A chave para a longevidade das empresas familiares e o papel estratégico dos Conselhos
As empresas familiares são pilares fundamentais na economia global, já que 90% das empresas nascem familiares, representando 65% do PIB e 75% dos empregos gerados, de acordo com dados do IBGE e Sebrae, de 2023. No entanto, a longevidade dessas empresas enfrenta desafios únicos, especialmente quando se trata de sucessão e governança. Apenas 30% das empresas familiares ultrapassam a geração do fundador, das quais somente 15% chegam a terceira geração, o que são números alarmantes.
Apesar do índice de empreendedorismo no Brasil ser incrível, quando falamos em longevidade e solidez destas empresas, os resultados são muito desproporcionais. As empresas familiares brasileiras costumam focar no médio e longo prazo, centralizando a gestão e atuando de forma conservadora em termos de organização e estrutura, sem se preocupar muito com sua longevidade e formas de inovarem e se destacarem no mercado.
Neste artigo, exploraremos como os conselhos, quando bem estruturados e liderados, podem ser a chave para garantir a continuidade e o sucesso das empresas familiares ao longo das gerações, além de contribuir com a manutenção de relações saudáveis, tanto no âmbito familiar quanto no societário.
As diferenças entre as gerações
Para atuar em conselhos de empresas familiares, é necessário primeiramente entender quais são as questões importantes para cada geração de líderes e quais suas preocupações. Na primeira geração, que tem foco no crescimento, produção e rentabilidade da empresa, os fundadores mantêm as rédeas do negócio com decisões centralizadas pela família, empresa e propriedade. Neste caso, a formação da cultura da empresa teve como base o propósito, valores e crenças dos próprios fundadores, então ainda há predominância de ansiedade e insegurança sobre o futuro da empresa com outras gerações assumindo os negócios.
Com a entrada da segunda geração, as principais decisões permanecem centralizadas com eventual delegação de poderes, mas tendo os fundadores como fiéis escudeiros. Apesar da expansão da empresa demandar mão de obra, muitas vezes pessoas da mesma família não têm vontade ou interesse em participar do negócio, ou ainda, não tem a necessária qualificação para isso. Muitas vezes também podem ocorrer disputa entre irmãos ou ainda discussões sobre fazer a sucessão familiar, ou não-familiar, contratando profissionais do mercado, o que pode causar um turbilhão se sentimentos e prejudicar o processo de sucessão e, consequentemente, o sucesso da empresa.
Quando a terceira geração entra para o negócio, o sucesso convive com a dor do crescimento, mas o fundador passa a ter mais o papel de supervisão deixando a segunda geração assumir a gestão da empresa. Porém, com a possibilidade de novos entrantes não familiares na liderança, podem haver conflitos de metodologia de gestão até por conta de diferentes culturas tentando coexistir. Conflitos familiares tendem a se intensificar neste estágio, contaminando a empresa.
No entanto, é preciso ressaltar que cada empresa familiar é única. Mas alguns fatores que podem influenciar na forma como elas são conduzidas e como a transição pode acontecer são: a geração da empresa, a idade do(s) fundador(es) e seu nível de escolaridade, o número e idade dos filhos e suas formações, aptidões e desejos, a estrutura e cultura familiar, o estágio e velocidade de crescimento da empresa, a estrutura societária, desempenho, atritos familiares, parentes e agregados, além de diversas correntes de opinião.
A Importância dos Conselhos em Empresas Familiares
Um dos principais desafios das empresas familiares tem sido a transição entre gerações. Como dito acima, a primeira geração, geralmente liderada pelo fundador, tende a centralizar as decisões, o que pode criar obstáculos para a inovação e adaptação às mudanças do mercado. E é justamente aqui que os conselhos podem desempenhar um papel crucial.
A depender das circunstâncias, os Conselhos de Família e Consultivo são os fóruns adequados para o início do trato equilibrado, justo e tempestivo das demandas relacionadas a Governanças, Sucessão, Transição e Propriedade. Os conselhos, sejam eles consultivos ou de administração, oferecem uma plataforma para discutir e implementar estratégias que equilibram os interesses familiares e empresariais. Eles ajudam a mediar conflitos, alinhar expectativas e, mais importante, garantir que a empresa esteja preparada para o futuro.
Existem várias empresas que enfrentaram dificuldades ao fazer a transição para a segunda geração da família, mas com a introdução de um conselho consultivo, conseguiram implementar práticas de governança que equilibraram a inovação com a tradição. O conselho tem sido fundamental na identificação de novas oportunidades de mercado e na integração de tecnologias emergentes, resultando em um crescimento sustentável.
Algumas empresas familiares também contratam conselheiros independentes com experiência global, para apoiar na adaptação de sua estratégia a diferentes mercados culturais e regulatórios. Essa abordagem não apenas pode aumentar a receita, mas também fortalecer a posição da empresa no mercado global.
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Existem várias formas de um conselheiro contribuir com a tomada de decisões e a longevidade das empresas familiares, como por exemplo atuando como um mediador imparcial, capaz de equilibrar interesses familiares e empresariais. Isso envolve ter a coragem de abordar questões difíceis, como sucessão e transição, com profissionalismo e empatia.
Outro ponto importante é que os conselheiros devem ser guardiões do futuro da empresa, ajudando a traçar estratégias de médio e longo prazo que garantam sua sustentabilidade e longevidade. Isso inclui a promoção de práticas de governança proativas e a antecipação de tendências de mercado. Os conselheiros devem também atuar como mentores, promovendo a educação contínua e o desenvolvimento das próximas gerações, preparando os futuros líderes para enfrentar desafios com confiança e inovação.
Construção de confiança
E falando em confiança, uma pesquisa da PwC de 2023 mostrou que ela continua sendo uma vantagem competitiva vital para as empresas familiares e esse dado é relevante pois há uma forte correlação entre confiança e lucratividade. Porém, a mesma pesquisa demonstrou que a maioria das empresas não está fazendo o que precisa ser feito para construir essa confiança. Alguns exemplos mencionados são que 87% das empresas não têm compromissos públicos com aspectos importantes; 84% não têm uma estratégia ESG acordada e comunicada; 76% não têm uma declaração de propósito e um compromisso claros que promovem a Diversidade, Equidade e Inclusão; 62% não comunicam seu propósito externamente.
Ainda nesta pesquisa, são apresentados alguns fatores para a nova fórmula da confiança, a começar por definir quem são os grupos de stakeholders com quem a organização precisa trabalhar para estabelecer ou melhorar sua relação de confiança (clientes, funcionários, governo, fornecedores, comunidades, família)? Quais são as expectativas desses grupos em relação à empresa, ou melhor, o que faria com que eles confiassem mais? E quais ferramentas estamos utilizando para melhorar esta confiança?
Devemos lembrar que a maioria dos clientes e funcionários das empresas atuais pertencem à geração millenials e Z, cujos valores são diferentes das gerações anteriores. As empresas familiares demoraram a entender essa transformação e precisam considerar que esses novos grupos têm expectativas diferentes acerca do que gera credibilidade, consomem informações de maneiras totalmente diferentes e isso exige um trabalho maior de exposição para aumentar a visibilidade dos esforços feitos pela organização, que devem ser comunicados de forma coerente.
Além disso, investir em ações e compromissos relacionados a tópicos ESG (ambiental, social e de governança), incluindo questões de diversidade, equidade e inclusão, apoio ao desenvolvimento das comunidades, aumento da transparência sobre as ações da empresa através de relatórios bem estruturados e que consigam demonstrar quais são as metas, indicadores de desempenho e o progresso alcançado ao longo do tempo, podem fazer uma grande diferença na percepção dos públicos de interesse e no grau de confiança deles em relação à empresa.
O papel dos conselhos em empresas familiares para trilhar toda essa jornada é de suma importância. Eles não são apenas órgãos de governança, mas sim catalisadores de mudança e crescimento. Ao adotar uma abordagem estratégica e equilibrada, os conselheiros podem ajudar a garantir que as empresas familiares não apenas sobrevivam, mas prosperem ao longo das gerações. A chave para o sucesso está em entender as expectativas dos públicos com quem as empresas lidam, as dinâmicas únicas dessas empresas e implementar práticas de governança que promovam a confiança, a transparência e a inovação.
Este artigo é parte do Programa de Formação e Certificação de Conselheiros da Board Academy Br , na disciplina do professor Udo Kurt Gierlich
Pedagoga, Mestre e Doutora em Educação, Orientadora de Mestrado e Tutora online na MUST UNIVERSITY
2 semPerfeito!!!