STORYTELLING PARA HUMANIZAR: A Viagem das Mil Luas
foto Hasan Almasi - unsplash

STORYTELLING PARA HUMANIZAR: A Viagem das Mil Luas

Há muitos anos recebi de uma querida amiga, como um presente, essa fábula de autor desconhecido. Ela me disse que quando a leu lembrou-se imediatamente de mim e do que tenho procurado realizar. Sou imensamente grato pelo presente, pois essa estória da viagem das mil luas já me fez refletir muitas vezes.

Compartilho nesse início de ano, que pode ser considerado como um início de uma viagem, com algumas questões a serem refletidas e praticadas. Boa Viagem!

Era uma vez uma civilização rica e avançada. Seus habitantes viviam em harmonia, eram livres e felizes. De lá partiam navios para todos os cantos do mundo levando a ciência, a medicina, a agricultura e as artes. Para lá seguiam peregrinos em busca de conhecimentos avançados.

Qual era o segredo daquelas pessoas e de seu sucesso em época tão remota?

Na formação dos jovens, havia uma etapa muito importante a ser cumprida: a viagem das mil luas...

Após muitos anos de estudo, os jovens deveriam partir para uma grande jornada que os levaria a conhecer terras distantes e lugares desconhecidos. Eles se preparavam desde a infância, primeiro com a ajuda dos pais e depois com a ajuda de mestres dedicados.

Antes de partir havia o ritual de despedida. Havia no centro de uma praça o Templo dos Navegadores, onde cada jovem entregava o seu plano de viagem. Sabiam, desde crianças, que um navegador sem plano é um pássaro sem rumo. Sabiam que para controlar seus destinos era preciso plano e determinação. A entrega do plano representava essa intenção.

No extremo oriental da praça, havia um templo um pouco menor onde os jovens nunca tinham entrado. Pela primeira vez o jovem que partia conheceria seu interior e o segredo das pessoas mais admiradas por todos: os sete sábios do Templo Sírius. Deles receberiam conselhos e orientação para a longa jornada que começava com a luz da manhã.

Esta é a história de um desses jovens prestes a partir em sua viagem das mil luas.

Depois de tantos anos de preparação, o que mais poderia aprender naquela noite?

Que conselhos receberia agora que ficaria a sós com cada um dos sete sábios?

O jovem subiu as escadarias do Templo, atravessou-o e viu-se diante de um jardim. O sol criava um ambiente misterioso e lá o esperava o primeiro sábio. Chegou e sentou-se ao seu lado. O sábio disse-lhe:

- Algumas nações progridem, outras desaparecem, algumas pessoas resistem, outros desistem. Onde está a diferença? Seria o destino, a sorte de cada um? Na nossa civilização não pensamos assim – prosseguiu o mestre. A diferença está na visão que as pessoas têm de seu futuro. Se você acreditar que terá sucesso na viagem, é muito provável que assim terá. Se você, no entanto, acreditar que não terá sucesso, é certo que assim será. Você se lembra de que quando era menino, sonhava que um dia seria marinheiro de verdade e sairia para conhecer o mundo? Esse dia chegou e isso ocorreu porque primeiro você sonhou.

O sábio abriu então uma caixinha de madeira trabalhada e de dentro tirou um pequeno marinheiro de chumbo que o jovem imediatamente reconheceu, pois era um de seus brinquedos favoritos. E disse:

- Leve consigo esta lembrança para que você nunca perca aquilo que as crianças trazem dentro de si : o otimismo.

O segundo sábio recebeu o jovem já dentro do templo em um local semelhante a uma biblioteca. Havia muitos livros, alguns experimentos, objetos e cartas de navegação.

- A travessia do mar não é para principiantes, disse o sábio, e, por esse motivo, você vem se preparando durante todos esses anos. Entretanto, à medida que a viagem prosseguir, maior será a complexidade dos problemas. E você só continuará se estiver cada vez mais preparado. Atrás do desempenho de um grande músico, ou de uma bailarina, ou de um carpinteiro, existe uma jornada de práticas, estudos, dedicação e acima de tudo, método. Você aprendeu o método dos navegadores, use-o para sempre aprender cada vez mais. Quando estiver em alto mar, você encontrará um pássaro formidável, o maior de todos, o albatroz marinho. Único pássaro capaz de dar uma volta completa ao redor do planeta. Ele faz isso com muito planeio, sem bater as asas parte do tempo, usando de forma inteligente sua envergadura de quase quatro metros, evitando calmarias, dormindo sobre as águas. Inspire-se nele, disse o sábio, e leve consigo esta pena de albatroz como símbolo da competência que será necessária

Estava começando a chover quando o rapaz conheceu o terceiro sábio. Estavam no meio do verão, de forma que no início da noite o ruído da chuva criava um ambiente de intimidade e harmonia. E o sábio falou:

- Existem navegadores que partem cheios de entusiasmo e otimismo. Levam consigo suas cartas e sabem utilizá-la. Acontece que muitas vezes as coisas não acontecem exatamente como foram planejadas. Uma tempestade inesperada, uma calmaria fora de hora, uma doença, ou um inverno incomum podem adiar os planos. É aí que alguns desistem e não tentam novamente. Veja a vida dos rios, por exemplo. Na sua rota para o mar, também encontram obstáculos aparentemente intransponíveis. Mas não desistem; modificam-se, se for preciso, criam novos meandros, passam pelos lados e pelos obstáculos e chegam ao seu destino.

O sábio entregou ao jovem uma pedra negra, totalmente opaca, arredondada e lisa. E disse:

- Este seixo é encontrado no fundo dos rios de montanhas, perto de vulcões, de onde veio, há milhares de anos; leve-o em sua bagagem para que o ajude a ter persistência.

Ao entrar no local onde estava o quarto sábio, o jovem percebeu que a única luz era proveniente de uma lamparina sobre o piso. O sábio estava sentado no chão e de forma semelhante o rapaz se acomodou, bem à sua frente, para escutar o que tinha a dizer.

- Ao longo de sua grande aventura – disse o mestre – você terá que enfrentar muitos perigos. Haverá noites em que os demônios e espíritos virão assustá-lo. Você sentirá muito medo. Todos sentem medo durante a viagem, tenha plena consciência disso. Entretanto, muitas vezes nossos medos são irracionais, e basta a luz de uma pequena chama para mostrar que estamos tendo inimigos imaginários. A temida floresta poderá ser seu esconderijo seguro. Mas, muito cuidado! Outras vezes o perigo é real. Se assim for, respeite-o, prepare-se bem e enfrente-o confiante.

Com essas palavras o mestre entregou a lâmpada e disse:

 - Leve-a consigo. Ela simboliza a coragem. Não há nada a temer!

 O som de uma flauta indicou ao rapaz que ele estava num ambiente diferente dos anteriores. Havia uma diferença também com o quinto sábio que passava a impressão de ser um pouco mais jovem que os demais. Ele disse ao rapaz:

 - Todos nascemos com habilidades para criar coisas novas. Não existe nada definitivo, tudo pode ser melhorado. Porém, alguns viajantes acreditam que não nasceram com esse dom e seguem navegando sempre do mesmo jeito, sem inovações, nem melhorias; muitas vezes o ato de criar é um ato de descobrir. Todas as coisas já estão criadas, basta estar receptivo para captá-las. Se for preciso – continuou o sábio – abandone ideias preconcebidas, rejeite os preconceitos, destrua os mitos. Deixe de lado suas inibições, suas preocupações e ansiedades. Assim você estará sensível às novas ideias, principalmente àquelas que sempre estiveram junto de você.

O sábio, então, entregou ao jovem um pequeno frasco de vidro e lhe disse:

 - A areia deste frasco, trabalhada corretamente, ajuda a erguer um castelo. Com a técnica certa esta mesma areia poderá ser transformada em vitrais. Leve-a consigo como alimento para a sua criatividade.

 A sala onde se encontrava o sexto sábio era despojada de qualquer tipo de adorno, mas era ampla e confortável. À noite tinha avançado bastante, e o jovem sentiu um pouco de fome. O sábio, ao perceber, compartilhou com ele o pão e as frutas que comia. E lhe disse:

 - Com sua determinação e com os presentes que recebeu você progredirá. Cruzará mares, atravessará cordilheiras, conhecerá cidades e pessoas encantadoras, freqüentará templos e palácios luxuosos. Poderá ter a sensação de ser um navegante poderoso e destemido e de que nada no mundo poderá detê-lo. Talvez passe a se considerar mais virtuoso ou superior que os outros. Cuidado!!! Esta é uma grande cilada que poderá até matá-lo, fisicamente ou espiritualmente! Somos imperfeitos. Aceite seus próprios erros, e anote-os em seu manual de erros do passado, para não repeti-los no futuro. Renove-se com eles.

 O sábio, então, levou o jovem até a janela, apontou para Canopus e disse:

- Veja aquela estrela brilhante. Apesar de sua luz, de sua beleza, de sua longevidade, ela é só uma entre todas as estrelas do universo. Nem melhor, nem pior, apenas diferente de todas as outras.

Então presenteou o rapaz com uma estrela do mar – porque o mar também é infinito – e disse:

- Esta é a estrela da humildade. Leve-a sempre consigo.

O sétimo sábio era o mais antigo e, portanto, o mais evoluído de todos. Diz a lenda que teria vindo de uma estrela distante para ajudar na evolução das pessoas através do desenvolvimento de sua consciência. Chamava-se Anima. Era uma mulher de rara serenidade e beleza. Que assim falou:

- As criaturas da guerra, com suas flechas pretas e seu desejo de destruição, também usam o otimismo, a competência, a persistência, a coragem, a criatividade, até mesmo a humildade!! Um ladrão, um impostor, um bandido, todos esses também podem usar essas habilidades. Onde está a diferença?

 - A diferença – disse o jovem – está nos valores de cada um.

 - Sim, mas o que são valores? Perguntou Anima.

 - Os valores estão contidos nos princípios éticos e morais de cada pessoa, disse ele.

 - Sim, mas onde é que tudo é espontâneo, natural e universal? Ela perguntou.

 Então, finalmente o jovem percebeu que estavam falando do amor.

 - O Amor – disse Anima – será a única moeda aceita em todas as épocas e em todos os lugares por onde você passar. Ame o próximo, perdoe seus defeitos, não seja intolerante. Todos os viajantes que encontrar pelo caminho estão com você – e cada um à sua maneira – em busca da mesma paz de espírito. Enquanto o homem tiver amigos – gente que ele ame e que o ame – ele será feliz. Mas, se não tiver esse laço de amor com a vida, não terá razão para continuar vivendo. Lembre-se o seu poder é infinito. Você que irá determinar com suas atitudes, como será sua viagem e como será sua vida.

Despediram-se com um abraço – um abraço de alma.

O ruído dos pássaros e o aroma das plantas indicavam que logo seria a hora de partir.

(publicado na Revista Coaching Brasil edição de janeiro/24)

Nessa longa viagem que todos fazemos, é preciso refletir e agir:

  • Qual é o seu plano de viagem?
  • Qual é a sua visão de futuro? O propósito que você sonha realizar?
  • Quais são as competências – conhecimentos, habilidades, atitudes -, que você já possui e que são fundamentais para o seu êxito nesta viagem?
  • Quais são as dificuldades, os riscos e possíveis obstáculos que você pode encontrar pelo caminho e precisa superar para chegar ao seu destino?
  • Quais são os seus medos que você precisa vencer?
  • O que lhe falta neste momento – recursos, habilidades, competências, conhecimentos que você precisa criar ou desenvolver para ter êxito nessa viagem?
  • Reflita sobre os erros que você já cometeu e olhe para si mesmo e observa as suas vulnerabilidades... Quais foram as lições aprendidas até o momento que te ajudarão a prosseguir a viagem?
  • Quais são os seus valores, os princípios mais importantes da sua vida, que te servirão como bússola em toda a sua viagem e em suas decisões? Desejo que as provocações e reflexões dessa estória contribuam para o seu desenvolvimento como também contribuiu para o meu crescimento, nessa grande viagem de mil luas que todos fazemos.Como consultor, professor e coach de liderança tenho procurado despertar e ampliar a consciência para que toda pessoa seja a melhor versão que puder ser como pessoa e profissional. Vamos fazer essa viagem?Robson Santarém

Coach de Lideranças, Consultor, Palestrante, Professor, Escritor

Membro da Comunidade de Coaches dos Países de Língua Portuguesa

Autor dos livros: Coaching de Liderança: Provocações e Reflexões (Ed. Senac), E você, o que faria? Como filósofos ajudam a decidir e Millennials: o mundo é melhor (Qualitymark Editora), Precisa-se (de) Ser Humano - Valores Humanos: Educação & Gestão; As bem-aventuranças do líder: a jornada do herói; A Perfeita Alegria - Francisco de Assis para Líderes e Gestores (Ed. Vozes) e Autoliderança - uma jornada espiritual (Ed. Senac Rio) e coautor de Puer & Senex - Dinâmicas Relacionais (Ed. Vozes)

 

Dalmo Marins, M.e

Conselheiro Consultivo | Professor | Diretor | RH | Gestão de Pessoas | Palestrante | Mentoria

10 m

Uma bela fábula que traduz muito bem a sua generosidade mestre Robson Santarem. Saber para onde vamos, como vamos, com quem vamos e porque vamos, cria sentido para essa jornada.

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