Voluntariado familiar e condição humana.
O que você vai ser quando crescer? Essa pergunta foi ouvida por muitos de nós durante a infância. Respondíamos com o nome de uma profissão, ainda que as respostas mudassem constantemente e de acordo com a brincadeira do momento. Era comum querermos ser astronautas em um dia e veterinários em outro. Ao lado, muitas vezes estavam os pais tentando dar um norte melhor para as respostas, garantindo que houvesse alguma coerência.
Esse cenário, embora compreensível, mostra as grandes lacunas da nossa sociedade. São espaços vazios que foram deixando de ser ocupados ao longo dos séculos, ou que, talvez, nunca tenham sido preenchidos completamente. Esses são os espaços do “ser”. A ponto de se refletir em um simples pergunta, na qual o essencial não era considerado. Afinal, o que é “ser” quando crescer? Significa que a criança não está neste “estado”?
Para a filosofia, “ser” está relacionado a nossa existência. Jean-Paul Sartre, renomado filósofo existencialista, considerava que o ser humano era responsável por si mesmo e que, ao mesmo tempo, não tinha uma essência predefinida. Ou seja, para Sartre, “as pessoas fazem-se, constroem-se, na medida em que vivem e exercem a sua liberdade”. Nesta ótica, se o ser humano se define ao longo de toda a sua vida e conforme suas experiências, qual é o papel da família nesse processo?
O papel basilar dos pais pode estar menos em orientar escolhas dos filhos e mais em propiciar experiências “existencialistas”, ou mais orientadas a criarem um contexto rico em aprendizados, sentidos e desenvolvimento de habilidades que permitam as escolhas individuais dos filhos.
É no bojo dessa construção de experiências que o voluntariado familiar surge como um caminho para elevar o nível do processo de educar outro ser. Um estudo, realizado por pesquisadores da Universidade Estadual de Michigan e da Universidade do Norte do Texas mostra que o voluntariado em família pode aumentar o crescimento psicossocial do indivíduo ao possibilitar que pais insiram seus filhos em um contexto favorável ao desenvolvimento de características essenciais para a existência humana, como: empatia, vínculos sociais e autorregulação. Tais contextos têm potencial, inclusive, de favorecer a construção de uma sociedade mais justa e colaborativa.
Histórias de pessoas que experenciaram o trabalho voluntário em família durante a infância ou adolescência evidenciam a importância desses eventos para o autodesenvolvimento. Para Adriana Pinheiro, professora de Libras na Universidade Federal do Rio de Janeiro, as experiências de envolvimento dos seus pais com causas sociais e de voluntariado quando jovem moldaram escolhas importantes ao longo de sua vida. “A família é o núcleo mais importante da vida de uma pessoa. Foi o modelo de dentro de casa que me inspirou inicialmente e me fez voltar o olhar para as pessoas mais vulneráveis”, comenta Adriana.
Recomendados pelo LinkedIn
Relatos como esse mostram que o voluntariado familiar pode abrir caminhos antes não percorridos e apoiar na edificação do ser humano. E, se não há uma essência humana, mas sim uma condição humana, como afirma Sartre, talvez a pergunta das nossas infâncias deva ser reescrita e reorientada aos pais. Poderíamos nos perguntar: o que fazer para que as nossas crianças possam ser melhores seres humanos a qualquer momento de suas jornadas?
Para acompanhar o quadro Sua história inspira:
Para acessar a pesquisa Fortalecendo Famílias Através do Voluntariado: Integrando o Voluntariado Familiar e a Educação para a Vida Família: