De como não fugirmos de nosso destino final
King of Wands, Tarot Card.

De como não fugirmos de nosso destino final

I - O rei de paus e a inverdade

Sempre aprendi nos livros e nas entrelinhas das palavras e silêncios do meu pai que a verdade é o nosso destino final. Hoje, no entanto, vivemos sob um bombardeio de informações e notícias e muitas delas são falsas, manipuladas, reproduzidas mescladas com inverdades deliberadas para atingir determinado fim. E a verdade se dissolve, desaparece.

A condenação veemente da prática do falso discurso e do abuso de poder são preocupações temáticas que deveriam ser refletidas antes mesmo de iniciarmos qualquer atividade nesse momento tão delicado [e assombroso] que vive o País. Eu mesma, algumas vezes, fui obrigada a rever postagens que recebi, algumas eu repliquei, num primeiro momento acreditando estar fazendo bem o papel de disseminar informação. Uma vez eu tive que tentar reparar um pouco o erro e retratei-me com todos que receberam de mim a informação [meio verdadeira, meio falsa]. Minha sorte é que, no caso, nada era grave demais, pois sempre tomo cuidado. Mas uma parte era falsa. E não é triste que estejamos nesse ponto de engano, se nós, como seres racionais, nos consideramos tão evoluídos tecnológica e humanamente?

A verdade se expressa hoje em rascunhos mal traçados e torna-se manipulável de forma drástica e, pior, torna-se meio-verdade ou inverdade deliberada e replica-se com a velocidade espantosa e implacável das redes. Muitas vezes o erro é irreparável. E mais: as tantas centenas de pessoas que acabam disseminando o falso acreditam na sua veracidade. Enquanto isso, a realidade bruta fora das redes e das teias de informação se agrava, milhares ou dezenas de milhares de pessoas são afetadas e suportam terríveis provações e tormentos enquanto a verdade se torna mentira e a mentira torna a realidade ainda mais bruta e excludente.

E é disso que devemos falar: que, enquanto estamos nas redes, devemos estar atentos ao nosso próprio papel a fim de não prejudicar ainda mais o tecido tão desgastado da nossa realidade. É necessário estarmos cientes dos limites estreitos que ameaçam a nossa democracia, e mais: é preciso cortar os excessos e perceber que há uma desconstrução brutal das instituições democráticas e uma inversão da realidade com fins explícitos de impor pautas [como a corrupção pelo poder validada, a varredura e invisibilidade das atrocidades praticadas todos os dias na forma de decretos e leis, o desmonte de projetos vitais ao País, à ciência e ao bem-estar da população, a obsessão do poder pelo poder etc]. E mais: essas pautas estão passando para um plano simbólico e intocável. O perigo de uma nova forma de "ditar a verdade” está exatamente nisso. E é espúria e assustadora, pois isso vem da cúpula de poder, do palácio do rei.

Muito além da épica indignação necessária a esse momento drástico, no seio do palácio do rei engendram-se essas falseações para desviar o olhar dos súditos e o mau rei siga ditando as novas regras sem ser molestado. Não seria necessária a sumária exposição por todos os brasileiros da repugnante degradação que se está praticando em nosso Estado de direito? Ou ainda, não seria necessária a condenação explícita das manobras estapafúrdias e bem calculadas, feitas para paralisar e confundir a opinião pública enquanto nos bastidores impõe-se a agenda neoliberal e excludente desejada por grupos específicos - os amigos do rei?

Sim, creio que é hora de refletirmos sobre as reais consequências dessa guerra de informações falsas e falas e atos insanos que pipocam e voltam atrás como num tabuleiro de loucos [e isso sem mencionarmos a infâmia das mentiras e dos robôs replicadores], hora de disciplinarmos uma conduta que exponha os escândalos dessas práticas.

Assusta-me, por fim, que um governante siga conferenciando com palavras e atos espúrios e sem nenhuma preocupação com as consequências dessas palavras e atos, e que impere esse silêncio brutal e desolador da maioria. É claro que falo a partir das minhas impressões pessoais, mas é inegável que diante de denúncias graves e da realidade tosca e falseada, habilmente entalhada para um propósito explícito de manipulação, fica às claras o que é esse grupo no poder, sua falta de ética e total desrespeito pelas instituições e leis, e não pode ser possível que o conjunto da sociedade permaneça em silêncio ou na letargia.

É preciso agir agora, ou pereceremos todos, ainda que no final da partida caia o rei de paus. Afinal, o panorama é bem mais vasto do que as nossas frágeis fronteiras e há outros jogadores disputando os tabuleiros e mesas de jogos. É preciso aproveitar as réstias de luz da lua antes que as sombras nos ceguem e não possamos ver o caminho das pedras.


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