Votos Vencidos
No dia 18 de junho passado, transcorria com relativa calma uma sessão no Supremo Tribunal Federal (STF) para o julgamento da legalidade do chamado “Inquérito das Fake News”, que investiga a disseminação de conteúdos falsos pela internet, além de ataques ao próprio STF. O ministro Marco Aurélio Mello abriu divergência, votando pela ilegalidade do inquérito. Desta forma, tornou-se voto vencido, já que os outros 10 ministros votaram pela manutenção do inquérito, com a continuidade das investigações.
No Brasil, o tema dos votos vencidos nos tribunais não tem merecido muita atenção por parte dos estudiosos do Direito, como nos Estados Unidos, onde esse assunto é objeto de profundas reflexões, que resultam em grandes obras jurídicas, principalmente no caso dos votos vencidos na Suprema Corte. Tanto é assim que o maior nome da justiça norte-americana é o do jurista e juiz da Suprema Corte Oliver Wendell Holmes Jr., que se tornou célebre pela quantidade de votos vencidos nos julgamentos de que participava.
É óbvio que não bastava apenas ser um voto vencido (um dissenter, em inglês). O fato é que, mais tarde, constatou-se que os votos de Wendell Holmes tinham um alcance que ia muito além de seu tempo, pela sabedoria de sua visão constitucional, que destoava dos entendimentos majoritários, que com o tempo acabariam sendo superados. Muitos de seus votos vencidos deixavam transparecer a sua visão de longo prazo, numa perspectiva não percebida pela maioria dos juízes, à época do julgamento do caso.
Antes de integrar a Suprema Corte americana pelo longo período de 1902 a 1931, Wendell Holmes havia participado da Guerra Civil, num batalhão chamado de “Exército de Harvard”, pois naquele tempo ainda era aluno da Universidade Harvard. Depois da guerra, concluiria seu curso de Direito e levaria adiante uma longa carreira na advocacia, na política e na docência. Suas obras jurídicas deram grande impulso ao movimento denominado de “realismo jurídico”, que considerava que o direito não é apenas lógica, mas sim experiência.
Detentor de um vasto conhecimento, Wendell Holmes era um homem destemido e simples, e sempre levava em consideração os seguintes preceitos: todos cometem erros; todos temos opiniões boas e más; nenhum de nós está certo o tempo todo; todos nós, em relação a um ponto ou outro, temos de respeitar a opinião de outra pessoa; e a vida é um experimento, desde a hora em que nos levantamos pela manhã até a hora em que nos deitamos à noite. Diante de tudo isso, não se importava em ser uma espécie de “campeão dos votos vencidos”.
Entre nós, de acordo com o atual decano do STF, o ministro Celso de Mello, aquele que vota vencido não pode ser visto como um espírito isolado nem como uma alma rebelde, por isso mesmo, deve merecer o respeito de seus contemporâneos, pois a história tem registrado que, nos votos vencidos, reside, muitas vezes, a semente das grandes transformações.
"Quando todos pensam igual, ninguém está pensando"