes até mesmo no mundo ocidental e nos locais explorados então, chegada a ser palpável. Enquanto uma instituição continuar exibindo obras desses locais que foram explorados e subjugados e agirem como se tivessem as conseguido por meios não violentos, a colonização não terá terminado.

As esculturas foram esvaziadas, roubadas, sequestradas. O mínimo não seria retorná-las ao seu local de origem? A nós cabe questionar e discutir essas questões e jamais deixá-las cair no esquecimento que tanto beneficiaria essas metrópoles europeias. 

Suzy Alves

Gerente de Condomínios Comerciais | Estudante de História - Licenciatura 4/8

7 m

Parabéns Sofia! Muito bom. ❤️

Sandra Sousa

Bióloga, professora e criadora de abelhas

4 a

Muito bom! Parabéns, Sofia!!!

Victoria Simonetti

Recursos Humanos | Remuneração | Cargos e Salários @ Linx, empresa do Grupo StoneCo

4 a

Que ótimo texto e crítica, Sô! Muito importante reflexão!

Marina Amador Oliveira

Marketing | Sales | Project Management | Growth | Partnerships Management | Engagement | Marketing Analyst @MercadoLivre

4 a

Muito bom So, bela dissertação e crítica! 👏

Parabéns, muito relevante :)

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