A Coragem para Desagradar: A inconveniência de conviver no mundo corporativo.
A primeira vez que assumi um cargo de liderança eu ainda era um adolescente. E naquela época tudo que eu pensava era que uma boa liderança se resumia a ter empatia, carisma e dizer que estava tudo bem. Era difícil na minha sociedade da época se posicionar. Era mais conveniente conviver com um mundo do “deixa disso”. Por alguma razão isso me incomodava, mas como indivíduo ainda em formação, era mais simples continuar a viver em turma do que arriscar-se à rejeição.
A faculdade de Direito trouxe formação sólida, política, social, ideológica e com isso os primeiros dissabores ocorreram. Em parte, porque em escolas públicas, se você professa ideologias contrárias à massa, há uma espécie de falsa aceitação, quase flertando com a hipocrisia de aceitar somente aquilo que é conveniente.
E é bastante difícil conviver nessa esfera de intelectualidade, pois os argumentos e fatos são razoavelmente bons e aceitáveis. E embora você tenha posição antagônica é preciso argumentar muito bem para conseguir defender seu ponto de vista.
Por outro lado, não era isso que me incomodava. Debates intelectuais, efusivos ou não, sempre me atraíram.
Era o tipo de coisa pela qual sentia que havia sangue nas veias, pois as pessoas defendiam seus pontos de vista sobre algo que lhes parecia verdade, tal qual era a minha. Em alguns momentos mais, outros menos acalorados, mas respeitando o oponente com o melhor dos respeitos: - o intelectual.
É uma espécie de prazer que tem sido abandonado hoje em dia ou substituído por uma sanha para alcançar pequenos poderes ou vantagens pessoais.
Continuando, mais tarde, surgiu o mundo corporativo, com seus interesses pessoais, disputas de cargos gerenciais e a difícil arte de lidar com egos inflados.
Todos nós temos um ego a zelar e ao mesmo tempo afogá-lo. E é natural de qualquer humano que pedir valor aos seus predicados e apagar os defeitos numa zeladoria do entendimento do que é mais moral e ético em sua perspectiva.
Este texto é aquele que gera uma certa angústia e sentimentos de incômodo porque somos um pedaço dele.
Mas para além de agradar ao leitor, penso que o objetivo é apresentar reflexão sobre a tirania do agrado.
É interessante como é sedutor aos profissionais experientes e gestores uma certa capacidade de determinar os destinos alheios, seja através da ponta de caneta em cima de um papel, seja apresentando voz ativa, ou no fraterno abraço que oferecem.
E neste viés de agradar a tudo e a todos, certa fraternidade disfarçada, surge o dilema das atitudes: passividade, omissão e negligência do pensamento.
E se você observar bem atento, perceberá que todos estamos adormecidos ou simplesmente vivendo dentro de uma bolha prestes a estourar.
É como se os profissionais tivessem suas almas e percepções sugadas em prol de agradar aos outros, quando em verdade, discordam.
E quem disse que é errado discordar? Quando é que nos roubaram a sensibilidade de opor e sequestraram o nosso direito de expressão genuíno?
Eu vejo gente incomodada, quase explodindo porque não sabe como será a reação do outro. Querem expressar, mas se sabotam. É nítido que andam amordaçadas, amedrontadas.
E isso não é sobre o chefe, o cliente, ou o funcionário. É sobre como estamos convivendo. Tem a ver sobre o que irão pensar sobre você e suas formas de expressão. É quase que um sequestro da identidade do ser humano, suas emoções e razões.
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E a pior parte vem a seguir: - Sequestraram a essência humana e depois nos venderam que este tipo de anestesia é uma espécie de inteligência emocional.
Há que se fazer uma ressalva.
A inteligência emocional é um fator imprescindível. Nada contra relações funcionais.
É prudente que sejam.
No entanto, quando somos tolhidos à expressão advinda de nossa essência, do vigor do que cremos, o furto é nosso. O furto à essência é a pior violência que você comente contra você e com a intolerância da sociedade pelos diferentes.
E aqui entra a principal questão: - O quão corajoso você está para desagradar? Eu não estou falando de tornar-se um paladino dos direitos da expressão, da essência.
E não reputo como padrão de sanidade, aquele tipo de reclamão (chato) que se apropria de frases prontas advindas de textos parecidos como este para defender ideias estapafúrdias.
Eu estou falando de pessoas comuns que cansaram de lutar pelo que acreditam pois estão desesperançadas em apresentar seus pontos de vista diferentes, pois ainda que se possa trazer algum ganho verdadeiro, temem uma condenação social, que se tornou uma prática sistêmica e muito vista em ambientes de influenciadores digitais.
Na diplomação dos interesses, é demasiadamente inconveniente ser diferente. Você é esmagado quando decide correr o seu próprio caminho, quando suas relações não se baseiam na carta política e social do grupo ao qual você é membro.
E ao se manifestar, as conclusões são as piores possíveis. Ou fazem chacota de você, indignam-se, criam falácias e todas aquelas estratégias e técnicas de desestabilização do oponente. Talvez nem o saibam que fazem. É questão de sobrevivência adaptar-se ao meio, deixar-se bem quieto no canto da sala, à espreita, de modo que você não incomode ninguém para em momento oportuno, possa receber alguma vantagem ou benefício.
Mas o que é que construímos deste modo? Jogos políticos. Interesses. Negócios. Não construímos relações humanizadas, que vão da passividade ao visceral, da oportunidade ao fracasso e perdemos aquele movimento tão comum quanto a nossa própria respiração. É possível que tenhamos nos tornados marionetes do medo e da inconveniência de desagradar. As nossas defesas se levantaram e os mais poderosos não conseguem mais assistir as ascensões que antes víamos.
Porque para subir a régua é preciso coragem e ousadia, mas a cercania do medo é presente no convívio corporativo e os humanos estão cabisbaixos por regras de etiqueta corporativa que sequestraram o pensamento e a individualidade.
Ao que tudo indica, queremos relações mais humanizadas, mas não toleramos a nossa própria incoerência e falhas.
Estamos mais preocupados em não ter de pedir desculpas do que errar e tolerar os muitos problemas advindos da proposta humana consciente.
É algo que todos podemos refletir. Não se trata de ser bom ou mau. Não se trata de propagar fórmulas mágicas ou identificar os dez maiores, melhores, conceitos. Se trata de ser humano e consciente de que precisamos resgatar o que perdemos: essência e genuinidade.
Diretor Jurídico | Diretor Jurídico e Compliance | Gerente Jurídico e Compliance Sênior | Riscos | Investigações | ESG | LGPD | Governança
10 mGostei dos pontos levantados por vc e adorei conhecer um pouco da sua história. Parabéns pela coragem e sucesso!! Abs.
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1 aComo sempre, um choque de realidade! 👏🏻