Avaria marítima e tempestade: Cabe excludente de responsabilidade civil de caso fortuito ou força maior? Osvaldo Agripino - advogado maritimista
AVARIA MARÍTIMA E TEMPESTADE: CABE EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE CIVIL DE CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR? Osvaldo Agripino - Advogado - agripino@agripinoeferreira.com.br
O Direito Marítimo, um dos mais antigos ramos do Direito, tem suas diversas particularidades. É possível evitar uma avaria em expedição marítima em que há uma tempestade ? E se ocorrer danos à carga ou esta for extraviada, são cabíveis as excludentes de responsabilidade civil com base no caso fortuito ou força maior, cláusulas que constam no Bill of Lading geralmente alegadas pelo armador, em ações indenizatórias desta natureza? Depende. Veja o vídeo. Explicarei.
Um navio, de forma simplificada, comporta-se como uma grande viga e sofre esforços transversais e longitudinais. Dependendo dos impactos, ele pode "quebrar" em mais de uma parte e fazer com que a carga e contêineres sejam perdidos no mar.
Entre 2008-2013, segundo o World Shipping Council, 546 contêineres foram perdidos no mar por ano, e 1.679, se contar os eventos catastróficos. É preciso pear (amarrar) bem a carga, se transportada no convés e evitar os balanços. Em mar grosso, o piloto deve reduzir a velocidade do navio, para diminuir o impacto nas ondas, procurar navegar em capa (+ ou - 45 graus em relação às ondas) , além de passar do piloto automático para o manual, ou seja, usar o timão.
Mesmo assim, os impactos são grandes e pode ocorrer cavitação, ao descer no cavado da onda, fazendo com que o navio trepide. Nos tempos de tripulante (Deck Officer, 1983-1987), tive oportunidade de "pegar mau tempo" (mar 10 e 11 na Escala Beauforf - 12 é furacão) em três oportunidades, locais e navios de classes diferentes: (a) indo para o Canadá no Atlântico Norte - navio Caiçara, da Netumar Lines, no encontro da Gulf Stream com a corrente que vem da Groelândia, próximo à Newfoundland, na entrada do Rio São Lourenço; (b) no Golfo de Biscaia (norte da Espanha), antes do Dover Strait (Canal da Mancha), indo para Bélgica e Holanda, navio DoceAngra, da Docenave, ex-Vale. e (c) no Mar do Japão, partindo de Kobe para o Canal do Panamá, via Pacífico -navio Frota Rio.
Bons tempos, com muito vento e Deus no comando, sem contêiner ou carga no mar. Por fim, é preciso ter muita cautela em ações indenizatórias no Direito Marítimo. A sucumbência em caso de insucesso é grande.
Para reduzir o risco, é relevante que o importador ou exportador usuário do serviço de transporte celebre: (i) contrato de transporte com cláusula escalonada (conciliação e arbitragem), em câmara com lista de especialistas com formação jurídica, marinheira e securitária; (ii) contrato de seguro no Brasil, com a assessoria de um corretor de seguros especializado no tipo de carga e transporte, incluindo o trecho terrestre do transporte.
Qualquer alteração no risco do transporte pactuado deve ser informado à seguradora, que poderá aceitar a nova condição, fixando novo preço maior ou até menor ou ainda romper o contrato celebrado falte de interesse comercial.
Mesmo assim, seja no Poder Judiciário, seja numa Câmara de Mediação e Arbitragem, cada caso é um caso, especialmente quando há tais exemption clauses, e deve ser analisado com detalhe e à luz do direito aplicado cum grano salis, com ceticismo.
Corretor de Imóveis na BEDIN CORRETORA DE IMÓVEIS E SEGUROS
7 aA RESPONSABILIDADE DO TRANSPORTADOR MARITIMO Fonte: Reproduzido do artigo sobre o tema, originalmente publicado por Paulo Henrique Cremoneze Pacheco – ( Machado, Cremoneze, Lima e Gotas) ADVOGADOS ASSOCIADOS. O transportador marítimo, ao receber os bens contratualmente confiados para o transporte, deve, antes, guardá-los e conservá-los, para, depois de feita a viagem marítima, restituí-los, entregá-los, a quem de direito e no local de destino. Evitando comentar questões mais específicas ao Direito Marítimo (Direito da Navegação), é tecnicamente certo dizer que o capitão do navio é aquele que representa, em tudo e para tudo o que for relacionado ao navio e a viagem. Conforme o caso, poderá representar o proprietário, o armador ou mesmo o afretador (aquele que loca espaços do navio ou todo este). Normalmente, o capitão é o representante daquele que emitiu o conhecimento marítimo (contrato de transporte marítimo), e que é chamado de transportador marítimo. Se o capitão do navio falhou em uma de suas obrigações profissionais, e em razão desta falha causou danos nos bens confiados para o transporte, é inequívoca a caracterização da sua culpa. A culpa do capitão é absorvida diretamente pelo transportador, já que o capitão, na melhor forma de Direito, é preposto do transportador. Importante, mesmo que esse transportador, por força de um dos muitos contratos existentes no Direito Marítimo, não tenha vínculo específico com o capitão. Assim, o capitão do navio é preposto de todo aquele que, em relação ao navio e as cargas, assume às vezes de transportador. A responsabilidade do transportador encontra-se preponderantemente disciplinada pelo artigo 519 do Código Comercial, ainda em vigor: Art. 519. O capitão é considerado verdadeiro depositário da carga e de quaisquer efeitos que receber a bordo, e como tal está obrigado à sua guarda, bom acondicionamento e conservação, e à sua pronta entrega à vista dos conhecimentos (arts. 586 e 587). A responsabilidade do capitão a respeito da carga principia a correr desde o momento em que a recebe, e continua até o ato da sua entrega no lugar que se houver convencionado, ou que estiver em uso no porto da descarga. Praticamente o mesmo conteúdo se extrai do artigo 141, inciso VII, do RTM, diploma legal que cuida mais especificadamente de regras de Direito da Navegação, que assim prescreve: Art. 141. O Capitão tem os seguintes deveres: VII — zelar pela guarda, bom acondicionamento e conservação da carga e quaisquer efeitos que receber a bordo. Dada a importância do capitão em relação ao transporte marítimo, tem-se por certa sua condição de preposto do transportador marítimo, seja pela prévia existência de relação jurídica entre ambos, seja por meio da tradição jurídica própria do Direito Marítimo, sendo de se comentar a qualidade de proposto ficto. Colocada a questão de tal forma, é de se afirmar que o transportador responde pelos atos do capitão e, mais, responde objetivamente, sendo irrelevante a apuração da culpa deste pelo Tribunal Marítimo, órgão administrativo com competência restrita para apurar atos e fatos da navegação. O Direito brasileiro dispõe que todo empregador, ou equiparados legais, responde objetivamente pelas condutas de seus empregados ou prepostos. Trata-se, demais, de matéria sumulada pelo Supremo TribunalFederal: “STF - SÚMULA 341 - É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto.” Tal enunciado de súmula é bem empregado no caso específico do transportador marítimo, este entendido como aquele que assumiu o dever jurídico contratual de transportar coisas e a pessoa natural efetivamente responsável pelo transporte em seu nome, o comandante do navio. O transportador marítimo, a quem se incumbe bem escolher os seus prepostos ou representantes, responde pelos atos do capitão não por que tenha dado causa direta pelo fato danoso, mas, sim, pelo que é, pela natureza da relação jurídica que tem com o seu preposto e, sobretudo, pelo modo como se apresenta perante o terceiro que com ele celebra o Contrato de Transporte Marítimo. Com ou sem apuração da culpa do comandante do navio, o transportador somente conseguirá afastar sua presunção de culpa pelo evento danoso se, todo o modo, conseguir provar a existência de alguma causa legal excludente de responsabilidade. Das Causas Excludentes Legais de Responsabilidade Três são as causas excludentes de responsabilidade do transportador: 1) Vício de origem 2) Caso fortuito 3) Força maior O vício de origem abraça outras modalidades: vício de embalagem, culpa exclusiva do credor da obrigação de transporte e vício redibitório. Vício de origem é o vício existente na própria coisa confiada para transporte. Em outras palavras, é o vício ou defeito oculto da coisa já existente quando da entrega para o transporte marítimo, que impede sua utilização ou importa desvalorização. Ora, se os danos constatados nos bens confiados para transporte marítimo preexistiam ao próprio transporte, não há que se falar em culpa do transportador. Mesmo em se considerando a responsabilidade objetiva, é manifestamente injusto obrigar o transportador a responder por danos os quais nem minimamente deu causa. Trata-se, pois, de uma causa excludente de responsabilidade que bem se ajusta aos muitos mecanismos de calibragem do sistema jurídico brasileiro e, mesmo, internacional. Mas, a prova da existência do vício de origem compete exclusivamente ao transportador marítimo, por conta e ordem do império da teoria da inversão do ônus da prova, um dos pilares da teoria objetiva imprópria. Assim, em sendo alegado pelo transportador eventual ocorrência de vício de origem, caberá a ele próprio a respectiva produção de prova, normalmente por meio de perícia judicial. Não havendo prova específica em tal sentido, mantem-se, em desfavor do transportador, a presunção de culpa pelo inadimplemento contratual. Dá-se isso porque o transportador muito provavelmente, num caso dessa natureza, recebeu a carga para transporte sem qualquer ressalva no conhecimento marítimo, vale dizer, “limpa a bordo”. O vício de embalagem é mais comumente alegado nas lides forenses sobre Direito Marítimo. De certo modo, o conceito de vício de origem é parecido com o de vício de embalagem. O vício de embalagem é o defeito existente na proteção da carga confiada para transporte. Todo transporte, especialmente o marítimo, é sujeito a oscilações diversas. Um navio, numa viagem normal entre a Europa e a América do Sul balança lateralmente centenas de milhares de vezes. Logo, a embalagem da carga é medida de rigor e imprescindível para sua integridade física e qualitativa. Se a embalagem, normalmente feita pelo embarcador, não for adequada poderá o transportador marítimo afastar a presunção legal de culpa por eventuais avarias. Mas, nesse caso, a inversão do ônus da prova, além de igualmente imprescindível, é mais complexa de ser considerada. Com efeito, o vício da embalagem não poderá ser visível a olho nu ou apurado por meio de procedimentos práticos ou máximas de experiência. O artigo 746 do Código Civil expressamente prevê que “O transportador poderá recusar a coisa cuja embalagem seja inadequada, bem como possa pôr em risco a saúde das pessoas ou danificar o veículo e outros bens.” Em sendo conferida, por lei, a possibilidade do transportador de recusar a coisa suja embalagem seja inadequada, muito difícil a eventual caracterização de vício de embalagem. De fato, ao receber a carga, o transportador automaticamente reconhece que a embalagem é adequada, pois se assim não fosse, poderia ter exercitado a faculdade disposta no citado artigo 746 do Código Civil. Logo, para se ter caracterizada a figura do vício de embalagem é preciso provar, ainda, que o vício e defeito dessa mesma embalagem era manifestamente oculto no momento do embarque. E ao se falar em “oculto”, fala-se oculto aos olhos e as máximas de experiência, ao bom-senso e conhecimento da tripulação do navio, que sabe, a rigor, quais embalagens são ou não adequadas para a maioria das cargas que lhe são confiadas por meio de sucessivos transportes. Importante destacar que vício de embalagem, jamais poderá ser confundido com vício de estivagem da carga. O vício de estivagem, apesar do nome, não tem a nada a ver com o vício oculto. Trata-se, sim, de grave modalidade de falta contratual do transportador marítimo, que se revela desidioso quanto aos seus deveres operacionais. Com efeito, a estivagem, ainda que operada por terceiro, é de inteira responsabilidade do transportador, por meio do comandante do navio. O vício de estivagem, nada mais é do que a falha operacional do transportador marítimo em arrumar as cargas a bordo do navio. Se o transportador não estivou corretamente um contêiner a bordo do navio e, em razão disso, o sinistro ocorreu, caracterizada sua culpa, não se cogitando a respeito de qualquer outra causa significativa para o acontecimento. Da mesma forma, o tempo adverso não é motivo, por si só para a ocorrência de um sinistro, pois a despeito da intensidade deste, o que de fato ocorre é a estivagem inadequada da carga, dando causa ao evento danoso. Pois bem: Força maior e caso fortuito são as causas excludentes de responsabilidade mais comumente alegadas pelos transportadores marítimos e as que são objeto das grandes discussões em lides forenses, posto que sua caracterização, não raro, é difícil de ser constatada no mundo fático nos dias correntes. Referidas causas fazem parte do gênero fortuidade, sendo diferentes, apenas, no que diz respeito ao agente causador. Explica-se: enquanto na força maior o agente causador é a conduta humana, no caso fortuito, o agente é a força da natureza. É importante destacar que esse entendimento não é pacífico na doutrina mundial. O Direito comparado apresenta a doutrina alemã em sentido contrário. Para os alemães, o conceito de força maior importa força da natureza e o de caso fortuito, a conduta humana. No Brasil, muitos doutrinadores seguem o modelo alemão. Por isso, temos no Brasil uma situação particular em termos de conceitos e definições. Explicando melhor: em termos estritamente maritimistas, costuma-se utilizar a expressão força maior como decorrente da conduta humana e caso fortuito como o evento nascido da natureza. Mas no âmbito geral do Direito Civil, temos o contrário: força maior, para eventos da natureza e, caso fortuito, para eventos originários do homem. Há quem considere caso fortuito e força maior expressões sinônimas, sem distinção de qualquer natureza, uma vez que o que é relevante ao ordenamento jurídico é a projeção dos efeitos legais e concretos de um e de outro e que são praticamente os mesmos. Em que pese o antagonismo conceitual existente entre os diversos ordenamentos jurídicos do mundo, é certo é que os efeitos são os mesmos e as conseqüências, no mundo do Direito, também. Operando-se o gênero, fortuidade, é possível compreender melhor os institutos e postulados que regem as espécies, força maior e caso fortuito. A caracterização da fortuidade depende dos seguintes elementos, tidos como pressupostos essenciais: imprevisibilidade, inesperabilidade e irresistibilidade. Os três itens acima são concorrentes, de tal sorte que precisam estar presentes, a um só tempo, dentro de um cenário fático para se cogitar ocorrência de fortuidade. A ausência de qualquer um dos itens fulmina, de pleno Direito, a invocação de fortuidade, sempre levando em consideração que quem a invoca tem o ônus de prova-la, sendo perfeitamente inserida no contexto da inversão do ônus da prova. Não basta, portanto, a ocorrência de um fato considerado anormal e provocador de um determinado dano para se validar a alegação de fortuidade, é preciso que este fato seja absolutamente imprevisível, inesperado e irresistível. Fortuidade, portanto, é o evento originário das forças da natureza ou da conduta humana que, em Direito Marítimo, impede o cumprimento regular, pelo transportador marítimo, da obrigação de transporte. É, em resumo, o evento não esperado, totalmente imprevisível e de força irresistível. O fato (fenomênico e jurídico) que não depende da conduta humana, superando-a em todos os seus limites. É algo que acontece no mundo concreto, um verdadeiro e devastador happening, ou seja, um fenômeno invencível e que produz efeitos relevantes ao mundo jurídico. Assim, não é, por exemplo, qualquer greve de trabalhadores portuários capaz de configurar a fortuidade e, da mesma forma, não é a simples ocorrência de uma tempestade, ainda que muito forte, igualmente capaz. Não é ocioso repetir que a fortuidade reclama a existência efetiva, bem caracterizada e concomitante dos requisitos imprevisibilidade, inesperabilidade (inevitabilidade) e irresistibilidade. Só se falará em fortuidade se o transportador marítimo conseguir provar, à luz do caso concreto, a ocorrência de um fenômeno imprevisível, inevitável e irresistível, sob pena de não se aproveitar alegação em tal sentido. Significa dizer que a falta de apenas um dos requisitos em destaque tem o condão de afastar eventual caracterização de fortuidade. A força maior e o caso fortuito só existem se presentes os referidos três requisitos, capazes de superar os limites máximos de cuidado do transportador marítimo em relação aos bens sob sua custódia. A falta de apenas um deles é o bastante para se ter afastada qualquer pretensão no sentido de se caracterizar a fortuidade. É de vital significado, ter-se como postulado tal entendimento, porque muito comum transportadores marítimos de cargas alegarem, diante dos casos concretos, fortuidade com base em apenas um dos referidos requisitos. Fazem-no porque continuam defendendo a idéia, há muito ultrapassada, de a expedição marítima ser uma verdadeira aventura, sujeita a inúmeros riscos e perigos, todos imprevisíveis ao homem. Sobre o tema fortuidade em relação à navegação nos dias de hoje, no mesmo artigo já citado, o querido e inesquecível mestre Rubens Walter Machado ensinou: “...a força maior ou o caso fortuito previstos por nossa legislação comercial, são os fatos imprevisíveis ou irresistíveis que superam a normal diligência e perícia que se podem exigir do comando do navio. São os fatos inesperados que extrapolam a capacidade do homem prevenir-se contra um perigo não esperado, ou de enfrentar depois de iniciado. Em nossos dias, com o avanço da tecnologia, os navios são planejados e construídos para enfrentar os usuais perigos do mar. Os meios de comunicação existentes permitem que o comando do navio tenha uma exata e perfeita informação das condições do mar a ser enfrentado, permitindo que se afastem — quase que por completo — os fatos imprevisíveis, imprevistos e inesperados.” Fonte: Reproduzido do artigo sobre o tema, originalmente publicado por Paulo Henrique Cremoneze Pacheco – ( Machado, Cremoneze, Lima e Gotas) ADVOGADOS ASSOCIADOS.
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7 aQuando a tripulação for considerada experiente tecnicamente e ainda assim, por ato falho do capitao, por exemplo: continuar no manual e em velocidade normal. Neste caso, há que se falar em indenização e responsabilidade inclusive da tripulação, correto?