VILA OPERÁRIA - MEMÓRIA DA CIDADE

Eu nunca morei na vila Operária, um dos mais importantes bairros da cidade de Maringá, mas a vila Operária marcou minha vida profundamente, está nas minhas lembranças e memórias, ela sempre foi um bairro central, referência para mim.

Assim que mudei, junto com minha família, vindo da área rural do município de Marialva, do sítio de meu avô Santo Caleffi, no ano de 1974, vindo morar no bairro Aeroporto, em Maringá, a vila Operária passou a fazer parte cotidiana de minha vida, da vida de minha família, por muito tempo. Era sempre uma referência.

O bairro Aeroporto, onde fui morar com minha família, assim que vim morar em Maringá, fica ao lado, vizinho da vila Operária. Meu tio Vicente Santiago, irmão mais velho de minha mãe Madalena Santiago Caleffi, nos ajudou muito nesta nova vida na cidade de Maringá, morava na vila Operária, na rua Inhauma ou Monte Caceros, que era sem asfalto toda de cascalho, eu não saía da casa dele.

Foi o tio Vicente, que arrumou o meu primeiro emprego em Maringá. Foi na vila Operária, que fui trabalhar registrado, pela primeira vez na minha vida. Eu tinha treze anos de idade. Foi num açougue. O açougue J.J. Maia, do senhor José Osvaldo Maia. Lá, neste açougue, já trabalhava o filho do tio Vicente, meu primo Moacir Santiago. Comecei a trabalhar no açougue do Maia assim que cheguei em Maringá. Ficava na vila Operária, na avenida Paissandu, perto da principal praça da vila Operária, a praça Regente Feijó. Muitos anos depois, quando fui vice-prefeito e prefeito de Maringá, junto com José Cláudio Pereira Neto, construímos ali perto da Praça Regente Feijó, uma ampla Unidade Básica de Saúde, para atender a população da vila Operária. Além do Centro de Educação Infantil(CMEI), Benedito de Souza, também ali perto na avenida Paissandu, na antiga UPAPE e fizemos a ligação da vila Operária com a vila Bosque, entre outra obras.

Lembro que a avenida Paissandu não tinha asfalto ainda, havia muita poeira nos dias de sol a pino, era toda cascalhada, nos dias de chuvas muito forte, fazia uma lama danada, mas o cascalho ajudava um pouco.

Eu ia da minha casa no bairro Aeroporto, na avenida Londrina, esquina com a rua Arapongas, até ao açougue do Maia, trabalhar de bicicleta. Subia a avenida Londrina, passava pela avenida Monteiro Lobato, pegava a avenida Paissandu, cruzava a avenida Laguna e chegava até ao açougue do Maia. Tudo sem asfalto. No caminho, passava pelo Brinco da Vila, lugar que marcou-me muito, pois era ali o espaço de treinamentos do Grêmio de Esporte Maringá(GEM), o galo, onde sempre tinha muita gente, era sempre muito movimentado, principalmente nos dias de treinos do grêmio. Naquela época, o grêmio era um bom time de futebol, os torcedores eram apaixonados pelo time, tinha até uma torcida organizada, Torcida Organizado do Grêmio(TOG). Eu acompanhava tudo ali no Brinco da vila, na vila Operária.

O Brinco da Vila pertencia ao município de Maringá, mas quando assumimos a prefeitura de Maringá, como prefeito da cidade, encontramos o Brinco da Vila sob hipoteca trabalhista, a justiça trabalhista tinha penhorado, já há um bom tempo, aquele espaço, como garantia do pagamento da dívida trabalhista, dos direitos trabalhistas, de alguns jogadores do time do Grêmio de Esporte Maringá(GEM), que não tinha sido quitada ainda. O Brinco da Vila ia ser leiloado, vendido, para pagar a dívida trabalhista com os jogadores. Diante disto, tomamos a atitude de pagar esta dívida e recuperar o Brinco da Vila para a cidade de Maringá, como espaço público de novo. A prefeitura parcelou a dívida, pagou-a, e retomou o Brinco da Vila para o município de Maringá, para o uso público da comunidade da vila Operária. Havia uma relação afetiva com aquele espaço, com o Brinco da Vila da vila Operária. Além do que a vila Operária tinha poucos espaços públicos a disposição da população.

O colégio onde estudei assim que cheguei de Marialva foi o Colégio Estadual João XXIII, que ficava na avenida Monteiro Lobato, na divisa do bairro Aeroporto com a vila Operária.

Outro lugar que marcou-me muito foi o Cine Horizonte, onde eu ia assistir as sessões de filmes que passava ali, as vezes dupla, dois filmes seguidos. Nos fins de semana, geralmente aos domingos a tarde, ia as matinês no Cine Horizonte. Ia sempre de bicicleta, onde havia, ao lado do cinema, do outro lado da rua, na rua Neo Alves Martins, bem na esquina, com a avenida Riachuelo, um bicicletário, guardava a minha bicicleta ali, enquanto assistia os filmes no Cine Horizonte. Era um cinema enorme, imponente, de muitos lugares, com cadeiras de madeira, sempre havia um senhor com uma lanterna para orientar e vigiar no escurinho do cinema.

O Cine Horizonte ficava na avenida Riachuelo. Todas as semanas passava um carro de som anunciando os filmes que estavam em cartaz. Faziam grandes pinturas das imagens, cenas, dos artistas principais dos filmes, em enormes painéis, era uma verdadeira obra de arte, há! que saudade!, transportavam alguns nos carros que anunciavam os filmes pela vila Operária e pelos bairros próximos, além de expor os mesmos em frente do cine Horizonte, era lindo de ver aquelas obras de arte, chamava muito a atenção. Como esquecer?! Doces lembranças. Tudo isso acontecia na vila Operária. As marretas da insensibilidade derrubaram o Cine Horizonte, não existe mais, só nas minhas lembranças da juventude e de muitos outros, que por ali vivenciaram aquelas tardes de domingo ontológicas.

Outro ponto de referência que marcou-me muito na vila Operária, foi o Hospital Santa Casa de Misericórdia de Maringá, que ficava bem perto de minha casa. Era o único hospital daquela região da cidade. Estava sempre cheio, vinha gente de longe para se tratar ali. Ocupava um quarteirão inteiro. Era enorme. Todo construído de madeira, muito bem feito, era uma obra de arte, bonito. Impressionava-me. Passava com minha bicicleta quase todo dia perto dele. Fiz até uma cirurgia ali, foi no meu joelho. Foi realizado pelo médico ortopedista do hospital dr. Armando, um ótimo ortopedista, que residia quase vizinho de minha casa no bairro Aeroporto, que ficava pertinho da vila Operária.

No início de minha vida em Maringá praticamente vivia na vila Operária, pois quase tudo era ali, meu trabalho, meu lazer. Andava de bicicleta minha particular comum ou com a bicicleta cargueira de trabalho, do açougue onde fazia as entregas e outros serviços, mas sempre de bicicleta. Andava por toda a vila Operária, conhecia tudo por ali, ruas, avenidas, praças, enfim tudo. Eram ruas e avenidas sem asfalto.

Tem tantas outras histórias para contar que vivi na vila Operária, tais como, a feira livre da avenida Riachuelo, que começava na praça Regente Feijó e descia pela avenida Riachuelo, era muito movimentada, viva, onde eu ia sempre; dos circos que se instalavam ali perto do açougue do Maia, na avenida Paissandu; das folias de reis, das suas danças maravilhosas, que ainda existia vivas ali na vila Operária; do Parque do Ingá, mata imensa, maravilhoso, que encantava-me, lembrava-me da natureza do nosso sítio onde nasci lá no município de Marialva, era cheiro de mata nativa, cheiro de verde, gostava muito de passar por ali, perto daquela mata, lembro que tinha um trilho para passar nos fundos do Parque do Ingá, sobre o córrego Moscados, para passar da vila Operária para a vila Bosque, eu passava no meio da mata com minha bicicleta cargueira. Do outro lado do Parque do Ingá, já na vila Bosque, tinha uma grande venda de madeira, bem pertinho, em frente do Parque do Ingá, onde as vezes, eu fazia entrega dos produtos do açougue do Maia, era muito movimentada; da avenida Monteiro Lobato, que corria no fundo da vila Operária, um lugar meio abandonado, até mal falado, mas eu passava sempre por ali, a Monteiro Lobato, passava bem no fundo da vila Operária, depois dela era fundo de vale, mata também, como era uma baixada, sem asfalto havia muito abandono, muitos buracos, com casas muito simples, cheias de muitos moradores, eu passava sempre por ali. A Monteiro Lobato, nascia na avenida Mauá, era considerada como ponto limite entre a vila Operária e o bairro Aeroporto, passava em frente ao Colégio Estadual João XXIII, a sede do DER, seguia o fundo de vale, que dividia a Operária e a vila Bosque, morria no córrego Moscados, córrego que nascia no interior do Parque do Ingá. Era uma avenida importante, mas muito abandonada. Lembro que quando fui prefeito de Maringá, tomei a providência de ligar a avenida Monteiro Lobato com a vila Bosque, fazendo a ligação entre as duas vilas que era dividida pelo córrego Moscados, construindo uma ponte sobre o rio que dividia as duas vilas. Hoje ali está muito bonito; da Igreja São José; da avenida Mauá, com suas indústrias, além de muitas empresas metalúrgicas, era muito movimentada; da escolinha de datilografia que eu levava minha irmã mais velha, Maria Aparecida Caleffi, na garupa de minha bicicleta, para ir aprender nas aulas datilografia, que ficava na avenida Riachuelo perto do Cine Horizonte; do comércio da vila Operária; da Casa Estrela, do senhor João, um português simpático, alto, magro, loiro, atento, educado, bom, eu gostava muito dele, eu ia sempre lá, depois quando eu me tornei prefeito de Maringá fazia questão de ir visitá-lo lá na sua Casa Estrela, ele já estava bem velhinho, mas estava lá do mesmo jeito de sempre, simpático; da Casa Paraná; de um empório, venda, numa grande construção antiga de madeira, velha, que ficava bem em frente ao açougue do Maia onde eu trabalhava, na avenida Paissandu, onde o seu proprietário parecia ser um turco, sério, grande, moreno, falava pouco, estava sempre na porta do seu estabelecimento; do supermercado Agostinho, que ficava na avenida Brasil, perto da Igreja São José; da sorveteria beija-flor, que ficava na avenida Paissandu, ao lado do Brinco da Vila; da UPAPE, era uma escolinha antiga, que depois como prefeito de Maringá tivemos a oportunidade, a honra, de construir ali no mesmo lugar da antiga UPAPE, uma bela escola municipal, linda, moderna, maior, a escola municipal Benedito de Souza.

São tantas histórias, lembranças, memórias afetivas, que por certo, muitas outras ainda, num futuro, terão que ser contadas, narradas.

São as vivências pessoais a serviço da história coletiva

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