Manifesto de uma repórter-empresária

Manifesto de uma repórter-empresária

Quando eu era repórter de revista, passava boa parte das minhas horas correndo atrás de potenciais entrevistados. Vivia tentando marcar não apenas conversas formais, mas também cafés e almoços em busca de novos temas a explorar. Era comum que as pessoas propusessem que os encontros fossem marcados para dali a três semanas, um mês ou até mais. Aquilo sempre me soava como pouco caso. Está certo que o interesse era meu, o que me fazia aceitar as condições impostas, mas não passava pela minha cabeça que o meu entrevistado pudesse estar simplesmente ocupado demais. “Quem não tem meia hora?”, pensava.

Em janeiro de 2016, mudei de lado sem deixar de ser o que sempre fui. Ainda sou repórter, mas agora também empresária. Criei o Atelier de Conteúdo para seguir fazendo o jornalismo em que acredito. O jornalismo que exige que me infiltre em conversas e assuntos aos quais não fui chamada. O fato de ter aberto uma empresa me aproximou mais do meu público-empresário – que hoje, além de leitores, são a maioria dos clientes.

Logo nos primeiros meses tocando meu negócio, a ficha caiu. Dentro do aprendizado de como gerir o tempo na minha nova rotina – em que eu era não só a repórter, mas também o administrativo, o comercial etc. –, me vi tendo de aprender a marcar compromissos para dali a três semanas, um mês e, dependendo da fase, até mais.

“Nem tudo o que é importante é urgente. Primeiro, preciso fazer o que é urgente, ainda que muitas coisas importantes tenham de esperar”

Entendi, enfim, a frase que me disse certa vez um entrevistado que virou cliente: “Nem tudo o que é importante é urgente. Primeiro, preciso fazer o que é urgente, ainda que muitas coisas importantes tenham de esperar”. Até então, tudo me parecia importante e urgente. Entender a diferença entre essas palavras é amadurecer e exercitar o discernimento – palavra hoje fundamental para tomar decisões no Atelier.

Os novos papéis trouxeram outros desafios e dilemas – mais ou menos complexos. Um deles, que embora não parecesse urgente em um primeiro momento é absolutamente importante, era: como o Atelier vai se comunicar com seu público?

 

Só vendo o que compro

Se somos essencialmente um grupo de jornalistas, produzimos conteúdo para clientes e escrevemos para veículos tradicionais da imprensa, parecia natural dar as caras publicamente em site, blog, redes sociais. É isso o que vendemos. Para cumprir a máxima que sempre falei em tom de brincadeira, mas com um grande fundo de verdade – “só vendo o que eu compro” –, é preciso deixar claro o que vendemos e compramos no Atelier. Eu, que sempre defendi que o conteúdo genuíno é muito mais poderoso que qualquer marketing exagerado, como boa jornalista precisava provar minha tese.

O dilema residia no fato de que produzir conteúdo com profundidade e qualidade, como sempre fizemos nas redações e para os clientes, exige recursos caros, como o tempo. No início da empresa, com muito trabalho contratado (ao que só agradeço!), não havia como fazer esse investimento. Estávamos na base da pirâmide de Maslow, cuidando ainda da sobrevivência. Por outro lado, fazer um conteúdo meia-boca só para cumprir tabela estava fora de questão. Por motivos óbvios.

Agora, com quase dois anos de existência, com os caminhos clareando, o site entrando no ar e a equipe crescendo, o Atelier não poderia mais ficar calado. Nem falar sobre si mesmo apenas quando inspirado. Era preciso dar um passo além.

Quem ele é, de fato, a despeito do que queira parecer? Quais os seus objetivos de longo prazo?

Foi assim que, durante uma parada para reflexão, prática fundamental para nós, colocamos o assunto na mesa. Qual seria a forma de nos expressarmos publicamente com a qualidade e a honestidade que tanto prezamos sem desviar o foco de nossos clientes?

Marcela, sócia do Atelier, ouviu algumas perguntas sobre o tema e, então, desviou o olhar. Silenciei e assisti à construção de uma ideia dentro da cabeça dela. Internamente ela aplicava ao Atelier o método que aplicamos às marcas para as quais produzimos conteúdo. Perguntava-se: o que de mais genuíno o Atelier tem para contar? Quem ele é, de fato, a despeito do que queira parecer? Quais os seus objetivos de longo prazo?

Havíamos acabado de discutir todas essas perguntas ao longo de um dia inteiro. Foi o que um cliente nos sugeriu fazer após saber que faríamos essa pausa para reflexão. Seguimos a sugestão à risca, afinal, tratava-se de um especialista em governança corporativa de algumas das mais importantes empresas do país.

Depois de alguns segundos de silêncio, Marcela compartilhou o resultado do raciocínio e, juntas, continuamos o brainstorming. Rapidamente, a empolgação transbordava do tom de voz e a coerência, de repente, começou a amarrar ideias antes dispersas. Eram sinais de que havíamos encontrado um caminho. O caminho do Atelier. Era o que precisávamos para dar o primeiro passo.

 

De dentro para fora

Falar de nossos desafios, descobertas, dilemas, conquistas nunca soou tão apropriado. Se o que sempre buscamos foi nos infiltrar entre os protagonistas dos universos sobre os quais discorremos, o que poderia ser melhor do que aproveitar o fato de agora termos passagem livre nesses ambientes, lembrando sempre o compromisso fundamental de não nos confundirmos com ele?

E assim começa oficialmente a comunicação pública do Atelier. Este é o primeiro de uma série de textos, que serão escritos por cada um da nossa equipe, sobre os bastidores do nosso dia a dia que, na prática, nada mais são do que o dia a dia de outras empresas. E, claro, cheios de perguntas, lições, insights que valem a pena ser compartilhados.

Muitas vezes, os fatos em si estarão como pano de fundo, como gatilhos para a busca de conhecimento em outras fontes. Afinal, é basicamente esse o nosso trabalho. Conectar pessoas e empresas a informações e ideias que as façam se expressar melhor dentro daquilo que já são por natureza.

O que temos de melhor para mostrar não são os nossos próprios olhos. Mas, sim, o que enxergamos a partir deles.



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