Engajamento pleno dos funcionários no processo de solução de problemas em implantações e manutenções de Lean
Neste artigo analisarei a importância do engajamento dos funcionários no processo de solução de problemas em implantações ou manutenções do Lean, assim como farei uma simples proposta de abordagens a serem feitas durante o processo de orientação dos mesmos na solução dos problemas, com consequente aumento da competitividade do negócio.
Iniciarei com uma possível definição de Lean (orinda do propósito e do DNA da Toyota) e sua relação com o desenvolvimento dos funcionários, destacando o engajamento dos mesmos como fator crítico de sucesso para implantações e manutenções do Lean.
Analisarei os diferentes motivadores humanos, focando naqueles que garantem engajamento pleno dos funcionários.
Finalmente discorrerei sobre como venho utilizando tais motivadores para engajar as pessoas no processo de solução de problemas para satisfação das mesmas e aumento da competitividade do negócio, formatando então uma proposta para tal fim.
Propósito e DNA organizacionais da Toyota
Uma das características da Toyota que mais me fascina é seu propósito:
"Prosperidade mútua de longo prazo por meio da produção de produtos de alta qualidade e baixos custos e dentro do prazo."¹
Essa prosperidade mútua de longo prazo refere-se ao atingimento dos objetivos organizacionais e da satisfação dos funcionários por meio de seus esforços conjuntos e contínuos de solução de problemas e melhoria contínua.
Outra característica trazida por Jeffrey Liker e Michael Hoseus² no livro "A Cultura Toyota: a alma do modelo Toyota" é a relação entre um conceito muito interessante chamado fluxo de valor de pessoas com o já conhecido conceito de fluxo de valor de produto. Neste, a agregação de valor se dá ao transformar os insumos ou informações no produto ou serviço que o cliente deseja, desde o conceito do produto ou serviço até a entrega ao cliente. Já no fluxo de valor de pessoas, o valor é agregado nos momentos em que as pessoas aprendem e são desafiadas, desde o processo seletivo até fim da relação das mesmas com a empresa. Os autores concluem que:
O fluxo de valor de produto e o fluxo de valor de pessoas são o DNA organizacional da Toyota e a solução de problemas é o código que conecta tal DNA.
Do propósito e DNA organizacionais da Toyota descritos acima, retiro uma possível definição de Lean:
Desenvolver continuamente os funcionários no que desejam através da solução de problemas que impedem o aumento da competitividade do negócio.
E caso a empresa ofereça algum desenvolvimento contínuo aos funcionários, mas não aquele desejado por eles? É possível implantar ou manter o Lean de forma sustentável onde este aspecto é predominante? Ao meu ver, a resposta é NÃO, pois aquilo que não é desejado por alguém, não o engaja de forma plena. Sendo assim, acredito que:
O engajamento pleno dos funcionários no processo de solução de problemas se dá na medida em que se desenvolvem no que desejam durante este processo. Este engajamento é fator crítico de sucesso em qualquer implantação ou manutenção do Lean.
Mas como garantir esse engajamento? Como alinhar o desenvolvimento contínuo desejado à solução dos problemas que impedem o aumento da competitividade do negócio? Antes de responder estas questões, torna-se necessário compreender o que realmente engaja de forma sustentável as pessoas.
Engajamento
Há inúmeros motivadores utilizados para as pessoas se engajarem em alguma atividade, desde os extrínsicos em forma de recompensas e punições (dinheiro, advertências, etc), até os intrínsicos mais voltados para a autorealização (liberdade, desafio, propósito, etc).
Uma vez que as condições de dignidade humana já foram atendidas (salário razoável, segurança, saúde, etc), os motivadores extrínsicos trazem um engajamento apenas temporário e, algumas vezes, até trazem efeitos contrários, como no caso de após haver durante um tempo uma forma de reconhecimento em dinheiro, esta não poder ser retirada ou somente reduzida sem causar diminuição do engajamento das pessoas.
Já os motivadores intrínsicos comparados aos extrínsicos, segundo Daniel Pink³, são melhores no longo prazo, pois são naturalmente buscados pelas pessoas para sua auto-realização; são um "combustível renovável", como se os extrínsicos fossem carvão (finito e prejudicial) e os intrínsicos o sol; e promovem o bem-estar físico e mental, já que ajudam nas relações interpessoais e na auto-estima.
O autor descreve três elementos que podem ser utilizados como motivadores intrínsicos:
- Autonomia - a atuação com a possibilidade escolher o que fazer, quando fazer, como fazer e com quem fazer (tarefa, tempo, técnica e time);
- Maestria - o desejo de tornar-se cada vez melhor em algo que importa;
- Propósito - o serviço por uma causa maior que nós mesmos.
Tracy Maylett⁴ complementa a lista com:
- Impacto - a visualização de efeitos e resultados positivos, efetivos e úteis de seu trabalho;
- Conexão - o senso de pertencer a algo além de si mesmo.
AUTONOMIA | MAESTRIA | PROPÓSITO
IMPACTO | CONEXÃO
Estes cinco elementos não somente podem e devem ser utilizados como motivadores intrínsicos, mas são principalmente as chaves que trazem à tona o potencial gigantesto já existente e disponível nos funcionários das organizações.
Mas como utilizá-los para garantir o engajamento dos funcionários no que desejam ser desenvolvidos?
Engajando funcionários em seu próprio desenvolvimento
Em seu livro "The Coaching Habit: say less, ask more & change the way you lead forever", o autor Michael Stanier⁵ sugere uma lista de perguntas para uma abordagem de coaching entre uma pessoa e outra. Uma destas perguntas me chamou muito a atenção: "O que você quer?" O objetivo desta pergunta é justamente descobrir quais dos três primeiros elementos descritos anteriormente mais motivam a pessoa em um determinado assunto ou situação.
Passei a fazê-la para todos meus coachees em Lean no início de seus projetos de solução de problema ou de melhoria da seguinte forma:
O que você quer neste projeto?
Como o próprio autor do livro menciona, as respostas nas primeiras vezes eram superficiais e não se relacionavam ao desejo real e mais profundo da pessoa: "quero melhorar este indicador", "quero ajudar a empresa a ser mais competitiva", "quero fazer o que meu chefe me pediu". O autor então sugere aprofundar modificando um pouco a pergunta e fazendo-a novamente logo após a primeira resposta:
O que você, fulano, realmente quer neste projeto?
Neste momento a pessoa para... reflete... e responde com algo no sentido dos três primeiros elementos acima: "quero ir além do que já faço" na direção de autonomia, "quero aprender mais sobre este tema" na direção de maestria, "quero ajudar meus colegas a não perderem seus empregos com um possível corte para redução de custos" na direção de propósito.
Com esta resposta em mente, passo a aplicar todo o processo de coaching em Lean não somente abordando seu aspecto técnico com ferramentas e metodologias, mas também o aspecto humano de desenvolvimento profissional direcionado ao que a pessoa deseja para si mesma.
Ao longo do processo, utilizo os dois elementos restantes. O elemento Impacto serve como uma retroalimentação, uma confirmação para o coachee de que ele está atingindo não somente os resultados do projeto, mas PRINCIPALMENTE seu próprio desenvolvimento. Essa confirmação feita de tempos em tempos o mantém engajado ao longo do projeto, enfrentando as dificuldades e os desafios com maior resiliência e perseverança. É um verdadeiro combustível que mantém acesa sua busca pelo que deseja.
O elemento Conexão, por sua vez, serve como uma base de sustentação, na medida em que o coachee sabe que todos solucionadores de problema na empresa passam pelo mesmo processo e, consequentemente, estão desenvolvendo-se continuamente solucionando os problemas que impedem o aumento da competitividade do negócio. Em outras palavras, a realização da prosperidade mútua de longo prazo do propósito da Toyota.
Alinhando o desenvolvimento dos funcionários ao aumento da competitividade do negócio
Para aumentar a competitividade de um negócio, a solução dos problemas e vencer os obstáculos que se colocam à frente são fundamentais. No Lean esse processo é chamado de kaizen e uma das mais importantes ferramentas é o chamado Hōshin Kanri (um sistema de planejamento e execução da estratégia). Pascal Dennis⁶ o descreve como um sistema humano, no qual não se impõe, mas se faz perguntas... não se comanda, mas se engaja os membros da equipe.
É justamente neste sistema que se alinha o desenvolvimento dos funcionários ao aumento da competitividade do negócio. Ao longo do processo de planejamento, muitas negociações e alinhamentos de metas e iniciativas são feitos entre os níveis hierárquicos e entre os pares, momento em que, a meu ver, é perfeito para se perguntar "o que você quer neste projeto?" na busca do que engaja o funcionário naquele assunto ou situação.
Caso sua empresa não aplique este processo de desdobramento da estratégia, outros momentos oportunos para alinhar o desenvolvimento dos funcionários no que desejam ao aumento da competitividade do negócio são o de alocação de qualquer trabalho novo e o de algum feedback dos trabalhos já existentes. Basta fazer a pergunta para descobrir quais dos três primeiros elementos mais engaja o funcionário e aplicar os dois elementos restantes no dia-a-dia.
Conclusão
Para se obter o engajamento pleno dos funcionários no processo de solução de problemas em implantações ou mesmo na manutenção do Lean, deve-se inicialmente descobrir e utilizar o que os realmente motiva de forma duradoura e demonstrar continuamente que o que desejam está de fato sendo alcançado.
Finalizo com uma pergunta para reflexão: quais seriam as possíveis mensagens que a Toyota coloca para seus funcionários ao definir como slogan de patrocínio das Olimpíadas e Para-olimpídas a frase "Start Your Impossible"?
Segue um video promocional com o slogan:
- Liker, Hoseus. "A Cultura Toyota: a alma do modelo Toyota", Porto Alegre: Bookman, 2009, p. 79.
- Liker, Hoseus. "A Cultura Toyota: a alma do modelo Toyota", Porto Alegre: Bookman, 2009, p. 66.
- Pink. "Drive: the surprising truth about what motivates us", Nova Iorque: Riverhead Books, 2009.
- Maylett. "Engagement MAGIC: five keys for engaging people, leaders, and organizations", Austin: Greenleaf Book Group Press, 2014.
- Stanier. "The Coaching Habit: say less, ask more & change the way you lead forever", Toronto: Box of Crayons Press, 2016.
- Dennis. "Fazendo Acontecer a Coisa Certa", São Paulo: Lean Institute Brasil, 2007.
Coordenadora de Departamento Pessoal
1 aComo vai Daniel?! Consigo falar com vc?... É importante!!!
Gerente de Projetos Lean | Gerente de Processos | Melhoria Contínua | IA Generativa | RPA | Phyton | Industrial I Operações
4 aComo vai Daniel Madazio Rahal Farhat? Gostei do seu artigo, parabéns!!!
Confiabilidade | Manutenção | Gestão de Ativos | Engenharia | Projetos
5 aDaniel excelente abordagem sobre o assunto.