Burnout materno: a força do cuidado, o peso da sobrecarga

Burnout materno: a força do cuidado, o peso da sobrecarga

Simone Nascimento, Head de Soluções em Saúde Mental na B2Mamy.

O esgotamento materno se inicia ainda durante a gravidez, quando a mulher geralmente precisa manter sua jornada de trabalho, estudos e vida familiar e ainda lidar com os preparativos para a chegada de um bebê, além das mudanças hormonais e físicas que seu corpo passará ao longo da gestação e puerpério. O nascimento da criança marca um momento intenso, feliz, mas ao mesmo tempo cansativo para a mãe. E tudo bem ficar cansada, pois não é fácil, nem simples cuidar de um bebê. A coisa pararia por aí, se não fosse a sobrecarga gerada por duplas ou triplas jornadas que carregamos.

Historicamente, elas assumiram a maior parte das responsabilidades de cuidado dentro das famílias e comunidades e todos os dias meninas e mulheres ao redor do planeta dedicam mais de 12 bilhões de horas ao cuidado não remunerado, segundo pesquisa da Oxfam Brasil. Isso inclui o cuidado de crianças, idosos, doentes, bem como as tarefas domésticas. Embora essas atividades sejam essenciais para o funcionamento da sociedade, ou seja, fazem o mundo girar, elas têm sido frequentemente subvalorizadas e invisibilizadas no contexto econômico tradicional.

A pesquisa Tempo de Cuidar, da Oxfam Brasil, constatou que se esse trabalho fosse contabilizado e pago, ele representaria mais de 10 trilhões de dólares anuais – cerca de três vezes o valor que a indústria de tecnologia injeta da economia mundial  a cada ano e se fosse um país, seria a 4ª maior economia.

Essas horas trabalhadas e não remuneradas relacionadas ao ato de cuidar de outras pessoas e do ambiente são chamadas de “Economia do Cuidado”, um conceito que tem ganhado destaque nas discussões econômicas e sociais contemporâneas. E ele geralmente recai de forma desproporcional sobre as mulheres, impactando significativamente suas vidas e, consequentemente, sua saúde mental. A sobrecarga de trabalho pode levar à exaustão física e emocional, aumentando o risco de estresse, ansiedade e depressão.

Além disso, a falta de reconhecimento e apoio para essas tarefas podem minar a autoestima e a autonomia das mulheres, prejudicando ainda mais seu equilíbrio emocional.   Diante de todo esse cenário, há  alguns anos começaram a surgir discussões sobre a semelhança do esgotamento materno com aquele observado nas atividades de trabalho formais e remuneradas e atualmente já se fala em Burnout materno. Trata-se de uma condição de esgotamento físico, emocional e mental semelhante ao que acontece nas situações de trabalho formal causado por uma sobrecarga de responsabilidades e estresse. Ela pode levar a uma série de problemas como depressão, ansiedade e estresse pós-traumático.

É válido destacar que essa condição não é sinal de fraqueza ou causada pela maternidade em si, mas pelo modo como a mulher está vivendo esse momento e o quanto de ajuda ela recebe, ou seja, é uma resposta natural a uma carga excessiva de responsabilidades e pressões.

O burnout materno pode se manifestar de várias formas, incluindo fadiga crônica, mesmo após dormir o suficiente, irritabilidade, com uma agressividade que não é habitual, falta de motivação, sentimentos de desesperança e isolamento social. As mães ou outras pessoas envolvidas em cuidados podem se sentir constantemente esgotadas, e enfrentar dificuldades para encontrar alegria nas atividades que antes traziam satisfação.

Aqui estão algumas ações que podem ser tomadas para reduzir o risco de burnout e outros transtornos mentais em pessoas envolvidas em cuidados:

● Garantir que o trabalho de cuidado seja distribuído de forma mais equitativa entre os gêneros;

● Ampliar as discussões sobre licença parental, creches acessíveis e serviços de cuidado de longo prazo;

● Reconhecer e valorizar o trabalho de cuidado não remunerado.

● Criar espaços de apoio, serviços de aconselhamento e programas de educação sobre saúde mental;

Ao tomarmos medidas para apoiar as mães, estamos investindo na saúde e no bem-estar de toda a sociedade.

Simone Nascimento, Head de Soluções em Saúde Mental na B2Mamy.


A Ilusão da Proteção nos Planos de Saúde Coletivos

Wagner Siqueira, presidente do CRA-RJ.

A Lei nº 9.656/98, marco regulatório dos planos de saúde no Brasil, estabeleceu salvaguardas importantes para os beneficiários, especialmente no que tange aos planos individuais. Contudo, a norma não se estendeu aos planos coletivos por adesão, abrindo espaço para um cenário preocupante no setor.

Visando driblar a regulação, as operadoras de saúde passaram a descontinuar a venda de planos individuais, impulsionando a adesão aos planos coletivos. Estes, por sua vez, se transformaram em verdadeiros aglomerados de “afogados abraçados”, cuja única opção de acesso à saúde suplementar reside em um produto desprovido da proteção legal originalmente concebida.

A ilusão da proteção social se esvai quando o beneficiário se depara com a possibilidade de rescisão unilateral do contrato por parte da operadora, mediante simples aviso prévio de 60 dias. Uma realidade que contrasta com a segurança jurídica almejada por quem busca um plano de saúde.

É importante ressaltar que apenas 20% dos beneficiários de planos de saúde no Brasil estão enquadrados na Lei nº 9.656/98. Ou seja, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), criada para regular o setor, atua efetivamente sobre os contratos de apenas 10 milhões de pessoas, enquanto os demais 40 milhões seguem à mercê das decisões das operadoras.

A situação é ainda mais surreal quando se constata que as operadoras obrigam os beneficiários a utilizar um recurso criado por elas próprias, que permite a rescisão unilateral do contrato. Uma prática inadmissível em qualquer mercado, especialmente em um setor tão sensível como o da saúde.

Em suma, a falta de regulação dos planos coletivos por adesão cria um ambiente de insegurança jurídica para os beneficiários, que se veem desprotegidos diante das decisões unilaterais das operadoras.

É urgente a necessidade de uma revisão da legislação, a fim de garantir a proteção dos consumidores e a equidade no mercado de saúde suplementar. A natureza das relações contratuais e dos compromissos morais de um plano de saúde com seus clientes não é nem podem ser tão simplistas quanto as relações, por exemplo, de um praticante de uma academia de ginástica ou de sócio de um clube de futebol. O Estado e a sociedade civil não podem continuar permitindo tamanho escárnio com os cidadãos.

Wagner Siqueira, presidente do CRA-RJ.


Treinar a liderança é vital para o sucesso de programas de saúde mental

Tatiana Pimenta, CEO da Vittude.

É hora dos times de gestão buscarem referências para se aprofundar no assunto sobre saúde emocional

Sua empresa já entendeu a importância de cuidar do bem-estar dos colaboradores como pilar para seu crescimento sustentável e está iniciando os primeiros movimentos em direção a um programa mais estruturado de saúde mental. Agora, é hora dos times de gestão buscarem referências para se aprofundar no assunto e embasar melhor a proposta. Começam a buscar formações no mercado ou conteúdo acadêmico e produção científica…  e não encontram praticamente nada.

Quando a Vittude começou a atuar como parceira de grandes marcas em suas estratégias de saúde mental, entendemos que precisávamos fazer algo para suprir essa lacuna de mercado e atuar fortemente na disseminação de conhecimento compartilhado em saúde mental. Se olharmos sob o ponto de vista da educação, algumas iniciativas, ainda mais técnicas e específicas em cursos de extensão, só começaram a surgir recentemente. Poderia apostar com quase 100% de certeza que a grande maioria dos líderes não teve nenhuma formação prática ou acadêmica no tema.

Fui gestora de grandes empresas na área de construção civil antes de empreender e, nem na minha graduação, nem no MBA, tive uma única disciplina que me preparou para entender como cuidar da saúde mental da minha equipe. O cenário não mudou muito desde então.

É de certa forma esperado. O movimento é relativamente recente nas empresas – embora o cenário já esteja pra lá de crítico.

Em 2023, mais de 288 mil pessoas receberam benefícios do INSS por afastamento devido a transtornos de saúde mental, um aumento de 38% em relação a 2022. O índice médio de presenteísmo nas empresas chega a 30%. Se olharmos apenas sob o aspecto financeiro, imagine o que um aumento de produtividade de 30% não poderia fazer nos resultados do negócio?

Líderes são peça fundamental da equação

Nesse caminho, as lideranças exercem um papel crucial. Como diz o ditado popular: a palavra convence, mas o exemplo arrasta. Líderes preparados para falar abertamente sobre saúde mental e reconhecer os principais sinais de transtorno mental em suas equipes são os melhores agentes de transformação.

E esse é um efeito em cascata: o CEO dá o exemplo para a alta liderança e estes para seus liderados, assim sucessivamente até que todos os gestores estejam alinhados com a ideia. Eles se tornam multiplicadores e, mais do que isso, fazem com que o cuidado ao bem-estar chegue a todos os níveis da organização, inclusive os de entrada.

São os líderes que estão no dia a dia do negócio e são os maiores responsáveis pela segurança psicológica do ambiente de trabalho, um espaço onde as pessoas se sentem à vontade para falar o que pensam ou sentem, sem medo de retaliações.

Nos diagnósticos que fazemos nas empresas parceiras, os dados comprovam uma relação direta entre ambientes de alta segurança psicológica e baixos indicadores de sofrimento psíquico, propensão ao burnout, ideação suicida e presenteísmo.

Por isso, treinar as lideranças é parte das seis principais características de empresas que conseguem avançar mais rapidamente na jornada de cuidado de seus colaboradores. São elas:

– Apoio do CEO e da alta liderança;

– Consistência e intenção;

– Inclusão do tema na cultura organizacional;

– Time dedicado à saúde mental;

– Mensuração e acompanhamento de KPIs, que norteiam as ações;

– Treinamento da liderança.

Atualmente, existem duas principais formas de treinar as lideranças em saúde mental. A primeira é por meio de programas personalizados, conduzidos por empresas especializadas em saúde mental corporativa. “Cuidando de quem cuida” é um de nossos workshops voltados para a liderança, que já capacitou milhares de líderes em grandes empresas de diversos setores, como Ambev, Grupo Boticário, Supergasbrás e Vivo, para citar apenas algumas.

A segunda é aprendendo com quem já saiu na frente e foi pioneiro no cuidado com a saúde mental de seus colaboradores. São empresas que começaram a traçar suas ações e já entenderam o que dá mais resultado, o que teve mais efetividade e o que não funcionou tão bem. Essas empresas e profissionais podem contribuir muito para a divulgação de boas práticas, compartilhando o que deu mais resultado com quem ainda está começando.

Disseminando boas práticas

Compartilhar esses aprendizados com mais pessoas foi o que nos motivou a criar os dois grandes eventos anuais da Vittude. Nosso objetivo é ampliar o máximo possível a discussão sobre diversos aspectos que envolvem o bem-estar das pessoas nas organizações, criando um círculo virtuoso de crescimento e formando multiplicadores do tema nas empresas.

O Vittude Summit, que está em sua quinta edição, triplicou de tamanho em 2024: recebemos mais de 1.100 pessoas de todas as regiões do país, participantes ávidos para ouvir os aprendizados e boas práticas de mais de 40 palestrantes, entre especialistas e executivos de empresas de diversos segmentos, que participaram de nossos 24 painéis de conteúdo sobre variados temas.

De que forma iniciar a atuação em saúde mental quando ainda não há orçamento dedicado? Como engajar a alta liderança e transformá-los em multiplicadores na organização? Qual é o papel do CEO na redução dos estigmas em relação à saúde mental no ambiente de trabalho? Que estratégias posso adotar na minha empresa para justificar investimentos? Esses foram alguns dos conteúdos apresentados e discutidos no evento.

Nas mais de 16 horas diárias de conteúdo, víamos os participantes atentos, anotando insights em seus caderninhos e trocando contatos nos intervalos de networking, para ampliar as conversas após o encontro.

Já o Vittude Awards é um evento de celebração e reconhecimento. É a primeira premiação de saúde mental do Brasil, que foi idealizada para dar visibilidade às pessoas que estão fazendo a diferença na saúde mental corporativa. É um espaço de interação para colher referências, conhecer empresas que avançaram na agenda e que já têm retorno sobre o investimento nos programas de saúde mental.

O tema saúde mental é complexo e multifatorial: quanto mais pessoas se capacitarem no assunto, trocarem melhores práticas e somarem na busca de soluções, mais rápido poderemos avançar no tema.

E, principalmente, melhor será o desfecho de saúde para os colaboradores e maior eficiência operacional para as empresas. O treinamento das lideranças é o pilar essencial para garantir a sustentabilidade dessa estratégia.

Tatiana Pimenta, CEO da Vittude.



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