O teatro no sistema de gestão
O cenário empresarial atual é marcado por um discurso amplamente disseminado sobre a importância da gestão eficiente. Porém, na prática, muitas empresas se perdem em um verdadeiro teatro, onde o discurso não se traduz em ações concretas e eficazes como é comunicado.
Este artigo explora essa dicotomia entre a teoria e a prática, utilizando o planejamento estratégico como exemplo central para evidenciar como a gestão empresarial muitas vezes se transforma em um espetáculo de aparências.
No mundo dos negócios, muito se vende no campo das aparências e pouco realmente se entrega em termos de resultados reais. Existe uma contracultura que privilegia a aparência sobre a substância, perpetuando um ciclo de ineficiência e decepção.
Muitas empresas, se avaliassem realmente seus desempenhos com um olhar crítico e com a devida seriedade, perceberiam que muito se diz e pouco se entrega de fato, tornando esse tema tão sensível e temeroso diante de muitas equipes e profissionais.
Este falso cenário cria uma ilusão de competência e segurança, enquanto a verdadeira gestão fica relegada ao segundo plano, gerando no futuro impactos de grande monta.
Convido você a deixar de lado seus preconceitos estabelecidos e a refletir conosco nesta jornada de informação e conhecimento.
Vamos juntos desmascarar as aparências e buscar uma gestão verdadeira e eficaz, capaz de transformar suas estratégias em resultados reais e duradouros.
A gestão como espetáculo
A gestão empresarial é frequentemente vendida como a solução para todos os problemas corporativos e realmente eu acredito que ela seja. Termos como "planejamento", "estratégia" e "metas e KPI´s" e outros são usados abundantemente em reuniões e relatórios, criando uma fachada de eficiência, profissionalismo e progresso.
No entanto, a realidade é que poucas empresas realmente implementam um sistema de gestão que funcione de maneira eficaz. Esse falso cenário cria uma ilusão de competência e segurança, enquanto a verdadeira gestão fica relegada ao segundo plano. Importante destacar que isso não acontece por maldade, mas por ignorância. Ignorância, no sentido mais puro da palavra, significa não saber que não se sabe.
E não há nada de errado em dizer "eu não sei". No entanto, no teatro empresarial, a figura do "super-homem" é exaltada, tornando essa possibilidade de se assumir um não saber quase que impossível, perpetuando assim a fábula e a ilusão infantil em que muitos vivem. Essa atitude explica, em grande parte, o baixo índice de produtividade do Brasil, um dos mais baixos do mundo.
A insistência em manter as aparências ao invés de buscar conhecimento e melhorias reais contribui para um cenário onde a ineficiência é mascarada por discursos vazios e práticas ineficazes e um foco exacerbado no curtíssimo prazo e por isso ouvimos tanto a desculpa verdadeira mais pronunciada no teatro da gestão, a falta de tempo.
O Planejamento: Como um exemplo de Teatro
O planejamento estratégico é um dos pilares fundamentais da gestão empresarial. Em tese, ele deveria guiar a empresa em direção a seus objetivos, com um caminho claro e bem definido.
No entanto, o que se vê na prática é que muitas empresas transformam o planejamento em um verdadeiro teatro, pois ao invés de ser acompanhado mês a mês, o planejamento é frequentemente confundido com uma festa ou um evento.
Ele é muitas vezes elaborado com pompa ou de qualquer jeito, mas logo é relegado à gaveta, sem a devida atenção, a não ser no dia em que alguém convoca uma nova reunião ou em que a crise de consciência pega um dos líderes. Esse descaso contínuo resulta em uma falta de acompanhamento e desenvolvimento das atividades planejadas como se deve.
Muitas organizações falham em estabelecer objetivos claros para o período, não traçam desafios realistas e não definem projetos e metas que sejam realmente exequíveis. A ausência de uma metodologia robusta para a elaboração e acompanhamento desses planos é um dos principais motivos pelos quais muitos planejamentos naufragam, principalmente por se tornarem uma grande carta de intenções.
Sem um acompanhamento regular, muitas atividades seguem independentes do que foi tratado no planejamento, resultando em descoordenação e perda de foco. Esse cenário evidencia como o planejamento, quando mal executado e negligenciado, se torna mais um ato teatral do que uma ferramenta de gestão eficaz.
Para quem achar que estou dizendo algo que não é plausível, faço uma provocação: ande pela empresa e pergunte ao maior número possível de pessoas se elas se lembram ao menos de qual é o objetivo que estamos perseguindo no ano ou período. Garanto que você provavelmente se surpreenderá com as respostas, ou melhor, com a falta delas.
Falando da falta de metodologia
A falta de uma metodologia clara para o planejamento empresarial é uma das maiores falhas das empresas. Sem um processo estruturado, o planejamento se torna uma mera formalidade, sem consistência e coerência.
Por isso, muitas vezes, as reuniões de planejamento se transformam em eventos teatrais, onde cada participante representa um papel, mas sem um compromisso verdadeiro com a implementação das decisões pactuadas.
É muito comum ver empresas que realizam poucas reuniões sobre o planejamento, gastando tempo e recursos consideráveis, mas sem efetividade no dia a dia. O flagrante dessa encenação se dá somente ao final do período, quando todos se lamentam que nada do que foi planejado se concretizou com aquela cara de cachorro que caiu da mudança.
Mas tirando essa cena, digna de pena, podemos perguntar: O que falta de fato para acabar com o teatro nesse caso? Passos práticos, decisões e compromisso no acompanhamento.
Para termos mais uma ilustração, quem nunca participou de uma grandiosa reunião de planejamento em janeiro, com apresentações elaboradas, discursos inspiradores e materiais super produzidos? E quem nunca percebeu que, ao longo do ano, esse planejamento foi ignorado, sem as devidas revisões periódicas ou ajustes necessários para enfrentar os desafios que surgem?
O problema, além do teatro que se apresenta, é a falta de uma metodologia robusta para guiar e monitorar o progresso e as ações do planejamento, que no final se dissolve em um mar de boas intenções não realizadas encenadas pela falta de coragem de dizer: eu não sei gerenciar um plano robusto dessa magnitude.
Essa ausência impede que as empresas transformem suas estratégias em ações concretas e mensuráveis. É necessário coragem para assumir uma abordagem clara, consistente e uma condução adequada, para que o planejamento não perca seu valor e a empresa não navegue sem rumo, perdendo oportunidades e recursos ao longo do caminho.
E para que você não se confunda, “método” se refere a uma série de passos específicos ou procedimentos utilizados para alcançar um objetivo, enquanto “metodologia” é o estudo e análise desses métodos, incluindo as técnicas e princípios que guiam sua aplicação e desenvolvimento.
O desafio das metas inexistentes
Outro ponto crítico é a ausência de desafios claros e metas bem definidas. Muitas empresas falham em traçar um caminho claro para alcançar seus objetivos. Sem desafios declarados e metas específicas e mensuráveis, o planejamento estratégico perde sua eficácia.
Além disso, a falta de projetos e processos concretos que suportem essas metas contribui para a sensação de que o planejamento é apenas uma fachada. Empresas frequentemente definem metas vagas como "aumentar as vendas" sem especificar como, quanto, quando, seu processo e qual o seu prazo.
Isso acaba por não guiar ações efetivas, deixando os colaboradores sem uma direção clara sobre o que deve ser feito para atingir os objetivos propostos. Essa falta de precisão em tudo, mas em especial nas metas transforma o planejamento em um exercício de retórica, onde muito se fala, mas pouco se realiza.
Para ilustrar um pouco mais, imagine uma empresa que, ao iniciar o ano, estabelece como meta "melhorar a eficiência operacional". Sem detalhes sobre quais áreas precisam de melhorias, quais indicadores serão usados para medir o progresso ou quais etapas específicas serão seguidas, essa meta se torna apenas um ideal inalcançável. A equipe, sem orientação clara, continua trabalhando de maneira dispersa, e ao final do período, a eficiência permanece inalterada.
Essa ausência de ações e tudo mais ligado as metas que deveriam ser claras e desafiadoras também impede que as empresas identifiquem e aproveitem oportunidades de crescimento. Portanto, metas bem definidas funcionam como um mapa, guiando a organização em direção ao sucesso e permitindo ajustes ao longo do caminho que deverão ser incrementados.
Sem elas, as empresas correm o risco de estagnar e perder competitividade no mercado. Para aqueles que acham que estamos exagerando, sugiro repetir o simples teste da pergunta, fazendo para os diversos membros da sua equipe qual é o objetivo principal da empresa para o ano. Se a maioria não souber responder com precisão, já é um sinal claro de que as metas não estão bem definidas ou comunicadas.
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A sabotagem do ato de evitar as conversas difíceis
Uma das maiores armadilhas desse teatro de gestão é o autoengano dos profissionais em relação a interação. Em vez de enfrentarem as duras conversas necessárias para reconhecer e corrigir os erros, muitos preferem manter a aparência de que tudo está bem. Essa atitude impede o desenvolvimento de uma cultura de melhoria contínua e aprendizado dentro da empresa. O medo de confrontar a realidade é uma barreira significativa.
Reconhecer que algo não está funcionando como deveria, exige coragem e humildade além de muita energia e disposição e isso é o que vejo faltando por aí no mercado. No entanto, é sabido que muitos profissionais preferem evitar essas conversas difíceis, perpetuando assim um ciclo de ineficácia. Por exemplo, um gestor pode evitar discutir com sua equipe os fracassos de um projeto para não criar desconforto, o que apenas garante que os mesmos erros se repetirão no futuro.
Há também empresas que, mesmo tendo uma boa definição de objetivos e metas, se sabotam internamente. Isso acontece porque, no fundo, não se confrontam na busca verdadeira por melhorias devido ao medo de conflitos. Muitos gestores e equipes não sabem como distinguir a diferença entre conflitos produtivos e confrontos destrutivos.
Conflitos produtivos são essenciais para o crescimento e a inovação, pois permitem que diferentes perspectivas sejam discutidas e melhores soluções sejam encontradas.
No entanto, o medo de qualquer tipo de desacordo, a imaturidade e a falta de inteligência emocional fazem com que muitos prefiram o silêncio confortável à conversa desconfortável, mas necessária.
Para ilustrar, imagine uma empresa que tem um plano estratégico bem elaborado, mas onde os gestores evitam debater os pontos críticos por receio de gerar atritos... Eu sinceramente já cansei de presenciar isso, arrisco dizer que é o que mais acontece.
Como resultado, problemas persistem e o potencial de crescimento da empresa é comprometido. O medo de conflitos impede que as verdadeiras causas dos problemas sejam abordadas e resolvidas. Este comportamento de evitação cria uma cultura onde a aparência de harmonia é mais valorizada do que a eficácia real. Se quiserem, convido novamente a observar como os problemas são tratados em suas próprias empresas.
Pergunte-se: as conversas difíceis estão sendo realizadas? As verdadeiras questões estão sendo abordadas com a seriedade necessária sem medo de desagradar ou desejo de agradar? Se a resposta for não, é um sinal claro de que a empresa estamos sabotando a empresa e impedindo seu próprio progresso.
Desenvolver a coragem para enfrentar essas conversas difíceis e aprender a distinguir entre conflitos produtivos e confrontos destrutivos é essencial para qualquer organização que busca crescer e melhorar continuamente.
A falsa segurança e as consequências do Teatro
Os gestores desse teatro vivem uma falsa sensação de segurança. Eles acreditam que, ao manter as aparências, os resultados de curtíssimo prazo e não sustentáveis estão protegendo a empresa. Contudo, essa ilusão pode ser extremamente prejudicial, levando a empresa a enfrentar dificuldades significativas no futuro. A falsa segurança é visível quando se ignoram os sinais de alerta diversos que temos como a estagnação nos produtos, nos clientes a falta de crescimento financeiro e outros, preferindo acreditar que tudo está sob controle enquanto os problemas se acumulam.
Uma gestão ineficaz resulta frequentemente em problemas de diversas ordens, mas me parece que ele é realmente aceito quando se aponta algo no financeiro. Um bom exemplo é de sabemos que muitos são incapazes de ler e interpretar um Demonstrativo de Resultados do Exercício (DRE), pois os números revelam, mas não explicam e com isso temos um claro sinal de negligência, onde demonstra que muitos líderes na empresa estão mais preocupados em manter as aparências do que em entender sua real situação financeira.
Não é por acaso que muitas empresas não discutem o DRE de forma consciente e estratégica, o que leva a decisões financeiras erradas e a um gerenciamento inadequado dos recursos. Por exemplo, gestores que não entendem o DRE podem não perceber que determinados custos estão fora de controle, levando a prejuízos evitáveis.
A retenção de talentos é outro grande desafio. Sem uma gestão eficaz, os funcionários não se sentem valorizados ou motivados, resultando em alta rotatividade e perda de conhecimento e experiência.
Empresas que se concentram apenas em eventos sociais e confraternizações, sem investir no desenvolvimento profissional e na carreira dos colaboradores e na construção de uma relação séria, criam um ambiente de trabalho onde a lealdade e a motivação são baixas.
A expansão de mercado e de carteira de clientes também sofre. Sem um planejamento estratégico sólido, é difícil identificar novas oportunidades e se posicionar de maneira competitiva e uma coisa vai se conectando com a outra.
Empresas que não conseguem definir claramente suas estratégias de mercado e não inovam em seus produtos e serviços ficam para trás, perdendo espaço para concorrentes mais bem preparados.
O desafio de assumir o Teatro
O grande desafio é assumir que estamos vivendo em um teatro de gestão. Reconhecer essa realidade é o primeiro passo para a mudança. Somente encarando de frente as falhas do sistema atual é que as empresas poderão reagir de forma rápida e certeira para melhorar seus impactos.
Compreender a realidade da empresa é fundamental. Isso inclui uma análise honesta dos processos, da cultura organizacional e das competências dos profissionais. Somente com um entendimento claro do ponto de partida é que se pode traçar um caminho eficaz para a mudança.
Portanto, encarar a mudança requer coragem e determinação e isso é uma competência tangível e não somente uma questão atitudinal. Além disso, se faz necessário implementar novas metodologias, estabelecer metas claras e mensuráveis, e criar uma cultura de transparência e responsabilidade.
A transformação deve ser orientada por dados e fatos, evitando-se decisões baseadas apenas em percepções ou intuições. Melhorar os impactos da gestão significa não apenas buscar resultados financeiros, mas também focar na cultura dos colaboradores e na satisfação dos clientes, além da contribuição para o ecossistema em que a empresa está inserida.
Empresas que adotam práticas sustentáveis e responsáveis tendem a ter melhor desempenho a longo prazo, criando valor para todos os envolvidos. O objetivo final é cultivar resultados verdadeiros, que sejam sustentáveis e benéficos para todos os envolvidos.
Isso requer uma gestão baseada em princípios humanos, éticos e prósperos. Empresas que se comprometem com a verdade e a transparência tendem a construir relacionamentos mais fortes e duradouros com seus clientes e parceiros de negócios.
Da ilusão à realidade
O teatro no sistema de gestão é um problema real e recorrente nas empresas. O desafio é grande, mas não intransponível.
Reconhecer a ilusão e trabalhar para transformar a gestão em algo concreto e eficaz é essencial para o sucesso sustentável das empresas é a nossa obrigação como líderes ou liderados.
Somente assim poderemos cultivar resultados verdadeiros, beneficiando os clientes, nós mesmos e todo ecossistema empresarial e o grande desafio é assumir o teatro, e com isso compreender a realidade para encarar de frente a mudança que precisa ser operada para que a empresa reaja de forma rápida e certeira para melhorar seus impactos na sociedade.
Dessa forma, poderemos realmente trabalhar no que importa, mas de forma humana, ética e próspera, cultivando assim a realidade e os resultados verdadeiros.
Vamos juntos em frente e enfrente!
Keine Alves
Líder educador e pesquisador
Gerente da Qualidade - New Solutions
6 mMuito bom! como faço pra participar da pesquisa?