Comunicação e Posicionamento de marca em Tempos de Crise

Comunicação e Posicionamento de marca em Tempos de Crise

Como as redes Outback e Madero têm se comportado durante a pandemia de COVID-19 e como isso pode impactar no interesse do público por suas marcas

Recentemente, li um artigo da Rocket Content sobre a importância do posicionamento de marca na era do consumo consciente. Sem me aprofundar muito, o artigo trazia informações sobre a evolução dos hábitos de consumo, em escala mundial, e como o consumo consciente, em suas mais diversas formas, vem se tornando um imperativo nesse cenário. Para entender melhor o que seria esse consumo consciente, a Akatu - ONG sem fins lucrativos que trabalha pela conscientização e mobilização da sociedade para o consumo consciente - explica:

(Consumo consciente) Significa ter a visão de que o ato de consumir um produto ou serviço está num contexto maior de ciclo de produção, trazendo consequências positivas e negativas não apenas ao consumidor, mas também ao meio ambiente, à economia e à sociedade, que vão além dos impactos imediatos.

Em outras palavras, o artigo explicita que o consumidor está mais atento ao mundo à sua volta e prioriza um consumo com impacto positivo tanto social, como ecológico e econômico.

Fechando mais o cenário: Segundo pesquisa feita pela mesma Akatu, em 2012, o comportamento das empresas impacta diretamente na decisão de compra dos consumidores brasileiros e cinco aspectos são mais citados como motivadores de preferência e/ou admiração por determinadas empresas:

  • Não maltratar animais (52%);
  • Ter boas relações com a comunidade (46%);
  • Ter selos de proteção ambiental (46%);
  • Ajudar na redução do consumo de energia (44%);
  • Ter selo de garantia de boas condições de trabalho (43%).

Com esses dados em mente, resolvi analisar como algumas empresas vêm se posicionando em meio à pandemia que estamos imersos e os resultados que tais posicionamentos agregam à marca. Para realização dessa análise, escolhi dois restaurantes do mesmo segmento e muito conhecidos pelo público geral: Outback e Madero.

Por não ter acesso aos balanços de vendas das redes ou quaisquer outros gerenciadores de dados delas, optei pelo Google Trends para iniciar o estudo. Abaixo segue a evolução do interesse do público por semana, pelas duas redes, desde 2018, segunda a ferramenta. É bom ressaltar que o Google Trends avalia o interesse do público pelo termo em uma pontuação de 0 a 100, sendo 0 o menor ponto de interesse do público pelo termo e 100 o maior ponto de interesse.

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Como o gráfico demonstra, após a determinação da quarentena na maior parte do país - fato que se deu a partir do dia 11/03 - o volume de interesse pelas duas marcas diminuiu bastante. No entanto, o termo "madero" alcançou um pico de muito interesse na semana entre os dias 22/03 e 28/03, caindo ainda mais após. Dito isso, devemos analisar dois pontos para tentar entender o que esses dados podem estar dizendo:

1 - O que aconteceu entre os dias 22/03 e 28/03 para que esse pico tenha ocorrido?

2 - Esse comportamento, de queda, diz respeito somente às duas redes ou se aplica à todo o segmento?

Para responder o primeiro questionamento, resolvi consultar os conteúdos mais comentados nas redes, envolvendo o termo “madero”, através da plataforma BuzzSumo. A resposta, como demonstro abaixo, foi que, nesse intervalo de tempo, milhões de interações foram feitas girando em torno de uma declaração, dada pelo fundador da rede de restaurantes, a respeito do impacto da COVID-19 na economia: "Não podemos parar por 5 mil que vão morrer". Vale ressaltar que o BuzzSumo organiza as publicações em destaque de acordo com o engajamento total da mesma. Não necessariamente uma publicação com muito engajamento, compartilhada em uma rede, foi compartilhada em outra também.

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Tal declaração gerou um buzz bem negativo nas redes sociais, o que obrigou o dono da rede a se desculpar publicamente.

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Por fim, como o gráfico - compartilhado mais acima - demonstra as taxas de interesse com base nas pesquisas realizadas no Google, o volume de interações em outras redes nos ajuda a entender o cenário em que o pico ocorreu e justificá-lo com fundamento. Com isso, chegamos à primeira resposta.

O segundo desafio é entender se a queda demonstrada foi um efeito gerado pela pandemia em todo o segmento de mercado ou somente Madero e Outback foram prejudicados. Para isso, voltei ao Google Trends e construí mais um gráfico, esse mais generalista, analisando a evolução do interesse pelo termo "steakhouse" - gênero de restaurantes ao qual as duas redes pertencem. Tal gráfico, por sua vez, demonstrarei mais ao fim dessa análise.

Analisando, primeiramente, o desempenho entre o interesse pelo termo “madero” versus o interesse pelo termo “outback”, desde 2016, pode-se observar, conforme demonstrado nas tabelas abaixo, que ambos costumam apresentar uma média de interesse mais baixa no primeiro trimestre do ano, crescendo a partir de então.

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Pode-se perceber, também, que o primeiro trimestre de 2020 vinha se destacando como o melhor primeiro trimestre dos últimos 5 anos. A diferença entre a evolução de ambos se deu, justamente, no mês de março, onde os números de “outback” começaram a cair, enquanto os de “madero” alcançaram um pico jamais demonstrado no mês - fato que já elucidamos. (Obs: Na tabela, a taxa de interesse demonstrada em março de 2020, para Madero, foi destacada em verde, no entanto, não tem nenhuma relação com um possível caráter positivo do número. Como sabemos, naquele caso, tal taxa representa um fator bem negativo).

Prosseguindo, voltaremos ao gráfico inicial, destacando as semanas em que a quarentena já havia sido decretada:

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Excluindo a semana em que o pico ocorreu e olhando para as semanas que antecederam esse acontecimento, pode-se perceber que as taxas de interesse por “madero” e “outback” vinham em queda gradativa desde o início da quarentena:

Queda “madero” no início da quarentena: 50%.

Queda “outback” no início da quarentena: 41%.

Já virando o olhar para as semanas seguintes ao pico, fica nítido que o interesse pelo termo “outback” mostrou um crescimento (+5% entre a última e a penúltima semana de abril) - o que freou seu índice de queda total, ao final de abril - enquanto “madero” continuou seu viés decrescente, o que aprofundou ainda mais a queda total em relação ao começo da quarentena. (-23% entre a última e a penúltima semana de abril).

 Queda “madero” do início da quarentena ao final de abril: 69%.

Queda “outback” do início da quarentena ao final de abril: 43%.

Analisando somente o interesse pelo termo “steakhouse”, percebe-se que o mesmo, assim como “outback”, também apresentou um viés de crescimento terminando a última semana com um índice 22% maior do que a semana anterior.

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Caminhando para o fim, o que esse números nos comunicam?

Eles nos mostram que, durante a quarentena, o interesse pelos restaurantes do gênero Steakhouse caiu. No entanto, a rede Outback está demonstrando conseguir se recuperar enquanto a rede Madero não parece seguir o mesmo caminho.

A declaração, feita pelo fundador da Madero, mencionada anteriormente, é o fator causador dos números negativos demonstrados pela empresa?

Somente com os dados do Google Trends e do Buzzsumo, seria arriscado e ingênuo apostar 100% nessa afirmação. Contudo, eles demonstram que, durante um período de tempo, uma informação negativa foi associada à empresa, com grande repercussão nas redes sociais. Somando essa grande repercussão, com os números apresentados após a mesma, podemos afirmar, sim, que ela teve impacto negativo e contribuiu para os números demonstrados. Em tempo, seguem os conteúdos com maior número de interações nas redes envolvendo o termo “outback”, no mesmo período de tempo, para demonstrar o outro lado da moeda. Diferente, né?

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Em tempos de crise, a atenção e o cuidado com a comunicação e o posicionamento da marca devem ser redobrados. Em períodos como o da atual pandemia, esse zelo tem de ser ainda maior. Segundo dados do projeto IX.br - pertencente ao Comitê Gestor da Internet - durante a quarentena, em função da COVID-19, o consumo de internet no Brasil se elevou, chegando ao pico histórico de 11 Tb/s. Com um número maior de pessoas em isolamento social, era de se esperar que o tempo dispensado online aumentasse. Nesse cenário, qualquer deslize ou equívoco pode ter um impacto e reverberação muito mais amplificados do que o normal, gerando resultados bem negativos. Tais resultados podem até não significar o fim de uma marca, mas, como vimos nessa análise, podem atrasar e gerar uma grande dor de cabeça para a recuperação da mesma.


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