Os riscos da comodidade: 
A inteligência artificial está limitando a nossa criatividade?
Imagem criada por AI, inspirada na campanha "Como queremos ser lembrados?", do Instituto Delete

Os riscos da comodidade: A inteligência artificial está limitando a nossa criatividade?

Há pouco mais de 1 ano, eu entrava no estúdio para gravar mais um episódio do "Fora da Norma", o podcast da 42 São Paulo , quando o meu co-host, Lula R. , deu a ideia de filmar o "react" da primeira vez que eu iria interagir com o ChatGPT. Foi impressionante poder experimentar na prática a tal da Inteligência Artificial, sobre a qual comecei a ouvir falar em meados de 2015. 


Não dá pra negar que o lançamento do ChatGPT catapultou a IA para o centro das atenções e ainda acelerou as discussões sobre os impactos que ela trará na minha vida e na sua, sem falar das mudanças pelas quais a sociedade como um todo passará e que ainda não aparecem nem nos episódios mais distópicos de Black Mirror.


De acordo com a estimativa divulgada pelo FMI (Fundo Monetário Internacional), o impacto da automação causada pelos avanços tecnológicos é de quase 40% nos empregos de todo o mundo. O cenário já não é nada animador, mas a demora na regulamentação do uso e desenvolvimento dessas ferramentas acaba deixando tudo mais sombrio. De fato, temos medo de ser substituídos, mas enquanto isso, em troca de comodidade e alta produtividade imediata, acabamos delegando nossa capacidade criativa às máquinas.


Por exemplo, o uso excessivo de telas, repletas de ferramentas que supostamente só nos ajudam, na verdade, contribui para a epidemia de ansiedade, falta de memória e dificuldade de aprendizagem na qual estamos vivendo. 


Quantos números de celular você têm decorados? Quando você não lembra de uma informação, a quem você recorre? "Google: Como é o nome daquele filósofo barbudo que fala engraçado? Isso mesmo, Cortella!"


Tenho visto muitas discussões sobre "quais habilidades humanas que as máquinas serão capazes de substituir", como criação de música, programação, artes visuais, em uma  lista que aumenta a cada dia. Como podemos nos preparar para lidar com esse novo contexto? Como podemos usar essas ferramentas a nosso favor? Certamente as pessoas que acreditam que um simples "prompt" as ajudará através de suas respostas previsíveis, está entrando em um caminho arriscado, que poderá atrofiar a capacidade de criar. 


A neuroplasticidade é a capacidade fantástica que nosso cérebro tem de desenvolver novas habilidades, se reorganizar e se adaptar a contextos complexos. E ela depende de estímulos: se você se dedica e treina para tocar violão, em pouco tempo estará dando os primeiros acordes. Se ficar muitas horas vendo vídeos de 15 segundos, adivinha no que se tornará especialista? E assim surge a dificuldade de prestarmos atenção, de forcarmos na leitura de textos longos e de lidar com a tortura que é o tédio (consegue se imaginar em um elevador/ônibus sem scrollar por vários minutos seguidos?). 


Em tempos de IA precisamos falar sobre IE, ou seja, a inteligência emocional que é fundamental para fazermos uma autoavaliação de como anda nossa relação com a tecnologia e com o desenvolvimento da nossa cognição. Trabalhos como o do Instituto Delete (do Instituto de Psiquiatria da UFRJ), dão luz a temas como nomofobia (medo de ficar sem o celular) e dependência digital e nos propõem a reflexão de "como queremos ser lembrados", em uma campanha que simula estátuas de bronze espalhadas pela cidade com celulares e tablets nas mãos. Em um mundo tão conectado acabamos negligenciando a importância de desenvolver nossas ideias também no offline.


"E se acabar a luz, você ainda consegue ser designer?" A pergunta que um querido professor me fez ao final da faculdade hoje ecoa como um desafio ainda maior: "E se acabar a luz, quem realmente somos?"


No "Fora da Norma", essa experiência não foi apenas um teste com IA. Para mim, foi um despertar para a complexa interação entre tecnologia e seres-humanos, onde a inteligência emocional se torna a nossa guia para explorar um futuro incerto e a inteligência artificial pode nos ajudar a expandir ainda mais a nossa humanidade.


Mari Marcílio: Head de Comunicação e Cultura na 42 São Paulo, especialista em Saúde Mental e Desenvolvimento Humano pela PUCPR, apaixonada por design, educação, psicologia, tecnologia e vira-latas caramelo.

Jadilson B. Araújo

Graphic Design / UX UI Design / Estudante Eng. de Computação

8 m

Sensacional! Se puder recomendo os vídeos do Doutor Dr.Miguel Nicolelis e, quem sabe, rolê até uma palestra na 42SP ou mais. Rs

Karen Kanaan

Co Founder 42 SãoPaulo | Board Member | Entrepreneurship | Tech and Education

9 m

Muito bom! Eu já esqueço que posso usar este recurso o tanto que poderia :)

Para a escrita de textos, eu utilizo IA apenas para ajudar a organizar as ideias, mas acabo editando tanto o que ela escreve que o texto se torna meu. Ou então eu mesmo escrevo desde o início e peço para ela revisar o estilo e a gramática no fim. Usando dessa forma, nunca percebi nenhum efeito deletério nem tive alguma impressão de atrofia na minha capacidade criativa. Na área de programação, eu utilizo como uma enciclopédia interativa. Ela gera código, mas eu só aceito a sugestão depois de a entender muito bem. Ela explica muito bem. Eu preciso me esforçar para entender os riscos que elas têm se forem mal utilizadas, mas acho que consigo imaginar.

Excelente texto 👏🏻 Ao mesmo tempo que poupo meu tempo com a elaboração de demandas extensas, sinto que estou “emburrecendo” ao dar comandos cada vez mais resumidos. Talvez a solução seja intercalar tarefas com IA e sem.

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