Nosso amor ao risco
São Paulo, 11 de julho de 2022.
As curvas de taxas de juros estão em backwardation, nome utilizado pelo mercado financeiro para indicar que as taxas para aplicação de longo prazo estão mais baratas que as de curto prazo. Isso vai contra o senso comum, afinal, quanto mais prazo, maior é o risco e maior deveria ser o prêmio.
Na tabela ao lado, os títulos de renda fixa com vencimento em outubro de 2023 estão com taxa de juros de 14%, ao passo que a taxa para títulos vincendos em janeiro de 2037 está a 11,8%.
Normalmente, uma curva em backwardation indica recessão. Contudo, muito dessa expectativa quanto a recessão já está precificada nas taxas a algum tempo.
As taxas de juros negociadas ‘spot’ estão se elevando porque o Banco Central Brasileiro está com dificuldade de se financiar e por isso tem que oferecer taxas mais atrativas ao investidor estrangeiro e institucional, pagando mais com o dinheiro do contribuinte. Os leilões de títulos do BC não estão conseguindo vender tudo.
Na tabela, vemos que no primeiro trimestre, o fluxo de investidor estrangeiro, em busca de taxa de juros, foi revertido, e está deixando o Brasil, mesmo com essas taxas!!!!
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Qual a lógica por trás disso? Duas palavrinhas muito conhecidas: “populismo eleitoral”. A reversão do fluxo de entrada de investidores estrangeiros começou com a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) dos combustíveis, que virou PEC da urgência, desespero, bondade etc. e não dá nem para acompanhar.
O racional é bem simples e está no manual básico de todo investidor: “Será que o prêmio vale o risco? “Aparentemente, o investidor estrangeiro acha que não. Tanto que, o risco de crédito brasileiro no gráfico abaixo mostra um aumento no risco de abril para hoje de 100 bps (50%), desbalanceando a relação risco-retorno e forçando juros para cima.
Vale mencionar que o risco país reflete uma possibilidade de calote financeiro. Mas se o Brasil possui USD 350 Bi em reservas, por que nosso risco subiria tanto? Simples: o descontrole fiscal, normalmente advindo do populismo de governantes e do grau de instabilidade ou de “surpresas” que o governante pode gerar. Muito ligado a liderança. Venezuela é um exemplo disso.
Aí vem o impacto no dólar. O dólar, depois de cair de 5,80 para 4,80, ajudando o BC a não ter que aumentar mais os juros, está de volta ao patamar de 5,40, pressionando novamente os preços de bens e materiais importados e trazendo mais transtornos às empresas que tem que lidar com esse “exposure.”
Fica claro que o BC está isolado no combate à inflação com sua única ferramenta de taxa de juros mas, a dimensão do problema vai além disso e não é só com taxa de juros que vamos resolver. Mas isso é outra discussão, bem longa.
Com a proximidade das eleições, é importante refletir que tipo de liderança queremos para o Brasil. Ao mesmo tempo, existe um abismo entre nossas opções e a gestão do risco país, como fazemos, de forma profissional, nas empresas.
Por fim, à pedido de um amigo português, peço que não os culpem pelo Brasil ser como é. Pois, já nos deram a independência à 200 anos, e se não resolvemos até hoje, é por incompetência nossa.