O Mapa da Estratégia #3 - Como tornar o propósito de uma marca a sua grande força (e não ficar apenas na frase bonita)
Propósito, essa palavra que você só de ler no título desse texto já deve ter revirado os olhos, é uma das coisas mais importantes para uma marca.
É também uma que 99,9% das vezes é relegada a ser apenas uma frase bonita que fica somente no PowerPoint ou escrita no manual da marca (aqueles livros gigantes de cheio de regras sobre como a marca deve se comportar, o quais raramente alguém lê porque são livros gigantes cheio de regras).
Só quando o propósito se bem utilizado é um ativo estratégico extremamente poderoso para uma marca e também para o negócio. Só que para isso, precisamos ir além da frase em si.
E preciso dizer que esse é um daqueles termos que se você for buscar no Google irá encontrar dez definições diferentes, sem contar as misturas com outros termos, como missão e visão. Então, vamos desconstruir um pouco isso tudo.
Propósito x Missão x Visão
Na prática, é tudo a mesma coisa no final do dia. A literatura clássica de administração irá dizer que não, porém vamos ser sinceros, a maioria das empresas simplesmente define sua missão e visão porque algum livro disse que assim elas precisavam fazer, e por isso saem frases vagas como "Prover valor a todos funcionários, clientes e stakeholders" e "Ser a empresa referência do seu segmento por meio de soluções inovadoras"
Portanto, quanto menos complexidade, melhor. Eu gosto do Propósito porque a palavra é bastante clara no seu significado:
- intenção (de fazer algo); projeto, desígnio.
- aquilo que se busca alcançar; objetivo, finalidade, intuito.
Tanto missão como visão são palavras mais abstratas e subjetivas no seu entendimento, e isso é o que causa tanta confusão sobre os termos. Por isso, eu não só prefiro propósito como incentivo a focar em definir ele e deixar os outros dois de lado.
Para que serve o propósito (mesmo)
Um propósito tem três intuitos:
1) Vender uma ideia que encanta e inspira;
2) Ser a premissa central que rege como a marca se comporta e como a empresa opera;
2) Ser a principal ferramenta para tomada de decisões.
Um exemplo do qual eu gosto muito é o da Amazon:
A Amazon com a frase "ser a empresa mais focada no cliente que existe no mundo" já vende uma ideia que encanta e inspira, afinal, quem não gostaria de trabalhar para uma empresa assim ou ser cliente dela? É uma promessa ousada, admito, mas uma que faz você pensar que se for realizado será algo nunca antes visto. Só que se não for assim, vai ficar morno e tem chances reais de morrer na praia e ser ignorado por todos (óbvio: prometeu, tem que entregar).
E por mais inusitado que pareça, os acionistas foram um dos grupos que mais compraram essa ideia. As cartas para os acionistas que o Jeff Bezos envia anualmente são clássicas porque todas vez ele revende a missão da sua empresa para pessoas que a princípio não seriam os maiores fãs, pois toda lógica do modelo de negócios é focada em crescimento de longo prazo, em máxima geração de valor ao cliente e reinvestimento de todo lucro na empresa, sem distribuição de dividendos.
Se não fosse por esse propósito, e da forma que ele foi articulado, dificilmente o Bezos teria sequer conseguido vender o sonho para seus primeiros acionistas, muito menos chegado no valor de mercado de mais de US$ 1 trilhão.
E isso nos leva ao segundo e terceiro objetivos: ser a premissa que rege tudo e a principal ferramenta para tomada de decisões.
Amazon Prime, protestos e devolver o dinheiro do cliente mesmo que ele não tenha pedido
O Amazon Prime é hoje creditado como o serviço que criou a maior vantagem competitiva da companhia e permitiu ela chegar onde está hoje, mas o serviço correu o risco de falir a Amazon quando foi introduzido em 2004, pois a conta não fechava devido ao custo operacional. Era bem arriscado, a ponto de que quem estava envolvido no projeto ficar preocupado se o Bezos estava perdendo o juízo.
Porém, a ideia do Bezos era de que pessoas estariam dispostas a pagarem uma anuidade para receberem seus produtos mais rapidamente e isso aumentaria o número de clientes, o número de compras e consequentemente, o faturamento. Resumidamente, seria aumentar consideravelmente o nível de serviço e as pessoas recompensariam dando mais dinheiro. No longo prazo, aquilo era a única coisa que fazia sentido ser feita seguindo o objetivo de ser "a empresa mais centrada no cliente que existe no mundo. Fizeram a aposta e o resto é história, afinal, 82% dos lares americanos possuem uma assinatura do Prime atualmente.
Ao mesmo tempo, esse foco obsessivo em atender o cliente a qualquer custo resultou em funcionários de seus depósitos protestando por condições melhores de trabalho no meio da pandemia. E só para deixar claro, dá para ir longe nos exemplos de práticas ruins e a Amazon passa muito longe de ser uma empresa santa, afinal, está sendo investigada pelo Congresso americano por práticas anti-competitivas que podem levar até ao negócio ser dividido ou regulado. Esse é um risco quando se cria uma cultura corporativa entorno de um propósito que se levado ao extremo pode na verdade prejudicar grupos (o que no final irá prejudicar seus clientes).
Independente disso, ter a clareza sobre o que faz a Amazon existir e o que ela almeja alcançar é essencial para que a empresa realize as decisões melhores, com rapidez, e que estejam alinhadas com seu grande objetivo.
No seu atendimento ao cliente isso é onde é mais perceptível. Não sei se você já teve que resolver alguma vez algum problema com a Amazon em relação a um pedido, mas talvez seja o melhor atendimento que eu já vi, junto com o da Apple.
Um exemplo que eu vivi ocorreu anos atrás, quanto o Kindle era algo novo no Brasil e eu tinha acabado de comprar um. Duas semanas depois do lançamento a Amazon decidiu fazer uma promoção, só que eles me mandaram esse e-mail como se eu não tivesse comprado ainda. Eu li e pensei "bom, me ferrei", mas decidi enviar uma mensagem para eles sugerindo uma melhor segmentação no disparo do e-mail marketing, afinal, quem comprou um Kindle que tinha acabado de lançar não precisaria saber que aquele mesmo produto estava agora mais barato.
Bom, passam algumas horas e eu recebo um e-mail do suporte, pedindo desculpas (!) e me reembolsando em R$90 (!), que era o valor do desconto. Detalhe: eu não tinha pedido nada.
É um exemplo bobo, mas aposto que na maioria das empresas isso nunca teria ocorrido e eu teria sido ignorado. Só que lembra do motivo da Amazon existir? Não existe opção dela não fazer o que fez, pois estaria indo contra ao que ela se propõe a fazer.
No final, a Amazon vive seu propósito em tudo que fala e faz. Mire para atuar nesse nível, seja você trabalhando numa empresa ou se estiver na frente do seu próprio negócio. É o motor, o coração da marca e do negócio. É o norte, a ferramenta que vai ajudar a dizer "sim" ou "não" com mais segurança mesmo no momentos difíceis.
Se não for vivido dessa forma, vai ser apenas uma frase bonita num manual de marca, o qual está juntando poeira na estante.
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Toda sexta-feira, aqui no Linkedin, eu publico um artigo sobre estratégia de negócios e marcas. De insights até análises, meu intuito é explicar o que importa e porque importa nesse tema que pode ser muitas vezes complicado e assustador.
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Coordenador de Excelência Organizacional na Libbs
4 aO propósito deveria ser considerado um pilar estratégico de toda e qualquer empresa que almeje atingir seus objetivos no longo prazo, e é muito doloroso para mim ver as pessoas confundindo a estratégia de marca com uma frase bonita na parede. Empresas fortes derivam de uma cultura forte. E uma cultura forte passa por um propósito inspirador e de fácil entendimento. Parabéns pelo texto Marcos!