O que o desempenho do aluno tem a ver com incentivo à leitura e bibliotecas escolares?
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O que o desempenho do aluno tem a ver com incentivo à leitura e bibliotecas escolares?

Quem é da minha geração provavelmente sabe o que é ir até uma biblioteca pública, levando na mala da escola folhas de papel pautado, lápis, borracha e caneta, pesquisar nos livros e produzir longos trabalhos escolares a mão! Ou, simplesmente, sentar e ler mais um capítulo da Coleção Vaga-lume! 

Essa lembrança me veio à mente depois de ter visto a pesquisa Retratos da Leitura – Bibliotecas Escolares, encomendada pelo Instituto Pró Livro - IPL e realizada pelo Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, que apresenta uma realidade bem menos romântica do que a minha sobre estes espaços de aprendizagem. Mais do que analisar o uso das bibliotecas escolares, a pesquisa observa a importância delas no desempenho dos alunos em avaliações oficiais.

No estudo, comparadas a pior e a melhor escola em relação a utilização da biblioteca escolar, o desempenho em Língua Portuguesa, por exemplo, aumenta cinco pontos no Sistema de Avaliação da Educação Básica, o SAEB. Isso representa meio ano de aprendizado entre o 5.º e o 9.º ano!

Ainda assim, o retrato apresentado pelo Censo Escolar de 2017 revela que 61% das Escolas Públicas brasileiras não contam com bibliotecas ou salas de leitura. A maioria delas, 70%, estão no Norte e Nordeste do nosso país. E o quadro fica ainda mais desanimador quando olhamos para as escolas rurais, das quais 84% não apresentam estes espaços. 

Única fonte

A pesquisa Retratos da Leitura – Bibliotecas Escolares aponta, ainda, que para alunos de baixa renda as bibliotecas escolares são a primeira e única fonte de acesso aos livros. Se considerarmos que a família é o principal agente influenciador da leitura na primeira infância, essas bibliotecas são fundamentais para a formação de leitores assíduos e se apresentam como uma segunda chance, para as crianças pertencentes a famílias com menor escolaridade, de desenvolverem o gosto pela leitura. E, como sabemos, entre tantos outros benefícios, a criança que lê escreve melhor, se comunica melhor, argumenta e desenvolve a criatividade, o que reflete no aprendizado como um todo.

Marta Helena de Assis é Bibliotecária há mais de dez anos, sendo os cinco últimos dedicados ao trabalho em bibliotecas de duas escolas particulares de Curitiba. Como profissional da área, ela conhece o grande potencial das bibliotecas escolares no desenvolvimento dos alunos. “A biblioteca escolar permite aos usuários, toda a comunidade escolar, não somente o empréstimo de livros e a promoção da leitura, ela oferece inúmeras possibilidades de desenvolvimento de ações, visando o crescimento informacional, intelectual e social, sobretudo dos alunos”, explica.

Entretanto, a Bibliotecária percebe que há uma defasagem de profissionais preparados para ocupar estes espaços. “Hoje, infelizmente, existe um número reduzido de profissionais bibliotecários atuando em bibliotecas escolares, excetuando-se as privadas”, conta. “A realidade das bibliotecas escolares públicas está muito aquém do que seria o ideal, segue como há muito tempo tem sido, ou seja, espaços precários muitas vezes sob a coordenação de uma professora em vésperas da aposentadoria e que não promove o acesso ao acervo”, diz.

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Neste ponto, a pesquisa Retratos da Leitura – Bibliotecas Escolares mostra que não basta apenas disponibilizar um espaço físico e um acervo - que deve ser de, no mínimo, um livro para cada aluno matriculado - mas, sim, oferecer atividades integradas e orientadas por um currículo, trabalhado por professores que se envolvam em atividades de pesquisa e sejam incentivadores da melhor utilização do espaço. Outro ponto de destaque é a diferença que faz a presença de profissionais especializados, como Bibliotecários e Estagiários, que orientem e despertem o interesse dos alunos pelo espaço de leitura e pelos livros. “Tenho aprendido muito ao longo de cinco anos de experiência no trabalho em bibliotecas escolares e acredito que nosso papel neste espaço passa a ser também o de educador e incentivador no processo de aprendizagem”, afirma Marta.

“É necessário promover um espaço acolhedor e dinâmico aliado a um acervo convidativo e diversificado, adequado ao público que será atendido. Uma biblioteca convidativa que desenvolva atividades variadas e trabalhe em conjunto com a coordenação escolar”, diz a Bibliotecária, reforçando os dados da pesquisa.

Dados paralelos, mas importantes para lembrar quando falamos em escola, livros e bibliotecas, é que de acordo com o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes - PISA, de 2015, dos 70 países avaliados, o Brasil ficou em 59.º lugar no desempenho em Leitura. E que o INAF, indicador de Analfabetismo Funcional, aponta que 27% dos brasileiros são incapazes de compreender textos simples e operações matemáticas. Triste, não é mesmo?

Transformar essa realidade é um trabalho conjunto entre família, escola e poder público. Por isso, é muito importante esse olhar voltado às bibliotecas escolares e seus impactos no rendimento dos estudantes. Esse estudo pode acender um alerta para que as bibliotecas escolares sejam locais mais atrativos, mais frequentados pelos alunos e, principalmente, mais efetivos na construção do conhecimento.  

Naira Passoni

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