Como ser adaptativo na liderança
Em meados do século XIX, o naturalista inglês Charles Darwin divulgou uma teoria que lançava uma nova visão sobre o desenvolvimento dos seres vivos no planeta terra, a Teoria da Evolução das Espécies através da seleção natural. Segundo Darwin, as espécies, sejam de animais, de plantas ou de insetos, mais adaptadas ao meio em que vivem tem maior probabilidade de sobrevivência que outras menos adaptadas.
De acordo com essa teoria, a sobrevivência de alguns seres dependerá de como ele se adequa ao ambiente, adaptando-se ao clima da região, sobrevivendo a predadores ou mesmo se adequando ao tipo de alimentação disponível naquele local.
Um besouro de cor verde, por exemplo, terá mais oportunidade de sobrevivência em uma floresta repleta de folhas verdes que um besouro de cor marrom, que será melhor visualizado pelos predadores. No entanto, se as folhas das árvores caírem e só restar os galhos e troncos marrons, por exemplo, o besouro marrom terá uma maior vantagem em relação ao verde, pois conseguirá se camuflar melhor e, consequentemente, terá mais chance de sobreviver ao ataca de predadores.
Há milhares de anos, quando os seres humanos começaram a se fixar em determinados lugares, a desenvolver a agricultura e a pecuária, animais como pequenos roedores encontraram uma condição propícia de sobrevivência, especialmente graças à maior disponibilidade de alimentos. Os felinos que viviam nessa mesma área, e que se alimentavam desses animais menores, foram atraídos para os locais próximos às habitações dos seres humanos.
Com o tempo, felinos perceberam que lugares próximos a moradias de seres humanos costumavam atrair animais de sua base alimentar, especialmente roedores, como ratos. Os humanos, por outro lado, notaram que a convivência com os felinos era benéfica, pois afastava os pequenos e incômodos seres que viviam entre suas plantações e criações de animais. A coexistência entre as duas espécies, portanto, era favorável para ambos, ainda assim, no entanto, os felinos precisaram se adaptar à convivência com o ser humano e seu limitado espaço para a criação de animais. Por essa razão, os animais de menor porte ganharam a preferência dos homo sapiens, dando origem, assim, ao gato doméstico como o conhecemos hoje.
Como o meio ambiente e o clima da Terra estão em constante mudança, os seres vivos, para garantirem sua sobrevivência, precisam desenvolver mecanismos que os ajudem a se adaptar às adversidades, como no caso dos besouros e dos felinos dos exemplos anteriores. Aqueles que conseguirem se adequar às mudanças e transferir suas novas qualidades às próximas gerações, certamente sobreviverão às adversidades. As espécies que continuarem com as mesmas características e não se adequarem às novas condições de vida muito provavelmente não serão capazes de sobreviver à nova realidade.
As sociedades humanas se desenvolveram ao longo da história, se adaptando à mudança clima, à alteração de habitat e sobrevivendo a doenças. Apesar de hoje, sobretudo aqueles que vivem em cidades, já não estarem tão vulneráveis às intempéries da natureza, as pessoas ainda precisam estar dispostas a se adequarem ao novo normal.
Até o começo do século XX, muitas das tecnologias de que dispomos atualmente não existiam. Profissões que exigiam habilidades mais artesanais tiveram que se adaptar à mudança dos tempos e à consolidação da mecanização dos equipamentos. Os trabalhadores, por outro lado, precisaram se especializar mais em suas profissões, através de cursos superiores ou técnicos, e do aprendizado de novos idiomas, com o advento da globalização.
Assim como o clima na Terra, o ambiente corporativo também está em constante transformação. Práticas que eram amplamente difundidas e utilizadas anteriormente são revistas e alteradas para se adequarem à nova realidade proposta. Como, por exemplo, a utilização do feedforward, uma avaliação focada no aperfeiçoamento das competências, no positivismo e no futuro do colaborador na empresa, em substituição ao feedback, com foco maior no desempenho e nos erros cometidos em atividade já realizada no passado.
Da mesma forma que as espécies que não se adaptam ao meio em que vivem, o profissional que não se adequa à nova realidade, tanto do mercado quanto da empresa em que trabalha, tende a perder espaço para aqueles que conseguem mudar hábitos, pensamentos e atitudes para se transformarem de acordo com o novo ambiente.
Essa exigência de adaptação às circunstâncias é mandada especialmente de indivíduos em cargos de liderança, pois é preciso reagir de forma adequada aos imprevistos que possam surgir pelo caminho, como uma mudança de diretriz na forma de atuação da companhia ou uma crise econômica, por exemplo.
O indivíduo que tem maior capacidade de se adequar a uma nova situação, circunstância ou necessidade exigida pelo mercado de trabalho ou pela empresa em que atua, tem maior chance de crescer profissionalmente e consolidar sua carreira naquela companhia.
Essa habilidade de se adequar ao que é novo, especialmente aos desafios que surgem repentinamente, chama-se adaptabilidade, qualidade muito valorizada nos dias atuais, principalmente num mundo em constante mudança como o nosso.
Dificilmente uma pessoa conseguirá passar por toda sua carreira sem, ao menos uma vez, precisar conviver com algum tipo de mudança, seja tecnológica, de conceito ou mesmo de perspectivas profissionais. Diante de algo inesperado como o covid 19, o indivíduo pode negar a novidade e criticá-la numa tentativa de alterar aquela situação para que volte a ser como antes, fugir para evitar o esforço de adaptação ou o confronto com o novo, passar a vida reclamando dessa nova condição, sem ao menos tentar se adequar a ela ou procurar o ponto positivo daquela nova experiência, ou simplesmente adaptar-se da melhor forma possível à nova circunstância e conquistar novos conhecimentos e bons proveitos de um novo caminho.
O principal empecilho que vejo em líderes não serem adaptáveis no nível que contextos requerem é uma baixa autocrítica. Muitos líderes estão seguros de suas posições por fatores de estabilidade financeira, apoio superior, domínio técnico que coloca a empresa refem do seu conhecimento ou mesmo uma reputação social forte. Isso leva alguns a terem baixíssima autocrítica e não permitirem críticas.
Por mais experiência e conhecimento que alguém tenha sobre uma atividade ou área específica, sempre haverá um ponto que se possa melhorar ou uma qualidade em que é preciso investir esforço em sua melhoria. Avaliar-se de tempos em tempos, e procurar ouvir as sugestões de melhorias que seus colegas ou gestor podem lhe oferecer, é interessante para o desenvolvimento contínuo e o crescimento profissional. Por isso o upskilling e o reskilling são tão importantes para as novas adaptações.
Liderança adaptativa começa pela capacidade de ler contextos e traduzi-los sem apego a absolutamente nada que represente vontades, identificações, sucessos e história.
É a capacidade demonstrada de desfazer coisas, mudar, transformar, abdicar e enfrentar o que precisa ser enfrentado para fazer simplesmente o que precisa ser feito.
Pensando nesse desafio cotidiano dos gestores na busca pela adequação a um novo mundo e ao desenvolvimento de novas estratégias para superar as dificuldades, os consultores em liderança Ronald Heifetz, Alexander Grashow e Marty Linsky desenvolveram o conceito da liderança adaptativa, em que os líderes devem abdicar de métodos ultrapassados de lidar com mudanças e buscar novas maneiras, através de um conjunto de práticas e de estratégias, de enfrentar e de orientar empresas e equipes para adequação a uma nova realidade.
O grande desafio dos líderes adaptativos será conseguir traduzir a estratégia em execução e para isso o fator crítico de sucesso é a cultura. Nunca foi tão importante entender o comportamento coletivo e como as pessoas respondem às coisas. Saber ler a cultura organizacional é crítico para adaptar a estratégia aos desafios das rotinas e comportamentos do dia-a-dia.
Louis Burlamaqui é Ceo da Jazzer Consulting
Especialistas em gestão, cultura organizacional, assessment em cultura e estratégia de desenvolvimento de líderes
Gerente de loja Atacado e varejo
4 aRealmente. Faz muito sentido. Adaptar a cultura da empresa é muito importante . Cada empresa está em evolução e identificar o nível em que ela se encontra é fundamental para um novo lider. Principalmente àquele que migrou de empresa mais desenvolvida. Para exemplificar numa cultura operacional. Iniciando processos de gestão, carecendo de ferramentas fundamentais, exigirá do lider que chegou com experiências e niveis de gestao mais avançado, paciência, para se adaptar e se desenvolver junto com a nova empresa.