“Daqui a cinco anos teremos um sistema financeiro e um sistema de pagamentos muito diferentes”, diz Raul Moreira

“Daqui a cinco anos teremos um sistema financeiro e um sistema de pagamentos muito diferentes”, diz Raul Moreira

Matéria originalmente publicada no Flash CardMonitor, edição de 20 a 27 de julho de 2020

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O Banco Original, um dos pioneiros nos testes de implementação do Pix - sistema de pagamentos instantâneos do Banco Central -, acredita que a nova modalidade acarretará em novos negócios e em mudanças evolutivas no sistema financeiro e de pagamentos. Apesar de vislumbrar uma série de mudanças, o diretor-executivo de TI, Produtos, Open Banking e Operações do Banco Original, Raul Moreira, vê o Pix como complementar ao cartão de crédito. O executivo participou de “live” do Varejo Summit 2020. Confira os principais trechos a seguir: 

Cenário favorável ao Pix

Estamos vendo uma mudança comportamental dos consumidores, buscando soluções digitais de uma forma mais intensa. Obviamente, isso se intensificou muito a partir do contexto da pandemia. Mas, vemos três vertentes muito importantes: regulamentação cada vez mais propensa a você montar plataformas digitais e ampliar a competitividade dessas plataformas junto ao mercado; a evolução da tecnologia permitindo que você consiga fazer esse desenvolvimento e a implantação de novos produtos e serviços digitais de uma forma mais rápida; e, por fim, o comportamento do consumidor, que demonstra estar cada vez mais propenso e confiante na utilização de soluções digitais, seja em meios de pagamentos, bancos digitais ou plataformas de ecommerce. 

O varejo já entendeu as possibilidades do Pix?

Todos nós ainda precisamos fazer uma reflexão sobre a profundidade do que isso vai trazer e como os pagamentos instantâneos vão impactar no comportamento dos consumidores de uma forma geral. Ele vem fortemente para implantar o conceito da instantaneidade. E o que isso pode acarretar em termos de mudanças comportamentais na relação entre pessoas e na relação do consumo dessas pessoas com o comércio é a grande discussão que nós temos que fazer. Eu tenho a percepção que essa discussão não foi profunda o suficiente.

O que vem pra mesa com o Pix?

Mudanças comportamentais em vários aspectos, como por exemplo, pessoas transferindo dinheiro para outras pessoas de maneira instantânea independentemente com qual banco cada uma se relaciona. Apesar do Brasil possuir um sistema financeiro bastante avançado, nós nunca tivemos essa questão de instantaneidade de forma interoperável no mercado. Acredito que, gradativamente, o Pix vai substituir algumas operações bancárias que os consumidores usam de forma mais intensa, como DOC, TED. Por que você vai esperar que seja processada uma TED ou um DOC, se você pode fazer uma transferência instantânea entre as pessoas? A cobrança bancária também deve sofrer alguns impactos: por que você vai esperar um boleto compensar se pode instantaneamente pagar um fornecedor de um produto ou serviço? O Pix também deve trazer mudanças profundas em relação à atividade comercial. No momento da aquisição de produtos e serviços – virtualmente ou fisicamente - você pode fazer, no conceito do QR Code, débitos instantâneos e utilizar um dispositivo móvel como um instrumento de acesso a essa nova opção de compra. Outro aspecto é a inclusão digital. Na pandemia, assim como as pessoas, os empreendedores e os estabelecimentos que não estavam digitalizados sofreram. E a reboque desse aspecto, dessa necessidade de se trabalhar a inclusão financeira, há a questão do uso intensivo do papel moeda no Brasil. A utilização ainda é muito grande em decorrência de uma população que também está excluída financeiramente e digitalmente. O uso do papel moeda traz uma série de efeitos colaterais, como a questão da segurança, da informalidade. O Pix e os pagamentos instantâneos irão colaborar com a substituição do papel moeda.

O futuro do uso do cartão de crédito

Eu, particularmente, não vejo a questão do uso do cartão de crédito como antagônico ao uso do Pix. Vejo como situações complementares. O acesso ao crédito continuará sendo extremamente relevante. As pessoas precisam de linhas de crédito, de prazo para pagar. O Brasil tem até um benefício muito importante para o consumidor que é a possibilidade de ele parcelar várias vezes aquela determinada compra. A indústria de cartões continua com o seu valor agregado num processo de consumo. Com isso gera-se competição, que é muito bom para todos - desde 2013, estamos vendo um avanço significativo na competição no mercado de meios de pagamentos no Brasil -, e vem o Pix para permitir que naquela situação que o consumidor não precisa de crédito, nem de prazo, tenha a disponibilidade daquele dinheiro, ao invés de ele carregar aquele dinheiro papel moeda, possa utilizar o pagamento instantâneo. Logicamente, isto tem certa convergência com o uso do cartão de débito, que também acredito que continua sendo um instrumento importante, mas vai depender muito do comportamento das pessoas no processo da evolução do Pix no comércio em si. Independentemente da questão se vai usar o cartão de débito ou uma solução do Pix de pagamento instantâneo, o mais importante é que todos ganham: o comércio, a competição, o sistema mais aberto e interoperável. O Brasil precisava dar esse salto. Por traz dessa nova infraestrutura que o Banco Central está criando, que se chama sistema de pagamento instantâneo, será possível desenvolver novos produtos e serviços de meios eletrônicos de pagamento. 

O Pix está sendo bem aceito pelo sistema financeiro?

Eu vejo dois momentos. O primeiro momento teve uma discussão em torno da obrigatoriedade, na qual todas as instituições financeiras teriam que aderir ao Pix. O regulador foi bastante transparente nessa discussão, deu voz para todo mundo ponderar seus aspectos. Depois de definida a regulamentação, vejo um engajamento muito forte das instituições financeiras em usar todo o sistema de pagamento instantâneo a seu favor na prerrogativa de prover um serviço cada vez mais competitivo para seus clientes, proteger essa relação com seus clientes, no bom sentido, e permitir que se coloque uma experiência melhor. Quem vai ganhar o jogo na relação com o cliente é quem prover uma melhor experiência em meios de pagamento a um custo cada vez mais acessível.  

Transformação do ecossistema financeiro

Vejo um novo ecossistema de serviços financeiros no Brasil completamente diferente, evolutivo. Isso não quer dizer que as grandes instituições não tenham capacidade de competir no mercado, muito pelo contrário, elas estão se preparando para esse ambiente. Mas, ao mesmo tempo, você está criando condições favoráveis para novos entrantes, que geram essas novas facilidades, essas novas experiências de relação com o dinheiro. Com a série de evoluções que teremos nos próximos anos, acredito que o sistema financeiro e, principalmente, os ecossistemas de pagamento serão muito diferentes do que são hoje, criando um ecossistema positivo entre fintechs, bancos tradicionais, bancos digitais - todo mundo vai poder competir. Quanto mais a gente promover a inclusão financeira e digital mais aumenta o bolo para que todos possam ganhar com isso e criar um ciclo positivo para os consumidores. Daqui a cinco anos teremos um sistema financeiro e um sistema de pagamentos muito diferentes. 

Comunicação

Se todos nós nos engajarmos na melhoria da comunicação de como essas ferramentas podem ser utilizadas pelo consumidor, o comércio entender profundamente essas mudanças que vão acontecer nas formas de pagamento e nas relações dessas pessoas com o comércio – seja ele digital e físico – haverá um ganha e ganha.


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